Cap 33

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Katniss finge acreditar em mim, pois nós dois sabemos que eu estou mentindo, não tenho como me manter vivo.

— Então você tem de fazer o que eu disser. Beba sua água, acorde-me quando eu disser, e coma toda a sopa, não importa quão nojento ela seja! — ela grita, claramente perturbada.

— Feito. Está pronta? — pergunto, fingindo ansiedade.

— Espere aqui.

Passado o calor de nossa discussão, percebo como está frio aqui dentro. Deve ser por causa da umidade, ou da minha febre. Não comento nada com Katniss pois, se na verdade estiver calor, ela vai achar que estou piorando, e isso seria apenas mais um motivo para ela entregar sua vida indo nesse "banquete".

Ela volta com a sopa, que ainda está quente, e eu como tudo, até raspo o pote. Elogio a sopa, pois está muito boa. Apesar disso, ainda luto contra algumas ânsias, mas consigo disfarçar. Preciso fazer o que for possível para que Katniss fique aqui comigo, até o fim. Até o meu fim.

Quando termino de comer, ela me dá mais pílulas contra a febre, e me força a beber agua. Faço exatamente tudo que ela manda, não ouso ao menos reclamar, mas tomar tantos remédios, tem me deixado mais lento, os apagões estão cada vez mais fortes, não consigo lutar contra eles. Sinto, vindo de algum lugar dentro de mim, aquela sensação tão familiar e inebriante. Meu corpo amolece e meus olhos querem a todo custo fechar. Tenho medo de demorar a acordar, e Katniss ir até a cornucópia. Tenho medo de tantas coisas, que fica difícil achar algo que não me amedronte, mas nenhum deles é maior do que o medo de Katniss morrer. Lenta e dolorosamente deixo meus olhos se fecharem completamente.

Acordo assustado e vejo que Katniss não está aqui. Olho para a boca da caverna e vejo que o tempo parece não ter mudado muito. Isso significa que não dormi tanto tempo. Antes de o desespero tomar conta, Katniss entra sorridente na caverna.

— Trouxe para você um banquete. Achei amoras um pouco rio abaixo – ela diz animada.

Eu estranho um pouco sua atitude, mas fiquei tão aliviado de vê-la, que aceito as amoras. Quando ela coloca um pouco em minha boca, o gosto inicial é uma delícia, em comparação ao que comi nesses últimos dias, mas depois se torna algo tão doce... Franzo o cenho, sem conseguir me lembrar se amoras, são doces assim.

— Elas são bem doces – comento.

— Sim, elas são amoras doces. Minha mãe faz geleia com elas. Você nunca as provou antes? — ela diz, já colocando mais um pouco em minha boca.

— Não — digo, surpreso por nunca ter ouvido falar sobre essas amoras. — Mas o gosto é familiar. Amoras doces?

— Bem, você não pode consegui-las no mercado, elas são silvestres — ela responde, parecendo desinteressada e ansiosa, ao mesmo tempo.

Ela me faz comer mais um pouco, enquanto eu sinto uma sensação estranha crescendo dentro de mim.

— Elas são doces como xarope — comento quando me lembro que xaropes para dormir, são doces assim. Em casa temos um vidro disso. Estou prestes a engolir o ultimo bocado das amoras, quando finalmente compreendo o que isso significa. — Xarope.

Algumas decisões que eu tomei, para ajudar Katniss, fizeram eu me sentir, como se eu fosse um traidor. Me sentir assim foi horrível. Mas não tão horrível, quanto estou me sentindo nesse momento. Estou me sentindo traído. Estou sendo traído. Agora, consigo entender claramente, como Katniss se sentiu vendo minhas ações, sem saber qual era o propósito de tudo. O jogo que comecei para manter Katniss viva, se virou contra mim. Agora ela, que está disposta a acabar com a própria vida para me manter vivo. A diferença é que ela nunca saberá que minhas ações, boas ou ruins, foram todas com o propósito de mantê-la viva, também.

Tento cuspir o pouco que resta em minha boca, na esperança de que eu consiga dominar o efeito sonífero que contem nesses xaropes. Mas Katniss, pressiona as mãos em minha boca, e em meu nariz, me impedindo, fazendo eu engolir. Tento a todo custo vomitar, mas não consigo. É tarde demais. A sensação que eu estava sentindo se formar, era o efeito do sonífero, que agora, explode dentro de mim, fazendo meu corpo não responder aos meus comandos. Eu a olho, intensamente, querendo uma explicação, querendo ajuda para vomitar isso, e permanecer acordado. Mas ela fica imóvel, me olhando num misto de culpa e tristeza. Porque Katniss? Porque você está fazendo isso comigo? Você me prometeu... É tudo o que consigo pensar, antes de perder a consciência completamente. Você prometeu, Katniss. Você me prometeu.


Jogos Vorazes - Peeta MellarkOnde histórias criam vida. Descubra agora