RAFAEL

293 15 8
                                    

eu nunca me senti tão triste e humilhada como eu to me sentindo agora.

ontem, lá pelas cinco da tarde, ele chegou do trabalho. eu ainda tava de cara amarrada e já com o computador aberto pra comprar uma passagem de volta.

só que a gente foi conversando. e se entendendo.
eu disse o que tinha me chateado. ele pediu desculpas.
disse que agora ele é todo meu. 100% meu durante todo o resto do tempo que nos resta.
e me chamou pra assistir um filme e comer alguma coisa.

eu amoleci.
ameba.

só que quando a gente tava no sofá, cheio de amor e carinho e chamego, vendo django, tali me ligou. ela disse que dudu estava muito mal. que ele tinha estado com a mãe dela, e que até ela, que mal o conhece, já tinha reparado na confusão.
ele não contou pra ela o que era, mas mesmo assim ela se preocupou com o estado dele e acabou avisando pra tali, que me ligou.

quando eu desliguei o telefone, meu semblante mudou. minha energia mudou. isso quebrou absolutamente o nosso clima aqui. a energia pesou na hora. o rafa sentiu. fechou a cara e ficou a léguas de mim. foi pro canto do sofá, se perdeu no celular...

só que eu queria também aquele espaço. naquela hora minha cabeça e meu coração estavam em miami. eu não aguentei e mandei mensagem pro dudu.

"amor.
eu sei que a gente ficou de não se falar.
mas não consigo parar de pensar como você tá."

"Lu,
Não se preocupa comigo. Foca no que
vc precisa fazer ai. Descobre tudo que
você precisa descobrir sobre você etc.
Percorre teu caminho.

Quando você voltar pro Rio ou
quando eu voltar pra Miami
a gente conversa."

"você não tá em Miami?"

eu achei confuso isso que ele disse de voltar pra miami.
ele tinha falado de ir acampar sozinho na semana que vem. será que ele antecipou isso?

ele nunca mais me respondeu. comecei a ligar pras pessoas. precisava saber onde ele tava.
mafe falou que ele tinha pra casa da ju. fiquei mais tranquila. só de saber que ele estava com amigos, aquilo me deixou mais em paz.

só que se ele emendar a minha volta de curitiba nessa viagem, fudeu.
no meio do mato não pega celular.
puta merda.
só me faltava essa de ter que esperar uma semana inteira pra falar com ele.

em curitiba o clima não ficou menos pesado.
fomos dormir mal. não conseguimos sequer ir pra cama. apagamos ali no sofá de um cansaço emocional forte e pesado.
mas foi aquele apagar ruim. aquele apagão.
que no meio da noite você acorda sem entender onde você tá e o que tá acontecendo.

abracei ele bem forte e pedi pra irmos pra cama.
fomos, num movimento quase automático.
dormimos mal.
acordamos mal.

mas eu não queria ficar naquele clima. não combina com a gente ficar assim, se estranhando.
nada mais justo que tentar conversar e se acertar.
só que rafael não conversa sobre ele. sobre o que ele sente.
ele é capaz de passar um dia inteiro descrevendo em minúcias uma cena de um filme, mas quando ele precisa falar sobre ele, não sai nada.

isso vem de toda a história dele. de toda a criação. de toda a bagagem.
ele nunca aprendeu a ser amado.
eu abracei ele bem forte, e disse olhando nos olhos dele que ele precisava se permitir ser amado.
"eu não consigo, luisa. eu não consigo.", ele me disse, com o olho cheio d'água e a voz marejando, mas firme.

ele não aprendeu a permitir que ninguém chegue perto dele o bastante pra reparar as suas dores. ele não se permite sentir. ele vai afundando cada sentimento. um em cima do outro, em cima do outro, de forma tal e tão pesada, que ele não consegue falar sobre eles. não consegue acessá-los.

diários de adultério, um romance de luisa acostaOnde histórias criam vida. Descubra agora