Romance XL ou do Alferes Vitoriano

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Aonde é que vais, Vitoriano,
nem bem amanhece o dia?
Andarás de contrabando,
serra abaixo, serra acima,
das areias de Ouro Branco
às sombras de Vila Rica?
(Esporeava o seu cavalo,
pela estrada mal segura.
- Vitoriano, tem cuidado,
de hora em hora a sorte muda!
Quanto mais o tempo é falso,
mais aparecem denúncias...)
- Eu, Senhor, vou nesta pressa
para as bandas de Mariana.
Nem vos direi quem me espera
nem vos direi quem me manda.
Subo e desço pela serra
que nem o vento me alcança!
(Tinha no bolso uma carta,
e um recado na cabeça.
Puxa o lenço, limpa a cara,
cai-lhe o papel, vê-se a letra.
- Vitoriano, se te agarram,
terás de cumprir sentença!)
- Eu, Senhor, digo a verdade:
vinha da Ponta do Morro,
mandado por meu compadre,
Coronel Francisco Antônio.
Mas, para o que vinha, é tarde:
e ele ou está preso ou está morto...
(E no alto da serra brava
dobrou sobre o seu caminho
o alfaiate, alferes, cabra
- sem ter chegado ao destino
o recado que levara,
para servir a um amigo.)
- Ai, Vitoriano Veloso,
como o tempo era nublado!
Partires com tal denodo,
voltares com tal cansaço!
- E, depois, - o calabouço?
E, depois, - o cadafalso?
(Não houve quem o livrasse
de dar três voltas à forca;
de gemer pela cidade
pena de açoites sem conta;
nem de partir para a viagem
de degredo, amarga e longa.)
(E a carta nem fora entregue!
Nem fora o recado escrito!
- No seu cavalo, tão leve!
- Na masmorra, tão perdido...
Que imensas lágrimas bebe,
por ter prestado um serviço! )

Romance da inconfidência (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora