Como se fôssemos apenas um - Parte I

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Stella

Finalmente, chegou o dia do tão esperado jantar, não vejo a hora do meu pai conhecer os pais de Lucas, apesar do meu pai já ter ido me deixar várias vezes na casa dele e do Lucas já ter vindo aqui mais vezes ainda, eles nunca se viram. O pai de Lucas, Rufus, vive fazendo viagens a trabalho e Adeline, a mãe de Lucas, também vive ocupada. Agora chegou o momento certo para todos se conhecerem.

Começo a me arrumar antecipadamente, o jantar é às 19 horas, porém, o trânsito até o outro lado da cidade é um inferno. Quanto antes nos organizarmos melhor. Chego em casa após ter ido no salão para arrumar meu cabelo. As vezes a gente merece um dia para cuidarmos da gente, aproveitei essa chance hoje.

—Pai? Eu não acredito, o senhor ainda está pintando — Digo ao vê-lo no atelier, sua camisa branca toda suja de tinta, como tem sido habitualmente —Vamos nos atrasar desta forma.

—Stella! Eu já estou indo tomar banho... —Ele ajeita as lentes do óculos, assim como eu costumo fazer, depois limpa as mãos sujas em um pano.

—Estou vendo... por favor, apresse-se! —Imploro a ele enquanto vou me arrumar.

Visto um vestido branco de cetim alongado, levemente cintilante, é um vestido antigo, comprei em uma loja chique enquanto passeava no mercado de pulgas de Saint-Ouen, no metrô Porte de Glignancourt, apesar do nome, é um lugar bastante agradável. Pego minha bolsa e coloco meu celular dentro, ainda está cedo, calço uma sandália com salto baixo e delicada e desço a escada.

—Uau! — Expressa ele, claramente estupefato. —Você está tão linda!

Coloco uma mecha atrás da orelha e sorrio em agradecimento.

—Obrigada pai! Já podemos ir? — Pergunto apreensiva.

—Está ansiosa assim para encontrar os pais do seu namorado? Só espero que eu não seja surpreendido com um pedido de casamento...

—O quê? Pai! —Dou um grito o repreendendo pela zombaria.

—É brincadeira, só estou tentando descontrair antes de encontrar com os pais do lobo...

—Eu sei disso, mas por favor, só não "brinque" com o pai do Lucas, ele não tem o mesmo... senso de humor que o senhor.

—Tenho certeza que não, ninguém tem.

Entramos no carro, mais uma herança do meu avô, não era grande coisa, não era como se o meu avô fosse rico nem nada, mas ele sabia viver e sempre soube como preservar seus patrimônios, assim como a nossa casa. Enquanto ele dirige ao som de The Beatles, I feel fine, tento aproveitar ao máximo a energia boa que emana, esperando que ela ainda sobreviva até o jantar. Conheço o meu pai e sei como ele pode ser difícil também, com o seu humor negro e piadas esquerdistas, conversei com ele sobre isso e o pedi encarecidamente que evitasse ao máximo.

Damos a volta pelo colossal Arco do Triunfo, as luzes aqui reluzem tanto que sinto meus olhos flamejarem, decidi colocar lentes de contato hoje, mesmo detestando. Ao percorrer a Avenue Champ-Élysées relembro o dia em que eu e Lucas caminhamos ensopados. No mesmo dia em que fui na casa dele pela primeira vez, nossos beijos molhados, meu banho na sua banheira, dou um leve riso ao relembrar.

—O que foi? —Pergunta meu pai.

—Nada...só estava relembrando bons momentos. —Respondo.

Sinto falta de viver momentos assim, dele, entretanto, também estou tendo momentos tão bons sem ele, sinto uma pontada de culpa. O céu era de uma cor cinza indecifrável, assim como os olhos castanhos de Lucas. Chegamos e descemos do carro, a rua estava gélida, a casa de Lucas estava ainda mais bela coberta por um véu branco invernal, a visão clara e o contraste evidente entre o céu e a superfície, a forma como os troncos de árvores convertem-se em alicerces e a grandiosa casa parece um solo impenetrável.

E se a chuva cair?Onde histórias criam vida. Descubra agora