Inesperado

Oito

Encarei o panfleto em minha mão e suspirei segurando em minha barriga e tentando diminuir o peso dela.
Entrei no local encontrando salas com placas assinalando o lugar que deveria ir.
Pela primeira vez não me senti o centro das atenções estando num ambiente porque eu não era a única.

- bom, vamos começar?- a mulher sorriu e todas se sentaram na roda mas eu continuei parada na porta até que o olhar dela caísse em mim e apontasse para a cadeira vazia do seu lado.- pode entrar.- sorriu e encarou as outras.- bom, hoje temos algumas pessoas novas então vamos fazer uma pequena introdução antes de falar de nossas evoluções?

Era um grupo de apoio para mães e foi recomendado pela médica. Caso contrário eu faria acompanhamento psicológico para ver se meu estado era tão mau assim.

Uma menina que parecia bem novinha começou.

- eu sou Mia, tenho quinze anos e estou grávida de seis meses.- falou.- a princípio foi horrível e muito assustador. Todos me olhavam e todos me perguntavam se eu não conhecia métodos contraceptivos.- fez uma pausa.- a culpa parecia ser toda minha e diziam que eu havia acabado com minha vida.

- alguma coisa a acrescentar?- ela assentiu.

- eu posso ter errado sim, mas não fui sozinha. Acontece que apenas se vê a mulher nessas situações e a culpa sempre cai nelas. Hoje, eu consigo revidar qualquer comentário que me possa machucar, já que eu não mereço isso. Nessa fase ninguém merece ficar escutando essas coisas porque todas ja sabemos e já escutamos. Nós só queremos nos sentir que tudo acabará bem.- sorriu.- eu odiei meu bebê no princípio, mas hoje estou melhor.

Elas aplaudiram e outra menina levantou a mão.

- meu nome é May e eu me atirei da escada assim que soube da gravidez.- ela falou mas ninguém esboçou nenhuma expressão.- eu estava de cinco meses quando descobri e todos pensaram que eu menti que não sabia, mas na verdade, meu corpo nem denunciou. Eu continuei menstruando normalmente e como sou muito magra meu corpo não mudou muito. Começei desconfiando quando meus seios aumentaram e meu corpo foi mudando. Fiz um teste de farmácia e deu positivo. Quando fui pela primeira vez ao médico, eu descobri minha gravidez e meu mundo caiu. Então na volta para casa eu caí da escada porque era a única solução visível já que descobri tarde e não dava para abortar.- ela tocou a barriga e sorriu.- hoje estou para completar oito meses e ainda estou me familiarizando com isso. Tenho o apoio de minha família e do pai.

Quando todos aplaudiram aquilo pareceu distante. Qualquer som estava distante porque eu parecia numa bolha.
Lágrimas caíram e meu coração acelerou.

- não quer compartilhar algo?

Elas estavam me encarando e eu não pude dizer nada, apenas estava em uma espécie de choque.
Pulei da cadeira quando a que estava do meu lado me tocou e encarei todas antes de correr o mais depressa dali.

- ei!- a voz veio atrás de mim e eu continuei correndo o mais rápido que podia.- pelo amor de deus eu não posso correr tanto.

Eu parei me sentindo exausta.
O vento tocava meu rosto me acalmando um pouco.

- obrigada.- ela falou segurando a barriga.- daqui a pouco não vai conseguir correr assim.- desviei o olhar e ela mudou sua expressão.- como é o seu nome?

- Liara.- limpei o rosto.

- sou May.- sorriu.- todas lá dentro tem histórias duras, difíceis e até inacreditáveis. Você não é a única.

- sim mas, você e aquela outra menina já estão familiarizadas com isso. Eu não quero isso. Eu não quero!

- se acalme.

- ESTOU CANSADA QUE TODOS ME MANDAM ACALMAR!

Ficamos em silêncio e as lágrimas começaram a cair novamente.

- estou cansada de chorar também.- falei.- estou cansada dessa história eu estou cansada de consultas, de dores, de vídeos, de desconfortos, de olhares de tudo isso. Eu quero acordar e saber que isso é um pesadelo.

- eu sei. Eu ainda acordo e confirmo se estava sonhando ou não.

Encarei sua barriga limpando o rosto.

- eu estou apavorada.- falou e me estendeu a mão.- todas nós estamos. Volte comigo?