Morte e Vida

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O funeral foi uma cerimónia simples, mas muito participada. Todos os habitantes da Floresta Dourada queriam dar o último adeus àquela que estava destinada a ser a Rainha da Floresta Dourada se a morte não a tivesse levado para o desconhecido.

O caixão saiu em cortejo desde o castelo, com Rafael e os Reis logo atrás, seguidos de todos os habitantes. As crianças levavam grandes ramos de flores, as mulheres choravam e os homens rezavam.

O cortejo desceu o longo caminho térreo que separava o castelo do resto da Floresta. A distância era longa, mas ninguém estava preocupado com isso. O silêncio reinava, apenas quebrado por alguns soluços e pelos cascos dos cavalos pretos que transportavam o caixão no coche reservado para aquelas ocasiões. Era um coche extremamente parecido com aqueles que os Reis usavam todos os dias, com a diferença de que este era aberto na parte de trás, para que a uma pudesse ser Vista. O caixão era feito de madeira pintada de branco. Era muito simples e simultaneamente sofisticado, com desenhos em relevo.

Safira seria "sepultada na capela abandonada, como era seu desejo.

Ao passarem próximo da Clareira Principal, o pai de Safira juntou-se a eles. Estava muito abatido.

Quando Safira e Rafael se casaram, ela pedira ao pai para ir viver com eles no castelo, mas o velho lenhador recusara, alegando que nunca iria habituar-se a todas aquelas mordomias, preferindo a Vida simples que sempre tivera. Além de que aquela casa lhe trazia doces recordações da esposa há muito falecida.

Safira descia muitas vezes à Floresta para Visitar o pai na sua nobre e singela casa e a mãe na capela abandonada.

Quando o lenhador soubera que em breve seria avô, ficara tão feliz que esperava esse dia com ansiedade. Mas agora. sofria, pois isso levara-lhe a filha. Ainda não tivera coragem de conhecer a neta, tal era a sua dor. Sentia-se vazio: perdera a mulher muito cedo, e a sua filha partia ainda antes dele.

A procissão seguiu pelas entranhas da Floresta, o mesmo caminho que fora pisado por Safira e Rafael, vinte anos antes. Foi com algum espanto que o Príncipe reparou nos muitos animais que se aproximavam para ver a multidão passar. Lebres e coelhos, pirilampos e borboletas, corsos e veados, aves e répteis, todos pareciam saber que acontecimento era aquele, querendo também despedir-se da eterna amiga. Muitas vezes, Rafael dava pelo desaparecimento de Safira, descobrindo em poucos instantes, que ela fora à Floresta falar com os animais. Nem com o passar dos anos a esposa deixara de se comportar dessa forma. Quase todas as noites saía para a varanda do quarto, antes de se deitar, e observava e falava com a lua, sua fiel companheira. Nunca partilhara com o marido os temas da sua conversa. Safira sempre fora muito independente, poucas vezes deixando Rafael participar nos seus segredos. Nunca se habituara à Vida de Princesa, refugiando-se no seu canto. No entanto, sempre fora muito querida por todos, incluindo os Reis. E mesmo com a sua Vida muito própria, Rafael amava Safira, desde que a Vira no Baile da Floresta, vinte anos antes.

Era em tudo isto que o Príncipe pensava, à medida que ' se aproximavam cada vez mais da capela.

Assim que lá chegaram, todos pararam, formando um semicírculo enorme, partilhado por pessoas e animais. O coche com o caixão à vista foi transportado até ao centro do semicírculo, de modo a que todos o pudessem ver. Rafael, os Reis e o velho lenhador posicionaram-se ao lado da uma, voltados para todos os outros. As crianças aproximaram-se e pousaram as flores em cima do caixão, transformando-o num imenso jardim. Algumas iam também ao pé dos cavalos e faziam-lhes uma carícia na cabeça, para depois voltarem ao local onde estavam anteriormente.

O Rei chegou-se à frente e tomou a palavra, como sempre fazia em cerimónias, fossem fúnebres ou festivas. Falou do quão doloroso era para toda a Floresta Dourada a perda que sofriam, o quanto Safira significava para o reino, da dor de um marido e de um pai, da inevitável dor que a filha dos Príncipes sentiria quando crescesse, da magia que envolvia Safira.

The Princess Of The Golden ForestOnde histórias criam vida. Descubra agora