》Capítulo 21《

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LIA


Tento abrir os olhos, mas sinto-os consideravelmente pesados, dificultando sua abertura. Pisco algumas vezes e os esfrego com minhas mãos, até que finalmente consigo abri-los completamente. Noto que estou deitada, então faço um leve esforço para me mexer, até que finalmente consigo sentar-me. Olho de um lado para o outro, porém não vejo nada além de escuridão. Onde estou?

Após alguns instantes, recupero a força que antes parecia distante de mim, então consigo ficar completamente de pé. Dou alguns passos até que ouço um estalo sob meus pés. Me abaixo e toco em um graveto seco, após alguns segundos observando melhor, vejo folhas espalhadas pelo chão e ao meu redor consigo visualizar algumas árvores.

A brisa leve faz com que meu corpo se arrepie por inteiro. Esfrego os braços em busca de alívio contra o frio que estou sentindo. Espontaneamente, meu queixo começa a tremer fazendo com que meus dentes colidam uns com os outros. Em seguida, sinto um aperto no peito e o ar se tornando cada vez menor em meus pulmões. Coloco minhas mãos em meu pescoço, pois é minha primeira reação após a falta de ar se tornar cada vez pior. Me sinto sufocada, desesperada, entrando em estado de surto total. Lembrei! Estou me afogando. Estou morrendo! A sensação é perturbadora.

Após alguns instantes de agonia, meus olhos começam a se fechar e caio no chão. Sinto uma mão me tocar, alguém está me virando, e em seguida me pega no colo e começa a andar. Não consigo ver quem é, apenas sei que acabo de perder minha consciência.

☆☆☆☆

Acordo com o corpo mole, sem saber onde estou. Levanto-me e bato a cabeça em uma espécie de vareta. Ai! Assim que observo melhor onde me encontro, percebo que estou deitada dentro de uma barraca. Cuidadosamente, decido colocar minha cabeça do lado de fora, quando vejo primeiramente uma fogueira. Em seguida, apertando mais os olhos, um pouco mais a frente ouço um barulho de água: é uma cachoeira. Tem alguém sentado em uma pedra, mexendo em algo.

Meu coração começa a palpitar. Estou com medo de quem quer que seja. Nem sei onde estou, como eu poderia conhecer alguém? Está escuro, frio, calmo demais...

- Ei, eu sei que acordou, venha até aqui. - Uma voz masculina diz. Que por sinal, me soa bastante familiar. - Não precisa ter medo, cravinho.

Lágrimas começam a escorrer do meu rosto no mesmo instante. Papai! Essa voz é dele. Só ele me chamava por esse apelido, desde quando eu era pequena. Saio correndo de dentro da barraca, até chegar a sua frente. Meu corpo congela por inteiro, fico extremamente sem reação. Como isso é possível?

- Você não pode ser meu pai, ele está...
- Morto? - Ele sorri, levantando sua cabeça. Após finalmente ver aquele lindo sorriso, tenho certeza absoluta de que milagres existem, e é ele bem aqui na minha frente.
- Papai! - Volto a chorar descontroladamente enquanto o abraço com todas as poucos forças que me restam. Ele carinhosamente passa a mão no meu cabelo, me dando total aconchego e conforto.

Me sinto cem por cento segura em seu colo, e passo longos minutos deste mesmo jeito. Como se meu abraço pudesse recompensar todos os anos em que eu não o via. Assim que nos soltamos, ele dá-me um beijo na testa e eu o abraço novamente.

- Senti tanto sua falta! - Digo aos prantos.
- Eu também, meu cravinho.
- Como... - Ele me corta.
- Sente-se aqui, temos muito sobre o que conversar...
- Com certeza.

Assim que faço o que ele pediu, noto que há um papel em suas mãos. Quando enxergo nitidamente, vejo um caça palavras e uma caneta.

- Não acredito! Começou sem mim? - Pergunto chorosa e sorridente.
- Tenho um bem aqui para você. - Ele entrega-me um caça palavras em branco.
- Vamos apostar?
- Claro! Não teria sentido jogar sem uma boa aposta. Afinal, você não pode ficar muito tempo aqui.
- Na verdade, eu nem sei onde é "aqui". Onde estamos mesmo? - Ele ignora completamente o que pergunto. Então prosseguimos, respondendo nossos joguinhos.
- Você se tornou uma mulher linda!
- O senhor continua o mesmo de sempre. - Meu pai vem de uma família super tradicional. Chamá-lo de "senhor" remete respeito. Diferente da louca da mamãe.
- Me conte o que tem feito da vida. Estou curioso para saber sobre tudo.
- Ah, papai, foi tanta coisa...
- Acho que temos algum tempinho. Você é uma matraca, com certeza tem bastante coisa para me dizer. - Sorrio de seu comentário. Ele me conhece tão bem.
- Bom, eu continuei estudando. Me formei e logo entrei na faculdade. Não queria minha mente vazia de forma alguma.
- Entendo... Você ainda está na faculdade?
- Não, papai, me graduei em Engenharia Civil, como eu sempre...
- Sonhou. - Ele completa e concordo sorrindo. - Fico extremamente feliz, minha filha. Isso aquece meu coração.
- Obrigada, papai. Eu estudei no Rio. Esqueci de comentar.
- E a sua mãe? Não me diga que ela...
- Não, não, não. Ela está bem. Eu que decidi me mudar para lá. Assim que me formei, consegui um emprego e me mantenho desde então. Mamãe ficou morando em Brasília, mas todo ano eu ia vê-la sempre que podia.
- Independente tão nova... você me orgulha, Lia.

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