BERNARDO

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estou no avião, mas pelo visto aconteceu alguma coisa que o voo está demorando um pouquinho mais do que o esperado pra sair.
a carta do dudu ainda tá aqui, na minha mão. já olhei pra ela um tanto de vezes.
li, reli, sorri.
ele me faz tão feliz...

às vezes eu fico pensando porque que eu faço as coisas assim...
(e a noite de verão ela vai passando, com o seu cheiro doce de jasmim - como diria caetano)

uma explicação única me vem:
porque eu sou assim. eu sou assim desde sempre.
ou será que eu me forjei assim pelas coisas que eu vivi e a forma como eu vivi?

me lembro de bere, meu primeiro namorado.
eu tinha 14 pra 15 anos quando eu conheci bernardo.
ele era o cara mais lindo que já tinha pisado na terra. e mais charmoso. e mais inteligente. e mais e mais e mais.
eu olhava pra ele com total e absoluto fascínio.

por meses eu só fui me apaixonando de longe, vendo ele de longe.
até que um dia eu tinha um aniversário pra ir e ele foi me acompanhando.
na época laura namorava molico, e como os meninos eram amigos, fomos juntos, os quatro.|
eu e ele ficamos pela primeira vez nesse dia.
e dali pra frente, a minha paixão platônica se intensificou.

ela não era bem platônica, porque ela era correspondida.
não exatamente. semi-correspondida, vai?!
eu diria até "endossada".
é. era uma paixão endossada. apenas.

de todo modo, não era como deve ser numa relação saudável.
mas o fato é que a gente começou a se falar todo dia, se ver todo fim de semana, comemorar juntos as datas importantes.
por mim, desde o começo, eu já tava namorando com ele.
então eu lidava com a relação e tratava ele já como um namorado.

mas a verdade é que essa data só chegou pra ele 6 meses depois - pelo menos oficialmente.
na prática, acho que não chegou nunca.
nossa história durou um pouco mais de 2 anos.
e ao longo de todo esse tempo eu lidei com excesso de insegurança, controle, ciúme, medo.

ele era tão perfeito - da forma como eu entendia que um namorado tinha que ser - que eu tinha absoluto pânico de perdê-lo, e eu passava por cima de todos os absurdos que ele cometia. sempre fingindo que eu não via. sempre chorando sozinha, mas rindo quando estava com ele.
eu sabia dos mil casinhos que ele tinha. talvez eu não soubesse de todos. mas eu sabia de alguns. e aquilo era o suficiente pra me deixar muito muito mal. sobretudo porque ele sempre negava. ele sempre mentia. ele sempre dava um jeito de contar outra história. de me fazer acreditar que eu tava vendo coisas onde não tinha.
que as minhas amigas eram malucas; não ele. ele era perfeito.
o máximo que ele fazia era passar o dia na fazenda, sem contato com o mundo exterior, brincando de montar o som do carro com os amigos.

as coisas foram se intensificando. eu perdi a virgindade com ele, numa viagem que a gente fez juntos 6 meses depois de começarmos a namorar.
e naquele dia, na nossa primeira vez, assim que a gente transou, ele foi tomar banho.
e eu - que achava aceitável mexer no celular dele - fui logo futucando pra ver as mensagens.

enquanto eu tava ali, extasiada por ter vivido a minha primeira vez, eu dei de cara com a realidade. outra menina, que tava na mesma cidade, chamando ele pra fazer alguma coisa - e ele topando, óbvio.

não foi a única vez que aquilo aconteceu.
na verdade passou a acontecer com uma frequência absurda.
praticamente todas as vezes que ele esquecia o celular perto de mim por tempo o suficiente pra eu olhar.

sempre tinha uma mensagem. um flerte. uma festa. uma coisa.
no começo eu surtava. chorava. perguntava.
ia até ele e dizia que ia terminar.
ai voltava atrás. logo na sequência.

eu não tinha discernimento pra entender o quanto tudo naquela relação tava errado.
aquilo era tudo que eu conhecia.

com o tempo eu fui cansando de dizer. fui cansando de brigar.
cada vez menos eu dizia. e menos eu brigava.
aquilo não foi só minando a minha confiança.
foi minando a minha fé na fidelidade.
eu comecei a entender que ele não ia ser fiel, nunca.
o que eu não entendia naquela época - e obviamente levou uma vida inteira pra eu conseguir chegar aqui - é que eu tava numa relação completamente abusiva.

diários de adultério, um romance de luisa acostaOnde histórias criam vida. Descubra agora