Acordei com meu tivô dizendo para me apressar, que não poderíamos chegar atrasados. Quando processei essa informação, ele já havia saído do quarto e ido até a cozinha. Pude ouvi-lo mexendo em panelas e acendendo o fogo, começando a preparar o café da manhã.
Ele me chamou mais duas vezes, me fazendo mudar de posição e acordar aos poucos. Mas eu simplesmente não queria levantar. Olhei para a janela e comecei a questionar se aquela chuva seria capaz de deixar o céu tão escuro mesmo durante o dia.
Procurei pelo meu relógio de pulso ao lado da cama e quase não acreditei no que vi, eram só 4h45. Para quê diabos esse senhor não podia se atrasar?
Bufei, devolvendo o relógio para a mesinha ao lado da cama e voltei a me deitar de bruços naquele colchão duro. Logo agora que tinha encontrado uma posição confortável para dormir nesse tijolo, pensei, tentando voltar a dormir, até parece que vou sair daqui antes do sol nascer.
Estava uma chuvinha tão gostosa lá fora, não demorou muito para eu começar a cair no sono novamente. Meu corpo estava relaxando, meus olhos pesando e minha respiração tornou-se calma e regular, quando meu tivô voltou com um balde de água fria e despejou tudo em mim, tive a sensação de que mil agulhas haviam acertado minhas costas, o frio cortante me despertou na mesma hora e me fez pular da cama abraçando meu torso encharcado.
— O que tá fazendo?!
— Bom dia, Bin. O café da manhã está pronto, venha comer. Ah e é melhor colocar esse colchão para secar, é o único que você tem — ele disse, animado, conforme se afastou do quarto com o balde, me deixando sozinho.
— Eu odeio esse lugar — resmunguei, enquanto levava meu colchão, sem rumo, para fora do quarto. Meu cabelo e rosto amassados e meus olhos quase não abriam, de tanto sono.
— Pode deixá-lo lá atrás, deve fazer sol mais tarde, de qualquer forma, o vento dá conta do recado. Vamos, tire essa expressão emburrada do rosto.
— Não é assim que se acorda alguém...
— Falando nisso, amanhã você prepara o café da manhã — ele sorriu — e ontem você subiu sem lavar a louça, preciso te contar as regras dessa casa. Mas termine de comer primeiro, temos muita coisa para fazer.
A chuva parou e logo o sol começou a nascer, formando um arco-íris por cima das árvores. Ele foi buscar a pobre da Haru, que devia querer dormir até mais tarde, assim como eu. E saímos de carroça para entregar algumas encomendas.
No caminho, ele me contou as regras da casa e salientou que a escolha de segui-las ou quebra-las era minha, mas que ambas trariam consequências.
E que eu teria obrigações, não só de me dedicar à escola, como também algumas tarefas em casa.
— Tivô, você não se aposentou?
— Me aposentei já faz alguns anos.
— Então por que continua trabalhando?
— Eu não gosto de ficar parado, além disso, cuidar das plantações é uma coisa que me relaxa. E é a minha casa, é tudo que eu tenho, minha renda e meu estilo de vida há dez anos.
Não pudia evitar de pensar: pobre homem, só pensa que é feliz, pois nunca viu algo melhor.
Apesar de todas as minhas provocações e meus ataques de raiva, ele continuou sendo o tivô calmo ao responder minhas perguntas e impiedoso quando exigia que eu realizasse alguma tarefa.
Se eu dissesse que não conseguia ou que não sabia fazer, ele ficava irado e então eu também ficava furioso e ele acabava sendo ainda mais rígido comigo, até que eu terminasse a tarefa.
Faltando duas semanas para acabar as férias, estávamos discutindo porque eu estava cheio de receber ordens dele e não queria fazer mais nada. Aliás, nunca quis.
Até porque eu não sabia fazer nada e todas aquelas tarefas que ele me passava só demonstravam o quanto eu realmente seria péssimo em tudo que tentasse fazer.
O arroz ficava duro ou queimava, não conseguia tirar o sabão da louça direito, quebrava as coisas, usava os produtos de limpeza errados, esquecia de fechar todas as janelas, como foi o caso dessa noite fatídica, em que uma tempestade molhou uma porção de livros que estavam na escrivaninha.
Era tão humilhante.
Ele queria conversar comigo, mas não seria assim que meus pais resolveriam as coisas. Quando eu fazia algo errado, eles brigavam, tiravam algo do meu quarto, a porta talvez, me mandavam calar a boca e não sair de casa, a não ser para ir à escola, me deixavam de castigo. Eu não aprendi a conversar, falar sobre sentimentos, nada disso. Era só ficar quieto no meu quarto, que eles me deixavam em paz.
Ver o meu tivô calmo, enquanto eu borbulhava por dentro, pronto para brigar pela minha razão, só me deixava mais frustrado, eu parecia um monstro que não entendia sua língua. Eu queria brigar. E não entendia por quê éramos assim.
Eu queria desaparecer.
Queria chorar de novo, como na primeira noite que passei ali, duas semanas atrás, mas não na frente dele. Nunca na frente de alguém.
Simplesmente saí correndo daquela casa, porque nenhum cômodo dela seria longe suficiente, precisava de mais espaço. E mesmo com medo da escuridão daquela floresta, corri em meio as árvores por alguns minutos, sentindo as lágrimas escorrerem quentes pelo meu rosto e se misturarem com a tempestade, que caía tão pesada quanto o meu choro.
Até que eu consegui ir longe, mas claro que mais cedo ou mais tarde iria acertar alguma coisa. E foi na raiz de uma árvore que eu tropecei e caí com as mãos no chão, ralando as palmas e os joelhos com a queda.
Ajoelhado no chão, consegui ouvir um outro choro, que não o meu, ali perto. Me concentrei para tentar descobrir de onde vinha e me levantei devagar, travando uma luta interna se a) procurava a origem daquele choro ou b) voltava para a casa do meu tivô e rezava para não ser seguido.
Eu morria de medo de ter alguém atrás de mim, por isso nunca gostei de brincar de esconde-esconde ou pega-pega.
Morrendo de medo e pronto para correr de volta se fosse necessário, me aproximei lentamente da árvore onde vinha aquele som, rezando pela piedade da minha alma.
Equilibrado em três patinhas, um gato de tamanho médio estava chorando, com a pata direita dobrada e os olhos fechados com força. Parecia estar sentindo muita dor, nem havia notado minha presença, até eu tentar me aproximar mais, afim de pegá-lo.
Ele tentou correr e acabou chorando mais ao tentar usar a pata ferida, parando novamente.
— Por favor, não me morde — sem pensar muito, o tomei do chão e o abracei pertinho do meu peito, sentindo seu corpinho trêmulo e frio — Tá tudo bem, não vou te machucar... Eu vou cuidar de você.
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MEOWGIC ✦ yeonbin
Fanfic⚠️ A história não está finalizada e não terá atualizações por enquanto pois está sendo revisada desde o início. Iniciado em 28/12/2019 20:00 🐱 Fluffy 🌳 Napul Napul #1 TomorrowXtogether #1 Yeonbin #1 Moa