Noite das ilusões - Parte I

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Juliana

A pior decisão da sua vida você toma quando está magoado. O sangue sobe a cabeça, o senso desaparece e você faz exatamente o que nunca achou que faria. Você vira a mesa, diz coisas terríveis e no fim, só nele, percebe o quão idiota foi, mas aí já é tarde, porque a pior decisão só é tão destrutiva porque o tempo não volta.

Se pudéssemos voltar atrás a cada erro seria mais fácil não estragar tudo. Sem a visão tão ampla dos fatos se erraria, se perceberia que errou e com a facilidade de um estalar de dedos a vida voltaria ao ponto da decisão e se tomaria a decisão mais consciente.

No entanto, viver sempre implicou um risco que quem deseja viver tem que correr a cada decisão, possibilidades boas e ruins, que podem mudar para melhor ou acabar com tudo o que conhecia de si.

Nesse momento, em frente ao espelho do camarim, apertando o mais forte possível meu espartilho eu pouco sabia sobre o que isso fazia com a minha vida. Ou talvez soubesse, mas não tinha a coragem necessária para sequer me deixar pensar. Muitas vezes se deixar afogar na própria ignorância poderia ser o que nos libertaria.

Ainda que, presa entre aquele laço, eu não pudesse me sentir tão solta.

- Camila... - Disse Candela do lado de fora do cômodo e como não respondi de imediato acabou entrando de uma só vez.

- Você não deveria entrar sem bater - Adverti, no entanto, como quando ignorou o decoro ao entrar sem ser convidada simplesmente não disse nada sobre esse assunto.

Querendo entender o motivo do seu repentino silêncio percebi por fim que a senhora estava admirada com seu feito. Não, não se tratava de um olhar luxurioso ou sexual, em seu olhar castanho tudo o que eu identificava eram cifras girando como uma máquina caça-níquel cujo o resultado não tinha como ser negativo. Ao menos não para ela que não dormiria com a minha consciência.

- Você está divina menina! - Falou com muito entusiasmo por ter acertado na roupa que me deu logo que assinei aquele contratado hoje mais cedo.

Não podia negar que me via bem por fora. Quem me visse nesse segundo poderia julgar que nunca estive tão deslumbrante a questão era que essa palavra nem sempre carrega dentro de si o estar bem no interior. Se referia ao externo, ao visto a olho nu, nunca ao lado onde mais nua, vulnerável, me via.

Quanto a roupa não fugia a idéia do evento: Começava com um par de saltos negros scarpin abertos no dorso do pés com o detalhes de tiras perpendiculares cravejadas de spikes douradas. Naquele  calçado eu me via pelo menos cinco centímetros mais alta.

De roupa efetivamente havia uma meia calça arrastão preta e um short da mesma cor apertado que me dava a impressão de que se eu precisasse me abaixar não deixaria nada para a imaginação. Quando a roupa superior havia um espartilho negro por cima de uma camisa branca de botões que ficava abaixo de um blazer longo e vermelho. Uma máscara preta também compunha o conjunto que terminava com uma cartola também de mesma cor.

Parecia o traje perfeito para encarnar um personagem, viver uma experiência, mas tudo o que eu conseguia pensar era que tão bonita que poderia estar nunca me vi tão pequena, tão frágil.

Quando Candela segurou em meus dedos me indicando que eu saísse eu quis me recusar, quis dizer que não e fazer valer o lado da minha cabeça que poderia me refrear diante do outro que sussurrava que minha única certeza era que eu deveria fazer alguma coisa para que não acordasse sem casa.

Eu tinha algumas economias que não colocava em casa ou nas contas, mas não seria o suficiente para me manter por mais que três meses longe do meu teto e com o que eu ganhava em noites comuns não poderia mais que um mês. A maneira que eu tinha era tirando daqui mais do que o suficiente para sobreviver, me submetendo a beber, com isso,   ingrato trago de minhas palavras que um dia disseram fazer somente pelo suficiente.

CamilaOnde histórias criam vida. Descubra agora