Fênix 6.1

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   Uma vez, quando Yoongi era pequeno, ele subiu uma colina não muito longe de sua casa, numa tarde cinzenta. Tudo era repleto de verde, naquela estranha cor mágica que o mundo adquiriu quando o sol e a chuva obstante conspiraram. Ele subiu e as árvores tinham se curvado com o peso das gotas de chuva. De longe era possível ver a chuva, se movendo na direção dele, uma enorme cortina nebulosa cor de ferro, vibrando em direção a colina. O céu estava escuro e pesado, mas por entre as árvores o mundo ainda era verde, e não havia tempo de correr para um lugar de cobertura adequada.

Quando a chuva caiu, achatou a grama e o encharcou num único piscar de olhos. Tempestades nas cidades nunca te socam na cara desse jeito. Tempestades nas cidades são mansas, refreadas pelas laterais altas dos prédios, por vidro e concreto.

Tempestades em cidades são um arranhão suave de unhas por cortar. Nunca um punho no seu rosto.

A de hoje é diferente, porém.

   O ar do lado de fora do depósito já está crepitante e escuro com energia quando Yoongi corre atrás do Ghost. Seokjin o segue, obstruído pelo corpo em seu caminho por um segundo, um grito rasgando por sua garganta ao que ameaça atirar.

Ele não vai atirar.

O horizonte se divide em dois com uma luz, a chuva atinge os dois como um golpe físico. Min mantém os olhos na figura encapuzada. Mantém os olhos nele e os pés se movendo, forçando a si mesmo a não pensar em nada.

Jin atira selvagemente para um lado, num arco longe o suficiente para errar. Isso faz o Ghost mudar de direção. Yoongi range os dentes com o entendimento do que o outro policial está fazendo. Ele atira de novo, longe e amplo, em oruta direção dessa vez, e então em outra. Com o quinto tiro, o jogo está ganho.

Eles correm para um beco sem saída.

Min para, ofegante, parando a alguns passos de distância. A chuva se curva ao redor do Ghost na forma de um sino, eletricidade crepitando em seus dedos. Ela cresce e cresce nas mãos dele, uma bola de energia, faminta e quente e destruidoramente densa. Yoongi não precisa olhar mais perto para saber que ela poderia arrasar esse lugar. Colocar uma cratera no local em que ele está em pé, queimando-o num único disparo de calor poderoso e pele carbonizada. O depósito atrás deles poderia se partir, curvar-se como papel de arroz molhado, e esmagar Seokjin embaixo de suas vigas. Podia estar tudo acabado em alguns segundos violentos e soluçantes.

-Pare - Yoongi diz, dando um passo a frente, encolhendo-se com os tentáculos de eletricidade que atingem o chão ao seu redor.

O mundo é de um violeta distorcido, com as sombras e a chuva e a energia crepitante nas mãos do Ghost.

-Por favor, apenas pare.

A luz enfraquece, retrocedendo gentilmente, ainda potente o suficiente para esmagar o policial como um fantoche de origami se ele quisesse. O céu boceja e estoura acima deles. A tempestade zunindo nas veias de Yoongi.

Ele anda adiante, boca seca, corpo tremendo, uma mão esticada como se estivesse tentando se aproximar de um animal selvagem. Atrás dele Jin solta um som de aviso abafado, que se perde no meio ao fluxo de relâmpagos reluzentes na palma do Ghost.

-Sou eu - Min diz, e agora está perto o suficiente para que consiga vê-lo, lágrimas evaporando em contato com sua pele. Seus olhos estão arregalados, círculos arroxeados que parecem grande demais para o seu rosto. Os raios o dão uma luminescência suave e branda, como um fantasma num filme vintage.

Yoongi pega a si mesmo perto o suficiente para tocar. Ele está ciente, o tempo inteiro, do poder estalando na teia ao seu redor, o ar chamuscado e cheirando como açúcar queimado. Calor o envolve numa chave de braço, queima sua garganta, rasteja em ondas afiadas por sua pele. É até difícil de respirar, e a exaustão está acompanhando-o, mas ele não para.

MurmurationOnde histórias criam vida. Descubra agora