O jantar decorreu tranquilo e, enquanto Vera falava com entusiasmo de seus planos com Marcelinho, Clóvis furtivamente observava Juliana. A moça fez sua refeição calada como sempre, sem manifestar sua opinião. Clóvis intimamente estava admirado. Como uma moça ingênua,desligada e de certa forma apagada poderia ter tal poder? Estaria ela mesmo sob ação de um espírito? Se ele falasse, seria melhor para ela? E se esse espírito a dominasse e ela acabasse por enlouquecer? Sentiu um arrepio de medo percorrer-lhe o corpo. Talvez fosse melhor contar tudo,depois que a missão fosse cumprida. Em todo caso, ela lhe parecia normal como sempre e não havia nenhum motivo sério preocupar-se. Na tarde do dia seguinte, Clóvis e Claudio postaram-se na saída do colégio á espera de Juliana.Vendo-os a moça sorriu levemente. - De novo? - É ,vamos visitar aquele pobre homem na Santa Casa e, como tínhamos tempo,viemos buscá-la. A moça entrou no carro depois de cumprimentar Claudio.Durante o trajeto, os dois amigos falavam de coisas triviais,procurando dissimular a ansiedade, lançando olhares furtivos para o banco traseiro onde Juliana, tendo colocado os livros sobre o assento,seguia em silêncio. Nada nela denotava uma mudança.Clóvis estava disposto a observar os mínimos detalhes. Foi só quando entraram na enfermaria que ele percebeu. O rosto de Juliana ganhara suavidade,expressão , e os olhos pareciam fixos em um ponto distante. A moça tomou a dianteira e os dois,trocando expressivos olhares, seguiram-na. Chegando ao leito do acidentado, ela deteve-se. O enfermo,vendo-a distendeu a fisionomia e imediatamente esforçou-se para sentar-se na cama. Juliana colocou a mão sobre a cabeça dele,dizendo com voz firme: - Pode ficar deitado.Esteja a vontade.Como vai,Mario? - Melhor - respondeu ele -, muito melhor.Por favor,sentem-se.Tem só uma cadeira,podem se sentar na cama. - Não é preciso. Não se preocupe - continuou ela. - Vim para conversar com você. Ele desviou o olhar,envergonhado. - Sei que me ajudou muito.Devo-lhe a vida. Desejo agradecer-lhe. - Agradeça a Deus por ter-lhe concedido mais tempo aqui. Você tem a seu cuidado dois espíritos que deve orientar na vida. Deus os colocou em suas mãos. É preciso que acorde para essa sua responsabilidade.Eles o amam muito e no futuro trarão muitos benefícios à Nova Era. Serão canais da expressão divina em ligação com os homens. Mario chorava comovido.Quando conseguiu falar,murmurou: - Eu não mereço! Nunca tive sorte na vida,até a mulher que eu amava me trocou por outro. Abandonou o lar e os dois filhos! - Mario! Olhe para mim - disse Juliana com enérgica. - Não se iluda mais. Não existe " sorte", por que Deus não joga com o destino dos seres humanos,nem favorece uns em detrimento de outros.Aprenda que cada um cria seu próprio destino. Só você é responsável por tudo quanto lhe aconteceu. Se você não consegue amar-se ,se não cuida de sua alma,do seu desenvolvimento,se não faz nada em seu próprio benefício ,se não tem amor por si,como pode exigir que os outros o façam? Se sua mulher preferiu dar outro rumo à sua vida,é um direito que lhe cabe. Não nos compete julgá-la ou exigir que ela continuasse a viver em um lar onde o coração já não estava mais. - Que ela não me amasse até posso aceitar,mas abandonar os filhos.... - Como quer censurá-la se fez a mesma coisa? Ela os deixou com você,que é pai.E você,com quem os deixou? Ele chorava desalentado. Juliana continuou: - A ninguém compete julgar. - Sei que eu errei. Agora vejo que estava louco. Não pensei em deixar meus filhos,fiquei alucinado.Mas ela também errou. - Não se trata do certo ou do errado.Escolhemos os caminhos e,de acordo com eles,a vida nos responderá. Cada um colhe o que semeou. Você nunca se valorizou,nunca percebeu que tem condições de encontrar sua felicidade.Basta querer.Deus nos criou para alegria,amor,o progresso e a luz. Ele é nosso suprimento. - Estou arrependido.Vou lutar ,criar meus filhos.Hei de esquecer essa mulher! - Se compreender que as pessoas são livres para escolher seu caminho, mágoa sempre se transforma em doença no corpo. - Tentarei. - Isso. Quando as coisas estiverem difíceis,pense em Deus e em mim. - Estou muito melhor. Deus lhe pague pelo bem que me fez. Virá ver-me amanhã? - Não. Não precisa mais de mim. Só lhe peço para esquecer os pensamentos tristeza. A depressão e a revolta são frutos do orgulho. Falta de confiança em Deus.Ele faz tudo para o melhor. Todas as mudanças são para o melhor. Não se esqueça. Duvidar disso é pensar que Deus esteja omisso,que não tenha poder,é diminuí-lo. - Nunca pensei nisso! - Cada vez que você se diminui,se julga sem valor,está desvalorizando seu Criador. Lembre-se: Deus está em tudo.Está dentro de você e dentro de todas as pessoas também.Tudo é Deus! Tenho que ir.Deus o abençoe. - Como é seu nome? - Dora. - Adeus. - Adeus. - Vamos - disse ela aos dois rapazes,que a seguiram em respeito silêncio. Uma vez no carro,Juliana pediu: - Esperem um pouco. Quero agradecer a preciosa ajuda de vocês.Sem ela não poderíamos socorrer o Mário. - Pode. - Estamos assustados com tudo isso. Não sabemos o que fazer. - Não é preciso preocupar-se.Está tudo bem.Juliana tem uma missão muito bonita.Vocês estão ajudando muito. - Tenho medo - interveio Clóvis. - Juliana pode se perturbar. Mamãe disse que ela é delicada. - Engano de vocês.Ela veio bem preparada.Combinamos tudo antes de ela nascer. - Pelo que sei, ela não se recorda de nada, nem do que está acontecendo agora - esclareceu Clóvis. - É melhor assim. Se ela tivesse lúcida,seria mais difícil suportar a vida na Terra.Sentiria desejo muito forte de voltar para cá. - Por esse motivo ela é tão calada? Tão diferente das outras pessoas? - Sim. Está habituada a viver em outro local. Sua alma sente saudade. Agora preciso ir. As pessoas não compreendem esses fatos. Conto com a ajuda de vocês para apoiar Juliana.Ela precisa desse apoio. - Farei o que puder - prometeu Claudio ,com seriedade. - Eu também. - Obrigada. Juliana recostou a cabeça no encosto do assento do carro e fechou os olhos,caindo em sono tranquilo.
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Pelas portas do coração
SpiritualitéEnquanto a cabeça racionaliza,o espírito sente. A razão segue as conveniências do mundo. O espírito busca a essência daquilo que é. Quando a sensibilidade se abre,energias tumultuadas e emoções novas surgem trazendo insegurança,e é preciso estudar a...