Capítulo 11

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  Despertando de um sono profundo, sentia uma mão, que acariciava levemente a coxa com movimentos longos e lentos, hora com movimentos circulares, horas com movimentos retos, seguidos de pequenos apertos, que trazia sensações extremamente agradáveis. A princesa, mesmo desperta, teimou em abrir os olhos para aproveitar ao máximo o que sentia. Porém, ao perceber que a voz rouca e sussurrada que chamava seu nome, não era de seu príncipe, mas sim do rei Altair. Abriu os olhos de forma abrupta, torcendo para que seus ouvidos estivessem lhe pregando uma peça, mas não. Enojada, deparou com a feição contorcida do rei, com os olhos virados, enquanto se tocava, chamando seu nome.
  Seu grito que ecoou por todo o quarto, fazendo com que aquela feição sádica de prazer, desse lugar a um rosto de pânico. O rei pulou para trás, se recompondo, tentando justificar algo que era visivelmente impossível. A princesa ainda gritando, se cobriu com o lençol ao ver que ele se aproximava.   Ele pulou sobre ela a imobilizando e abafou seus gritos com uma de suas mãos.
  Ela se debatia, temendo por sua vida, sem forças para qualquer tipo de reação, ante a sua. Ele sorria, enquanto passava a mão pelo seu corpo, por cima do lençol.
  – Bem que eu poderia. Seria diferente com você acordada. – dizia o rei, enquanto lambia os lábios, se deliciando com aquele ato. – Vou te soltar, mas acho que não preciso lembrar que esse é um segredinho nosso.
  Ao libertá-la, saindo de cima dela. Ela com toda força que possuía, lançou a mão em seu rosto.
  – Você é um doente. – gritava. – é um homem morto. Muita audácia da sua parte invadir meus aposentos e abusar de mim enquanto durmo. – gesticulava trêmula, com a ira saindo por seus poros e com as lágrimas escorrendo dos seus olhos.
  Ele olhava ao redor com um ar debochado. Rindo para ela, enquanto ela lançava toda sua cólera sobre ele.
  – Não existe segredo algum. – Dizia ela com o dedo apontado para ele. Meu pai vai saber e vai acabar com você num estalar de dedos. Você sabe que ele sempre foi mais forte que você.   Continue rindo. Ele vai te destruir, te transformar em pó e te colocar em seu devido lugar, como ele sempre fez. Seu rei de araque.
  Deixando o ar de sarcasmo escapar de seu rosto, ele se aproxima dela mais uma vez, mas se contém, soltando novamente o sorriso debochado.
– Me diga princesa! Como seu pai vai realizar tal ação? – Pergunta ele lentamente antes de gritar. – Se o seu amado pai está morto!... Junto com sua querida rainha!... Sua mãe! – As gargalhadas do rei Altair ecoaram por todo quarto.
  Rapidamente às palavras que saíam de sua boca emudeceram, seus olhos cariam junto com seus ombros e braços, desistindo de lutar. Por mais que quisesse acreditar que era apenas uma invenção do rei para sair por cima, todas as evidências apontavam para o contrário. A falta de medo ao ouvir o nome de seu pai e o prazer com que ele noticiou a sua morte, não deixava dúvidas.
  Antes mesmo que ela pedisse para que ele se retirasse, ele virou as costas, ainda carregando um ar de deboche e vitória, anunciando que iria deixá-la pensando, sobre aquele pequeno segredo.
  – Podemos até repetir, aposto que irá gostar. E a propósito eu a aconselharia a olhar ao redor, para notar que esse não é o seu quarto e muito menos o seu Palácio.
  Assim que o rei se retirou e a porta do quarto bateu. Os soluços e as lágrimas que tentava conter romperam todas as barreiras e extravasaram, enquanto socava a almofada de raiva por não ter tido forças pra reagir. Por minutos seguiu naquela inconsolável tristeza, até sentir um suave toque em seu ombro. Sem hesitar, cerrou o punho direito com toda a sua força, cravando as unhas na palma da mão. Girou o tronco o mais rápido que pôde, desferindo um violento golpe na face do seu agressor. Um breve grito agudo denunciava quem ia ao chão desacordada na borda lateral de sua cama. A princesa vendo quem atingiu com seu golpe cheio de ira, rapidamente correu para acudir a enfermeira inconsciente, enquanto era observada por outra, que olhava tudo encostada na porta, com receio de se aproximar e ter o mesmo destino da amiga.
  – Rápido!... Me ajude aqui. – exclamava e gesticulava para que a outra menina se aproximasse.
  Prontamente ela foi ao socorro de sua amiga, que já recobrava a consciência.   Com o pano que seria destinado ao banho da princesa. A cuidadora o molha na bacia e passa no lábio inferior, cortado pela força do impacto do golpe. A enfermeira, apoiada com as costas na cama, desperta com a dor e imediatamente pede desculpas por tê-la tocado, pensando que aquela agressão fora direcionada a ela por tal ato, e ao mesmo tempo tentava se levantar e voltar ao trabalho. Mas foi impedida pela princesa.
  – Descanse um pouco. – ordenou a princesa enxugando às lágrimas e com as mãos visivelmente agitadas. – Eu que devo me desculpar com você, pensei que aquele monstro tivesse voltado para... – cortando o assunto ela se levanta da cama e caminha a passos acelerados para o armário. Se depara com um espaço, preenchido por enormes teias de aranhas e poeiras.
  – Onde estão minhas roupas? – grita para as outras no quarto.
  Uma tentou responder, porém foi interrompida por mais outra pergunta.     A desconfiança da princesa aumentava a cada momento. Pensava que elas estavam ali para tentar silenciá-la a mando do rei, para que sua denúncia não chegasse aos ouvidos da rainha. Pegou uma fina barra de ferro usada para mexer a brasa na lareira, na tentativa de se proteger de qualquer investida das duas.
  – Se acalme princesa. – dizia a que anteriormente estava encostada na porta. – estamos aqui com a missão de cuidar da senhora.
  – Cuidar de mim roubando minhas roupas, não falando que meus pais morreram?... Tenho que ir ao enterro. Ontem eles estavam vivos, voltando da minha festa... Meu noivo?... Cadê meu noivo, O príncipe Felipe?
  Ambas as enfermeiras abaixaram os olhares. A que levou o soco, com o lábio inferior já inchado, dá um passo pra frente, largando a toalha, com uma pequena mancha de sangue, sobre a cama, se sentou e dando alguns tapinhas no colchão a convidando para se sentar.
  A princesa Maria, mesmo ainda desconfiada das intenções das duas, deixa um pouco seu nervosismo de lado e se aproxima da cama, mas sem atender ao pedido de se sentar que a enfermeira tinha feito. – Pode buscar uma jarra cheia e um copo de água para a princesa?
  A enfermeira mais próxima da porta acenou com a cabeça e se retirou do quarto, deixando a porta encostada. Maria se levantou, caminhou em direção à porta e a trancou.
  Tentando não demonstrar temor e transparecendo certa calma a enfermeira disse: - Não há mais o que temer a porta esta trancada e se eu tentasse alguma coisa contra a senhora, o que não vai acontecer, a vantagem seria sua, porque carrega uma barra de ferro.
  – Pare de rodeios e me diga logo o que está acontecendo. – gritou impaciente a princesa.
  – Bem. A nossa missão aqui no Castelo, era cuidar de você em tempo integral, enquanto estivesse no estado em que estava. Pelo que eu soube, nos corredores do Castelo, foi um acordo que o príncipe Felipe fez com seus pais.
  – Mas cuidar de mim?...
  – Sim! Depois do acidente...
  – Está aí uma mentira!... Não sofri acidente nenhum... Eu dormi ontem e acordei com aquela escoria literalmente sobre mim.
  A enfermeira, para mostrar que não estava mentindo, pediu para que ela descobrisse suas pernas e olhasse para a cicatriz causada no dia do acidente. Incrédula ela afasta os panos que cobriam suas pernas e constata que realmente a enfermeira falava a verdade. – Isso aconteceu há quatro anos, quando você e seus pais sofreram o acidente que estava falando e que os levou a óbito.
  – Como pode alguém dormir por quatro anos?
  – Nós pensávamos que a senhora jamais acordaria, mas cuidávamos assim mesmo. Dando banho, penteando, derramando sopa em sua boca para alimentá-la. Mas a senhora está aqui, viva, falando.
  – Então meus pais morreram mesmo?... Tendo a confirmação vinda de outra pessoa, fez com que ela largasse a barra de ferro, que naquele momento era um fardo dispensável, e sentasse ao lado da enfermeira enquanto as lágrimas voltavam a escorrer pelo seu rosto. Mas as batidas na porta fazem com que o estado de alerta retornasse mais uma vez. A enfermeira que voltava com a jarra e o copo de água esperou por uns minutos, enquanto ela buscava uma melhor posição para golpear o rei com a barra de ferro, que havia reavido, caso ele entrasse junto a ela.
  Depois de se certificar que a enfermeira estava sozinha, a princesa pediu para que uma delas lhe arrumasse roupas para que ela pudesse alertar a rainha o que o rei acabara de fazer com ela.
  – Não acho que seria prudente fazer isso princesa. Falava a enfermeira.
  – Como assim prudente você esta defendendo aquele porco? ... Sabia que vocês estavam coniventes com tudo isso.
  – Não minha princesa. Não podíamos fazer nada mais. – Dizia a enfermeira e continuava, enquanto abaixava uma das alças do vestido e mostrava parte das costas marcadas com chibatadas que havia levado a mando do rei. –   Levamos suas ações à rainha. Que naquele momento, considerou uma afronta falarmos do rei daquela forma.   Ficamos sem comida por três dias, como punição pela injúria. Depois de algumas semanas, enquanto estávamos de pé, na entrada do quarto, ela apareceu para ver com seus próprios olhos. O rei em toda sua imoralidade fazia tudo com as portas destrancadas.   Por vezes nos obrigava a participar daquele ritual pecaminoso. – Dizia a enfermeira, com os olhos rasos d’água enquanto apertava o crucifixo em seu pescoço. – Então quando a rainha chegou e presenciou o que a senhora viu e sentiu, pensamos que tudo aquilo iria acabar. Mas como os deuses nunca favorecem os mais pobres, depois de muitos gritos e barulhos de objetos sendo quebrados dentro do quarto. A rainha abre a porta, chamando os guardas reais. Que chegaram muito rápido. Pensamos momentaneamente que ela tinha tomado às rédeas do reino e mandaria aprisionar o rei, mas assim que os guardas chegaram, fomos nós que fomos pressas.
  Para os guardas, ela nos acusou de traição ao reino. Para nós anunciava, como um castigo por fazê-la ver coisas que ela não desejaria. Levamos vinte e cinco chibatadas cada uma. E assim que fomos libertas da nossa penalidade, fomos mandadas de volta para cuidar da senhora, ainda com as costas sangrando.
  – Não sabia que minha tia era tão ruim!... Nossa que nojo sinto de mim!... Meu Príncipe!... Onde está meu ele?
No momento em que a enfermeira iria responder a pergunta, as suaves batidas na porta acompanhada de uma voz, anunciava a chegada da outra enfermeira com as roupas que haviam sido solicitadas.
  – Espero que vossa alteza não se incomode, pois foi o único traje que eu achei.
  A enfermeira trouxera uma de suas roupas, por não ter encontrado nenhum vestígio das roupas dela.
  – Sem problemas, vai ser até melhor. Assim passaremos despercebidas dentre os nobres, o clero e as pessoas comuns como nós, não aceitaria a ideia de uma princesa vestida como plebeia, por mais que tivesse o mesmo rosto... O que acha da ideia alteza? – Pergunta a enfermeira ao lado da princesa.
  – Não me oponho a vestir suas roupas, ainda mais que quero me livrar dessa roupa, com marcas repugnantes do desejo do meu ti... Do rei. – se corrigia a princesa, excluindo qualquer vínculo parental que tivesse. Pois a sua concepção de família, era o oposto do que estivera sendo praticado ali. – E continua. – mas ainda não entendi o porquê de não ser identificada.
  – Majestade quando souberem que a senhora acordou, todos virão para bajulá-la, todas as atenções estarão voltadas para a senhora.
  – Melhor! Exclama a princesa. – Assim será mais fácil! – Se exalta. – mostrarei a todos o monstro que ele é. E vocês serão minha testemunha.
  – Alteza? – diz a enfermeira chamando sua atenção. – Todos do reino já sabem, todos o temem e se a senhora falar para todos o que ouve. Mesmo se ele assumir o que fez, não irão fazer nada, pelo medo que sentem.
  Toda aquela euforia se esvaiu. Seus ombros mais uma vez caíram, se entregando ao cansaço e a tristeza. Tirou aquela roupa que passara a odiar e se vestiu de enfermeira, como a criada tinha proposto.
  – Venha! – Chamou uma das enfermeiras enquanto abria a porta. – Vamos te levar ao príncipe.
  – Leve-a, enquanto eu termino de arrumar as coisas por aqui. Tenho um plano. Logo eu alcanço vocês.
  – Não seria mais fácil ele vir aqui, Do que eu sair por ai disfarçada?
  – A alteza saberá. Vamos! Assim que sairmos no corredor, não podemos mais falar, de acordo com o decreto real.
  Sem tempo para perguntar sobre o príncipe, pois foi puxada para o corredor. A princesa se perguntava o que teria ocorrido com seu príncipe, que o impossibilitasse de protegê-la daquele monstro. – Será que seria ele como o pai? – Se perguntava. Se ele teria a enganado por todo tempo em que estiveram juntos. Se aquilo seria uma doença que era passada de pai para filho.
  Tentava afastar aqueles pensamentos medonhos sobre o amor da sua vida, enquanto caminhava acompanhando o andar cadenciado da enfermeira, atravessaram o corredor em direção à escadaria. Desceram a escada e caminharam em direção à saída leste do Palácio. A princesa puxou a enfermeira pelo braço, para trás de um grande pilar e quase sussurrando perguntou para onde ela estava indo. Gesticulando a enfermeira pediu para que tivesse calma e que continuasse a acompanhá-la.
  Contrastando com o silencio fúnebre do castelo, do lado de fora do às vozes se misturavam e ecoavam. Um grande comércio, com todo tipo de produtos, muitos vendedores e compradores. Duas vezes maior do que o do seu reino.
  – Venham por aqui! – disse à enfermeira que havia ficado arrumando o aposento da princesa.
  Guiando a princesa, a outra enfermeira se aproxima e pergunta por que ela havia demorado tanto para arrumar o aposento.
  – Tive a ideia de tentar fazer que não percebam que a princesa acordou.   Arrumei algumas almofadas, tentei colocar na forma do corpo dela e cobri com um cobertor bem grosso.
  – Desculpe, não quero ser petulante ou grosseira como o rei, mas eu exijo saber pra onde vocês estão me levando. E quero saber agora. – diz a princesa irritada.
  Sérias e de cabeças baixas, pedem desculpas pela forma que estavam agindo e alegam que tinham muito medo de serem castigadas novamente, porém não achavam justo o que ela tinha sofrido nesse tempo desacordada.
  – Estamos levando a senhora para o jardim onde o príncipe repousa. – Diz uma. – Fica num grande jardim florido, atrás do palácio. – Complementa a outra enfermeira com a voz vacilante.
  – Vamos depressa, antes que nos peguem aqui, paradas, sem fazer nada.   – Resmunga, enquanto puxa arbitrariamente a princesa pelo braço, buscando, pelo medo que crescia por dentro, se livrar logo daquela situação.   Enquanto era repreendida pela outra, que dizia que aquela conduta não era apropriada para ser ter com uma princesa. – Não quero levar um soco no rosto e muito menos tomar mais chibatadas do que já tomei. – Responde a outra com o olhar raivoso e ao mesmo tempo temerário.
  A princesa alheia a tudo aquilo, apenas se deixava levar pelos puxões sem nenhuma objeção.

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