diários de adultério, um romance de luisa acosta

DUDU

contar isso tudo pra dudu é dolorido demais. especialmente porque eu dizer pra ele que rafael voltou pra minha vida no momento em que eu senti que ele não podia me ajudar é muito pesado. é pesado pra mim sentir. é muito pesado falar. e eu nem posso imaginar como está sendo pra ele ouvir.

mas ele se explicou imediatamente.
é impressionante como a gente vê as coisas sempre sob as nossas perspectivas, e quando a gente conversa de maneira franca a gente entende exatamente de onde vem os problemas e as angústias do outro.
sob a minha ótica, ele não se importava. mas agora ele disse pra mim que ele, na verdade, não entendia a gravidade da situação. que ele não tinha ideia do que tava acontecendo. e que não queria me sobrecarregar perguntando ainda mais e me fazendo pensar ainda mais em tudo aquilo. então ele tentava apenas me distrair, e mostrar o lado mais leve das coisas.

é surreal pensar como muitas vezes tudo que a gente precisa é realmente se comunicar. como a gente vai deixando a vida engolir a gente nos achismos e nas certezas. nem tudo é óbvio. tudo que é importante precisa ser dito. e esse é um grande aprendizado dessa conversa.

ele ia me olhando, calma e concentradamente.
eu ia contando essa história toda de rafael. narrando cada um dos fatos.
o corpo dele se afastava do meu, me repelia.

mas isso não era tudo. ele me pedia mais. ele queria mais verdades, mais detalhes, mais histórias.

eu me senti a pior das pessoas. eu sentia como se cada uma das minhas palavras cortasse um pedaço da carne dele. mas eu sentia também que com essa mesma faca eu ia cortando as cordas que me mantinham presa numa visão de mim que eu tinha projetado mas que não era necessariamente real.
eu questionei como eu fui capaz de não contar nada disso pra ele por anos. e como ao falar, por mais difícil que parecesse, parecia certo.

então eu fui contando, e contando. e cortando, e cortando.