Mais um dia

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15 de fevereiro de 2074

Chicago, Illinois

Enquanto eu tentava dormir, o senhor Smith dava aula, escrevendo no quadro sentenças impossíveis com números e letras. "Desde quando matemática teve letras?", pensei, fazendo uma careta tentando enxergar o quadro. Minha visão estava turva por causa do sono e minha cabeça pesava, assim como minhas pálpebras. Acho que estava escrito "hambúrguer" como resposta, mas não tenho certeza. Ah sim, eu estava com fome. Faltava um tempo para o recreio, ou seja, mais 50 minutos de aula, sinônimo de dormir. Encostei minha cabeça no braço esquerdo e observei a janela da sala, muito grande. Crianças brincando no pátio, escorregando no escorrega, trepando no trepa-trepa, balançando-se no balanço. Tudo como deveria ser. Outras janelas estavam ao redor do parque, dando-me uma visão das aulas dos ensinos inferiores, oitavo ou nono ano, por exemplo. Sinto saudades daquela época, quando não precisava se preocupar com coisas importantes, como o aquecimento global ou com química. Não devo ter dormido nem por 5 minutos e o professor bateu em minha mesa com a régua.

-Qual é a resposta do problema, senhorita Ford?

-Oi? O quê? -Acordei em um sobressalto e quase caí da cadeira.

-Qual é a resposta do problema no quadro? -Ele repetiu a pergunta. Ah, mas se achava que eu ia ser humilhada, estava muito enganado.

-3,1415, que são, coincidentemente, os 5 primeiros números de PI. -Falei sonolenta e ainda soltei um bocejo no final. Todos me olharam chocados, especialmente meu querido educador. Depois de um longo segundo, recebi uma saraivada de palmas.

-Muito bem, Emily. Mas não quero saber de você dormindo de novo em minha aula! -Ele disse, claramente espantado.

A aula seguiu como deve ser: chata. Quase dormia a cada 2 minutos e quando o sinal tocou, pareceu uma eternidade até eu conseguir juntar minhas coisas e ir para a cantina. No caminho, uma mar de alunos em um único fluxo, indo em direção à quadra ou ao pátio. Alguns -poucos- alunos iam para a área em reforma da escola, abandonada pelo diretor. Era lá que iam os casais apaixonados ou os preguiçosos para pedirem cola da prova. Todos os inspetores sabiam, mas não faziam nada e tampouco impediam. Contanto que eles não mexam conosco, não mexemos com eles e toda a anarquia social construída nesse ano letivo fica bem. Faltavam exatamente 107 dias para as férias, dia primeiro de junho. Coincidentemente, dia primeiro era meu aniversário e, novamente, eu comemoraria sozinha. Era filha única, meus pais não tinham irmãos e meus avós... Mal os conheci. Éramos apenas nós: eu, minha mãe e meu pai. Meu pai não para em casa, sempre viaja a trabalho e minha mãe precisa de dois empregos para nos sustentar. De dia, ela é caixa no Wallmart e, à noite, trabalha em um bar perto de casa. Raramente nos vemos nos dias de semana, principalmente às sextas-feiras, que são sempre movimentadas, tanto de dia quanto de noite. E, BAM, meu aniversário caiu em uma sexta esse ano. Farei 18 anos, finalmente. Já podia dirigir, mas minha mãe cismava em esperar até os 18 anos. "18 anos é aproximadamente a metade entre 16 e 21, a idade de dirigir e a idade de beber", sempre dizia ela. Já fiz essas contas várias vezes e, realmente, dá 18,5... Fala sério, manhê!!!

Springfield, Massachussets

-Depois desse erro infortúnio com o G09, já testamos mais duas formas. -Eu repeti, para botar as peças do quebra-cabeça no lugar.

-Já testamos o G10 em macacos e porcos. Nos macacos, foi um sucesso. Nos porcos, todos morreram. -Relembrou Ilana, com a voz carregada de cansaço, e parecia exausta.

-O G11 foi o com melhores resultados: macacos e porcos sobreviveram, mas a longo prazo não sabemos o efeito da droga. -Caesar repetiu sua teoria, pela milionésima vez.

-Sim, Caesar, mas precisamos da vacina agora! Ou todos esses anos de projetos serão jogados no ralo... -Estava frustrado. -Vamos ter que avaliar o cérebro e sangue dos animais e, se não tiverem mudanças letais, teremos que iniciar os testes em humanos. -Conclui e, mesmo que implicitamente, ordenei que eles examinassem as cobaias. Nervoso, acendo um cigarro e dou um longo trago.

-Ok, doutor. Espero que saiba as conseqüências disso... -Caesar sai contrariado da sala.

-Frank... Acho que Caesar está certo. Não sabemos o efeito que a droga causará daqui a 20 anos. Temos que conseguir mais tempo com o Conselho.

-Eu sei, Ilana, mas não dá! O diretor quase arrancou minha cabeça da última vez... Não consigo nem imaginar o que ele poderia fazer dessa vez. Somos uma equipe e temos que achar uma solução unânime, mas Caesar não vê a realidade: estamos desesperados! -Dou uma tragada no cigarro em minha mãos, que já está no fim.

-Entendo, Frank. Não tem problema, você sabe que eu te apoiarei sempre. Vamos conseguir, tenho um bom pressentimento em relação a essa vacina!

-Só você mesmo, Ilana, para me fazer rir numa hora dessas! -E nossos lábios se encontram novamente, numa mistura doce e amarga, gloss e cigarro.

Infected- A origem (cancelado)Onde histórias criam vida. Descubra agora