Naquela noite eu não chorei, talvez porque estava exausta e dormi logo.
De manhã eu decidi que não iria continuar com a faculdade por enquanto. Aquilo me doía mas não conseguiria acompanhar nada com isso como foco da minha mente.- tem a certeza?
- tenho, mãe.- suspirei e me sentei. Me sentia pesada.
- e como foi ontem? Chegou com uma menina.
- eu não falei nada sobre mim, se quer saber.
- Liara, perguntei como foi.- ela falou pausadamente e sorriu de leve.
- eu não sei. No primeiro instante eu corri dali, mas May foi me buscar. - ela me encarou.- May é a garota que me deixou em casa ontem. Ela está de quase oito meses e disse que se atirou da escada assim que soube.
- meu deus. E ficou tudo bem?
- sim. Ela descobriu aos cinco meses, eu acho. Mas ficou tudo bem. Ela disse que nem desconfiou porque menstruou todo aquele tempo.
- eu já escutei coisas assim.
Ela continuou cortando os temperos e me encarou rápido.
- você vai hoje?
- eu não sei.
- aquilo te fez bem?
- não me fez sentir sozinha e única com isso.- falei.
- então deve voltar.
•••
Minha tarde foi deitada no sofá assistindo série e comendo besteiras que havia comprado escondida de minha mãe. Eu estava cansada de comer apenas verduras e legumes. Eu queria gordura e açúcar.
Me levantei do sofá apenas quando a campainha tocou me fazendo protestar a cada passo.
O rosto de May apareceu na porta me deixando confusa. Ela abriu o sorriso e entrou.- eu sabia que você não iria. Ninguém quer ir no segundo dia.
- é.
- se arruma.
- eu não vou.- andei até o sofá e ela me impediu.
- se arruma, Lia. Vamos chegar atrasadas.
Quase quarenta minutos depois eu saí de casa com ela atrás tagarelando de coisas aleatórias. Eu já havia tido algumas amigas na escola, mas coisas aconteceram e cada uma foi para o seu lado. Ou talvez não. Talvez fosse apenas o fato de que pessoas mudam.
Por fim chegamos ao local para assistir minha segunda "aula".
- como se sente?
- me perguntam muito isso ultimamente. As vezes eu não sinto nada. As vezes eu quero sumir e as vezes quero apenas que não perguntem.
Ela concordou.
Dessa vez quando entramos o olhar caiu em nós duas.
A roda foi feita e começou tudo de novo.- meu nome é Kiara e estou de quatro meses. Eu descobri a pouco tempo mas não pude abortar porque meus pais não me deixaram.- ela falou - eu não estou bem com isso, eu sabia que tinha o direito disso.- lágrimas aparecendo em seus olhos e logo caíram.- eu odeio isso e quero que acabe. Não estou pronta para isso.
Ela de repente desencadeou uma crise chorando e tremendo e todas se levantaram para a consolar. Foi uma coisa linda para falar a verdade.
- então, Lia, hoje quer falar alguma coisa?
Todas me encararam e eu neguei.
- tenta.- May segurou minha mão me encorajando e elas ficaram todas caladas esperando que eu começasse.
- quando quiser.
- e-eu sou Liara, como ja sabem.- começei.- e estou de cinco meses.
Elas continuaram quietas.
- engravidei usando DIU porque eu não queria ter filhos, tipo, nunca.- falei.- mas aconteceu. E o pai é um filho da mãe que fugiu disso me deixando sozinha e eu apenas tenho minha mãe que me aguenta com tudo isso. Meu pai morreu há alguns anos e então ficamos sozinhas.- limpei a lágrima que escorreu.- eu não quero isso. Não quero essa criança. Eu odeio tudo isso e quero que acabe logo. Eu não amo esse bebê, como a maioria de vocês que já estão familiarizadas com isso. Eu sinto que nunca vou conseguir dar tudo o que ele necessita.
- está tudo bem, Liara. Você não é a única.- uma menina falou. Seus cabelos eram como os meus assim como sua pele escura. Ela era perfeita. Sua pele brilhava e sua expressão acalmava qualquer um.- eu me sinto assim também. E é estranho tentar me familiarizar com isso. O que tem me ajudado é o grupo de apoio já que nem meus pais e nem o pai dele quer me ver. Eu fui expulsa de casa e moro com minha avó que foi a única que não me virou as costas. Eu chorava todas as noites e.. ainda choro.- deu um sorriso de leve.- ainda quero que alguém me diga que isso vai passar e que tudo vai voltar ao normal.
No final da aula eu conheci as outras mulheres.
Algumas mais novas que eu, outras mais velhas e todas com histórias difíceis que as trouxe até aqui. Aquilo foi bom. Foi a única coisa que me fez melhor ultimamente já que eu via que não era a única e que não estava sozinha nisso. Elas se apoiavam umas as outras.Eu acabei recebendo um panfleto sobre adoção e encarava aquilo sem nenhuma noção do que faria.
- vai ficar tudo bem.- May sorriu e se despediu indo em direção ao seu namorado.
Eles tinham muita coisa que eu e Zach não tínhamos. Era notável!
Seria bom ter ele presente e continuar a pessoa que ele aparentava ser.
Mas aparentemente essa gravidez trouxe enormes mudanças a minha vida afastando também quem não queria ficar.Levei a mão a minha barriga a tocando de leve.
Aquilo era completamente estranho e ainda difícil de acreditar.- Liara?
Me virei encontrando Hardin ao meu lado.
Sorri de leve assim que ele abriu um sorriso amigável.- o que está fazendo aqui?
- grupo de apoio para mães.- apontei para o grupo de grávidas que saíam do mesmo prédio.
- que bom. Eu trabalho aqui nesse supermercado.- ele sorriu e coçou a nuca antes de continuar.- eu sei que foi meio estranho aquele dia mas.. eu quero saber se aceita sair comigo.

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Inesperado
Chick-LitAtenção: esse é um livro sobre ( ou pelo menos tento): • maternidade real • aborto • e outras coisas. Eu vou apresentar minha opinião, se você não estiver disposto a saber, não leia. Se você estiver lendo essa história em qualquer outra plataforma...