diários de adultério, um romance de luisa acosta

DUDU

os dias todos tem sido muito sobre isso. a gente conversando sobre cada sentimento, cada vontade, cada verdade. olhando pra todas as nossas feridas abertas dez, cem, mil vezes.

é impressionante pra mim a forma como ele está lidando com tudo isso.
muito maduro, calmo, amoroso. disposto a entender, ouvir, trocar, conversar.

a cada minuto que passa ele se mostra mais presente e mais compreensivo.
noutro dia ele me disse uma coisa muito profunda, e muito bonita.
disse que existe uma beleza, um tesão, em ver alguém completamente nua. em me ver despida de tudo que me amarra ao meu medo de ser julgada.

mesmo em meio a todo esse peso, temos encontrado maneiras de sermos leves. temos transado muito mais, com muito mais fogo. por que demorei tanto pra contar mesmo?

ah, tem dias que tudo na nossa vida é celebrar.
celebramos as manhãs com amor e sexo e café e sol e baseado.
e é nesse ritmo que estamos acordando todos os dias. a primeira coisa que fazemos é, juntos, passear o doguinho - apesar da adoção do pastrami ter sido uma escolha minha, a função de passear com ele acabou se transformando numa responsabilidade quase que exclusiva do dudu. e ele sempre reclamou de ter que fazer isso sozinho.

eu sempre soube que é injusto não dividir esse peso, mas por outro lado, eu me sentia aliviada de ficar sozinha.
era uma meia hora que eu tinha só pra mim.
pra tomar uma coca cola gelada sem sentir um olhar de cobrança, pra tomar um banho quente de banheira, pra ligar pra alguém...

só que eu não quero mais estar longe. nem mais por um segundo.
as 24 horas que o dia tem são poucas para comemorar a nossa vida, a existência e o amor.
e é por isso que agora a gente sai juntos todo dia para andar com pastrami, comer algo gostoso e aproveitar o sol na beirada da água. de tarde a gente tira um tempo pra aprender a tocar violão, compor bagunças juntos, fazer fotos, fazer amor.

mas eu sei que isso tudo tem altos e baixos e lá no fundo ele está em pânico sabendo que em mais 15 dias lá vou eu outra vez ao brasil.

já tinha comprado a passagem há um tempão; desde que a crise de psoríase começou. e não bastasse eu estar indo em pleno carnaval, no meio desse furacão todo, numa manhã, acordo e ele está encasquetado com a mensagem em nosso marquee luminoso em cima da cômoda:

"find beauty in yourself"

apesar de estarem ali há mais de ano, ele arranca as letras com raiva e me diz que aquilo era o que estava errado. que é uma frase rasa e que manda a mensagem errada.
já to cansada de errar. não faço idéia do que ele quer dizer com isso. pergunto o que ele quer que eu escreva. ele diz que não é sobre ele; eu é que tenho que saber o que deve ser escrito lá.

enquanto ele tomava banho, fiquei ruminando sobre isso.
fui lá e escrevi: "face your demons"

assim que ele saiu do banho, a primeira coisa que ele viu foi a frase posta ali. ele me olhou com afeto, sorriu e deixou o sorriso no canto da boca. balançou a cabeça positivamente, piscou e saiu.

mal fiquei sozinha, feliz por aparentemente ter entendido o que ele quis dizer; ele voltou:
"no espírito do que você escreveu, acho que é importante você contar tudo isso que você sempre escondeu pras pessoas que você mais ama: sua mãe e seu irmão."
caralho. eu entendo. e concordo.
mas vai ser foda.
a minha mãe vai ter um treco. vai ser uma decepção tão tão grande pra ela.
meu irmão vai ficar nervoso. mas vai fingir que não tem nada acontecendo.

não bastasse toda essa dificuldade, dudu ainda complementa:
"e eu acho que você deveria ir pra curitiba encontrar o rafael."