Romance LXX ou do lenço do exílio

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Hei de bordar-vos um lenço
em lembrança destas Minas;
ramo de saudade, imenso...
lágrimas bem pequeninas.
(Ai, se ouvísseis o que penso!)
Ai, se ouvísseis o que digo,
entre estas quatro paredes...
Mas o tempo é vosso amigo,
que não me ouvis nem me vedes.
(Minha dor é só comigo.)
E esta casa é grande e fria,
com toda a sua nobreza.
Ai, que outra coisa seria,
se preso estais, ver-me presa.
(Porém tudo é covardia.)
Sei que ireis por esses mares.
Sonharei vosso degredo,
sem sair destes lugares
por fraqueza, pejo, medo
(e imposições familiares.)
Hei de bordar tristemente
um lenço, com o que recordo...
A dor de vos ter ausente
muda-se na flor que bordo.
(Flor de angustiosa semente.)
Muito longe, em terra estranha,
se chorais por Vila Rica,
neste lenço de bretanha,
pensai no pranto que fica
(à sombra desta montanha!).

Romance da inconfidência (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora