Passado Parte II

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Em mais uma de suas madrugadas em claro, o jovem rabiscava em sua fiel caderneta o que parecia esperado final de um suspense. Pela primeira vez tinha certeza. Certeza do que Seokjin possuía na raiz de suas doenças, e mais do que isso, que precisava ajudá-lo tanto quanto achava necessário.

As duas últimas sessões foram peças angulares de toda a jornada. Havia conseguido levar o paciente ao mais profundo de seu subconsciente, e apesar de temer o que seria libertado ao acessar tal área, não existia outra escolha: era onde as respostas estavam.

Enquanto escrevia, o peito do psicólogo doía. Uma pessoa em estado como o de Kim Seokjin não poderia ter possuído um histórico amigável – seria óbvio para qualquer um –, mas o que permanecia atrás das cortinas era assustador como não imaginaria. Lembrou-se das palavras de Suho quando foi apresentado ao caso: era como sobreviver sem saber o significado de viver.

Após uma longa semana indo e voltando nas fitas das sessões, havia chegado às conclusões que precisava. Fogo, sangue, gritos, agulhas; tudo significava para Seokjin uma peça importante de seu passado. Conviveu sua infância e parte da adolescência sendo espancado; sangue e gritos o faziam retornar a esses momentos, tornaram-se fobias como uma defesa natural. Após isso, tudo fora dilacerado por completo com um incêndio. Assistiu a seus pais morrerem e sua casa ser tomada por chamas; sua juventude fora finalizada com a marca assustadora de uma tragédia, trazendo a memória de fogo como algo tenebroso. E então, como consequência, as ruas o trouxeram mais abusos. Perdido nas ruas, não teve a opção de rejeitar. Mais um período de sua vida marcado por um trauma. Seringas e agulhas o lembravam de tal cenário, tornando-se mais uma fobia.

O modo como Seokjin reagiu ao ter de enfrentar essas memórias novamente foi ainda mais doloroso de se ver. Era uma criança assustada que não teve a oportunidade de saborear a vida sendo proveitosa. Chegava a pensar se o rapaz já havia, alguma vez, se sentido feliz verdadeiramente. Ou se tudo o que o trouxe até aquele hospital foi uma jornada de abusos e pessoas tirando proveito de sua personalidade tão frágil e doce.

O que o levava até aquela pessoa. Namjoon.

Suho, boquiaberto, não conseguia esconder toda a surpresa. As palavras de Taehyung iam chegando a seus ouvidos como peças de um quebra-cabeças que pouco a pouco se montava. Chegou a se sentir culpado por não ter notado antes, ou por não ter oferecido a ajuda suficiente. Outros pacientes que não haviam sofrido um terço do que Seokjin tinham a sua atenção integral por puro favoritismo.

– Agora mais que nunca tenho certeza que contratar você foi uma das melhores decisões de minha carreira. – Após uma longa pausa para processar tudo, o loiro ditou, não limitando sua expressão. Taehyung sorriu.

– Porém, isso ainda não significa um final feliz. Nem de longe. Ainda há muitas lacunas e muito que fazer. Felizmente, estou em um estado de espírito que nem mesmo minha carreira é relevante o suficiente para não abrir mão dela. – O jovem prosseguiu, deixando de lado a caderneta.

– O que quer dizer? Já não acha que tem o suficiente? – Suho ergueu as sobrancelhas.

– Nem de longe. Por mais confiante que esteja nesses resultados, sem provas eles não passam de mais suposições. E além de tudo, ainda faltam duas peças; por que a fobia de água, e principalmente... Onde Namjoon estava quando tudo aconteceu. – Apenas em mencionar seu nome, a expressão de Taehyung se fechou.

Suho acomodou-se na poltrona, fixando o olhar em um canto, raciocinando.

– Sabemos que nos arquivos deste hospital nada de útil sobre Seokjin existe. Disso eu não tenho dúvidas. Onde mais poderiam existir informações sobre alguém que mal sabemos o sobrenome? – O mais velho pensou alto.

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