Culpa da torta de pêssego - I

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Já era de madrugada quando Félix se deu conta de que não conseguiria dormir sozinho naquela casa, ficar revirando na cama não era a resposta. O rapaz forçou-se a sair do meio das cobertas quentes e descer as escadas, chegando à sala de estar. Ele sentou-se em uma das poltronas com Plagg se aconchegando no colo dele... esperariam ali.

Não era segredo que, muitas das vezes, Nathalie precisasse ficar até mais tarde no trabalho. Não era segredo que o celular dela tinha quebrado durante aquela última ligação - Gorila afirmou isso com uma mensagem. Não era segredo que os Agrestes eram uma praga que consumia a vida dos empregados. Eles precisavam entender limites, limites básicos de bom senso, que incluem não deixar uma mulher voltar sozinha para casa tão tarde e incomunicável!

O loiro estava pensando meticulosamente em tudo o que poderia fazer para resolver aquela situação quando barulhos de chave chamaram a atenção dele. Com certa ansiedade, ele aguardou até que a porta da casa fosse aberta e as luzes acesas, para só então exclamar em alivio:

— Mãe!

— Félix, deveria estar dormindo... — ela murmurou, deixando claro que não estava de bom humor.

— Fiquei preocupado com você... ficamos! — ele encolheu os ombros, passando a mão sobre os pelos de Plagg — Não sabia que você chegava tão tarde assim. Quantas horas de sono você tem?

— Aconteceram imprevistos demais — a justificativa veio enquanto ela largava a bolsa em um canto qualquer e começava a se livrar dos sapatos — Você deveria saber, já que rastreou o meu celular e ainda ficou incomodando o Gorila.

— Então foram casos excepcionais? — ele ergueu as sobrancelhas um pouco mais inquieto.

— Digamos que sim.

— Com que frequência o Agreste é tão explorador com você?

— Vá dormir, Félix — a ordem saiu em um tom frio, ela ignorou completamente a pergunta e, antes que qualquer refuta pudesse ser dada, ela depositou um beijo na testa do filho e tentou soar um tanto mais amena: — Já é tarde.

— E você? — ele continuou observando a mãe que, neste momento, tirava os grampos do cabelo com certa urgência — Não vai dormir?

— Vou — respondeu Nathalie, passando a mão lentamente entre os fios de cabelo e massageando algumas partes da cabeça — Vou dormir aqui.

— Mas... — o rapaz a encarou espantado, como se ela tivesse dito algo absurdo demais para crer — ... passa o dia todo trabalhando, chega de madrugada e ainda vai dormir no sofá? Não acha que merece algo melhor?

— Filho... — ela suspirou pesadamente — Eu não aguento subir mais um degrau sequer, minha coluna está doendo. Tenho certeza que vou descansar de forma digna até precisar levantar de novo — ela deu um sorriso discreto, se acomodando no sofá — Adultos fazem esse tipo de coisa, são sacrifícios por um bem maior — ela bocejou e, pouco depois, já tinha adormecido devido ao cansaço.

Sentindo um grande peso de culpa, tudo o que Félix fez foi apagar as luzes do cômodo e voltar para a poltrona. Iria dedicar suas horas de descanso em um plano ousado, algo temporário que pudesse livrar a mãe das garras dos Agrestes.

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Gorila havia sido dispensado mais cedo no dia anterior, logo depois de chegar na mansão Agreste com uma encomenda urgente que precisou buscar no outro lado da cidade: uma fatia de torta de pêssegos. Ele não entendeu bem o motivo daquilo, tão pouco o motivo de se ver livre do chefe fora da hora, mas não iria reclamar.

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