Era uma vez num castelo de um reino distante...
Um grito gelado e agudo cortou o silêncio do castelo. Do lado de fora, Rafael continuava com o ouvido encostado à porta, gemendo de cada vez que ouvia Safira gritar. Ansiava por poder consolá-la, mas sabia que ela jamais permitiria a sua entrada. Era apenas uma questão de honra, nada mais, e, no entanto, não tinha permissão para entrar. Seria um escândalo um homem assistir ao parto de uma mulher.
Começou a andar de um lado para o outro, no extenso corredor, quase derrubando vários candeeiros de pé alto, com velas que emitiam uma luz pouco intensa, bruxuleante. Parou, nervoso, com as mãos atrás das costas assim que ouviu um novo grito da mulher. Aquele filho era o que mais haviam desejado nos dezanove anos de casamento. Já quase tinham perdido as esperanças quando, certa noite, Safira anunciara que estava grávida. Finalmente iriam ter um herdeiro. Recordava esse momento com alegria, mas agora, pressentindo o sofrimento da bela mulher, quase sentiu vontade de fazer o tempo voltar atrás. Safira tinha já trinta e sete anos. Não era uma jovem, e temia por ela. Recomeçou a caminhar para trás e para a frente, sempre atento aos sons que provinham do quarto. Podia ouvir as três criadas incentivarem a mulher a dar à luz. Daria tudo para que Safira não tivesse que passar por aquele duro tormento.
Enquanto se afligia com o estado da esposa, à memória surgiu-lhe, quase que por magia, o dia em que os dois se conheceram e imediatamente se apaixonaram. Safira não tinha mais que dezassete anos e Rafael acabará de fazer vinte. E acontecera tudo exatamente vinte anos atrás.
***
A noite caíra há um par de horas, e a lua brilhava no céu límpido. O Baile da Floresta Dourada era o acontecimento do ano. Todos os seus habitantes se apresentavam para celebrar a Primavera. As mulheres mais novas haviam colocado uma coroa de flores na cabeça e corriam de um lado para o outro, entusiasmadas. Entre todas elas, destacava-se uma. Era ágil, esperta e enigmática. Adorava passear solitária mente pelos caminhos sinuosos da Floresta Dourada e murmurar aos animais e às plantas. Parecia levitar a poucos centímetros do chão e era raro ouvir-se-lhe uma palavra. O seu nome era Safira. Ela era apenas a filha de um pobre lenhador, que perdera a mulher há já algum tempo. Safira tinha dezassete anos e toda uma infância sofrida marcada nos lindos olhos verdes, de forma amendoada. No entanto, transportava consigo alegria e suavidade. Todos os rapazes a admiravam, mas Safira só tinha em mente uma pessoa: Rafael, o Príncipe da Floresta Dourada. E, juntamente com a sua paixão secreta, guardava dentro de si a certeza de que Rafael nunca iria olhar para ela. O Príncipe da Floresta Dourada! Vira-o apenas uma vez, mas fora o suficiente para nunca mais tirar da cabeça o rapaz de olhos negros e cabelo levemente selvagem que parecia estar envolto numa penumbra de magia. Aliás, como toda a Floresta Dourada. Ele não a vira. Acontecerá num daqueles dias em que Safira se embrenhara nos caminhos mais obscuros da Floresta Dourada, em busca dos fantásticos segredos que o seu pai jurava estarem ali escondidos. Baixara-se para colher uma flor que lhe chamara a atenção quando ouviu ruído atrás de si. Aninhou-se ainda mais no meio da vegetação, tentando perceber quem passava. Logo ali ao lado havia um caminho de terra batida, que serpenteava por entre as mais belas árvores. Safira sabia que o caminho conduzia ao enorme castelo dos Reis da Floresta Dourada.
Deslumbrada, viu passar um magnífico coche preto, puxado por quatro majestosos cavalos brancos. Percebeu imediatamente que se tratava do coche real. Esticou um pouco mais o pescoço, de forma a vislumbrar melhor o Rei e a Rainha. Nunca estivera tão perto deles como naquele momento, e o seu coração palpitava de entusiasmo. Porém, quem ia lá dentro não era o Rei e a Rainha. O coche transportava apenas um jovem. Safira ficou hipnotizada por aquele olhar que fixava o horizonte. Soube desde logo que aquele só podia ser o Príncipe da Floresta Dourada. Tinha conhecimento de que se chamava Rafael, e que fazia vinte anos no dia do Baile da Floresta Dourada. Nada mais sabia sobre ele e era a primeira vez que o via. Seguiu o coche com o olhar, até o perder de vista. Não contou a ninguém que viu o príncipe, nem mesmo ao pai, para quem não tinha segredos. A razão para o seu silêncio era aquele calorzinho no coração, ao relembrar os olhos negros de Rafael. Guardou para si aquela imagem e regressou a casa, esquecendo a flor no chão.
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The Princess Of The Golden Forest
FantasyLua é a Princesa da Floresta Dourada, um reino aparentemente invisível aos nossos olhos e protegido do terrível Maldito. Vítima de uma infância marcada pela indiferença do pai e pela admiração que sente pela mãe que nunca conheceu, Lua fecha-se num...