Cap 39

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- Você está bem? – pergunto a Katniss, depois de um silencio considerável.

Ela dá de ombros evasivamente, e se encolhe numa posição quase fetal. Engulo seco, decidido a guardar toda minha dor, e agir da maneira certa, segundo os padrões dos jogos. Ficar feliz, afinal cada tributo morto, é um passo a mais para nossa vitória. Talvez se eu fizer Katniss entender isso, sua dor diminua. Não que isso tenha acontecido comigo, mas quem sabe...

— É só que... – Katniss começa a dizer, mas para como se não encontrasse as palavras certas. - Se não ganhássemos... Eu queria que Thresh ganhasse. Porque ele me deixou ir. E por causa da Rue.

— Sim, eu sei — respondo. — Mas isso significa que estamos um passo mais perto do Distrito Doze. — Pego os pratos de comida, e empurro um na direção dela. — Coma. Ainda está quente.

Katniss come o cozido, a comida que ela mais gosta, como se estivesse comendo terra.

— Significa também que Cato vai voltar a nos caçar – ela comenta.

— E ele tem suprimentos de novo.

— Ele estará ferido, eu aposto.

— O que te faz pensar isso? —pergunto.

— Porque Thresh nunca teria sucumbido sem uma luta. Ele é tão forte... quero dizer, ele era. E eles estavam em seu território.

— Que bom. Quanto mais Cato estiver ferido, melhor. Eu me pergunto como a Cara de raposa está se virando.

— Oh, ela está bem — Katniss diz, por algum motivo irritada. — Provavelmente será mais fácil pegar Cato do que ela.

— Talvez eles irão se pegar e nós poderemos simplesmente ir para casa — digo, torcendo para que isso realmente aconteça. Não quero ser responsável por mais nenhuma morte. Eu não suportaria mais esse peso. —Mas é melhor termos cuidados extra com as vigilâncias. Eu cochilei algumas vezes.

— Eu também — ela admite. — Mas não hoje.

Terminamos de comer em um profundo silencio. Essa conversa sobre nossos adversários me deixou enjoado. Me ofereço para ficar com o primeiro turno de vigilância, e Katniss nem tenta resistir. Apenas se deita ao meu lado, dentro do saco de dormir, puxa seu capuz a ponto de cobrir todo o rosto, e fica imóvel. Depois de um bom tempo, sei que ela adormeceu, pois sua respiração está mais calma. É terrível, ver o que esses jogos estão fazendo com ela. Conosco. Passo as horas seguintes pensando, se caso nós vencermos, se algum dia conseguiremos nos recuperar dos traumas sofridos aqui.

Queria deixar Katniss dormir o quanto eu pudesse. Mas além do sono, a fome voltou a me assolar, e eu decido acorda-la. Não seria justo comer ou cochilar enquanto ela dorme. Reparto o queijo de cabra e as maças, e acaricio seu braço fazendo-a acordar.

— Não fique brava — digo, quando ela se senta. — Eu tive que comer de novo. Aqui está a sua metade.

— Oh, bom — ela diz, e avança imediatamente em sua metade, dando uma mordida enorme. — Hmm.

— Fazemos uma torta de queijo de cabra e maçã na padaria — comento.

— Aposto que é caro.

— Caro demais para a minha família comer. A não ser que tenha ficado muito estragado. É claro, praticamente tudo o que comemos é estragado — conto, enquanto me acomodo no saco de dormir.

Adormeço em menos de um minuto.

Katniss está correndo pela floresta ao meu encontro, com uma cesta de amoras nas mãos. Quando ela se aproxima, me envolve em um maravilhoso beijo. É um dia quente, quente demais. Começo a suar e logo percebo que Katniss está em chamas. Fico desesperado, mas ela não parece sentir dor. Ela pega da cesta algumas amoras, e me estende. Pego-as ainda confuso, mas as como. Nesse momento uma coisa gelada parece ter entrado em meu coração. Sinto que estou morrendo. Katniss está chorando. E no céu, vejo olhos me observando. Olhos de uma garota, que eu nunca me esquecerei.

Jogos Vorazes - Peeta MellarkOnde histórias criam vida. Descubra agora