parte 2

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Tudo começou no final do outono de 2009, era junho, um mês mais frio do que os últimos no ano desde então. Minha família é dona da maior rede de joias da América, as Joalherias Nobre. E eu, desde sempre, me divertia desenhando joias e mais joias. Eu apenas me encantava com a beleza das pedras, adorava o poder de transformá-las em outra coisa. De moldá-las à minha vontade. De dar vida a elas. Às vezes, eu me escondia em uma das nossas várias lojas, em qualquer lugar do mundo, apenas para ver o momento em que um noivo escolhia um anel, quando os olhos de uma mãe brilhavam ao receber um par de brincos, ou uma filha adolescente se sentir uma rainha com a pedra brilhando em seu colar.

Esse era meu caminho, como o do meu pai, Otavio Fagundes, um respeitado designer de joias. Eu tinha a vida que todo garoto queria ter, vinte e um anos, bonito, rico, com todas as oportunidades possíveis, muitos amigos, uma coleção de carros, viagens e muito dinheiro. Muito mais do que seria capaz de gastar um dia. Era o meu dinheiro, não vinha do meu pai, como o dinheiro do meu irmão mais velho. Era meu, eu o ganhei com as joias que desenhei. E eu era arrogante e orgulhoso por isso.

Meu pai havia contratado cinco novas funcionárias em meio período. Era uma maneira ridícula de pagar menos pela mesma mão de obra. Em uma tarde fria, eu estava aborrecido como o garoto mimado que era, fui ao terraço do prédio onde funcionam os escritórios da Nobre, observar a rua. Eu fazia isso com frequência, sempre aborrecido por coisas fúteis. Sentia-me um bosta por não poder ir às minas, extrair pedras, como sonhava desde pequeno. Meu pai achava perigoso demais, era a única coisa em que ele me dizia não. E eu não sabia aceitar sua recusa.

Sentia-me infeliz e sufocado, então subi no parapeito, observando as pessoas pequenas abaixo de mim, havia, claro, mais um bom pedaço de piso abaixo dos meus pés depois do parapeito, eu não corria o risco de cair na rua, vinte e dois andares abaixo e morrer. Mas ela não sabia disso.

Naquele momento eu não sabia o que ela havia ido buscar tão alto, numa área proibida a funcionários, e foi tudo rápido demais. De repente eu observava a rua abaixo de mim e no segundo seguinte, uma mulher gritou um sonoro não e se jogou contra mim.

Ela era magra e mais baixa do que eu, mas seu golpe foi inesperado e forte o bastante para me desequilibrar. Me segurei nela, quando minhas pernas perderam o equilíbrio e ela dizia repetidamente:

— Não se mate! Não faça isso!

— Eu não... — tentei dizer que não ia fazer isso, mas não deu tempo, caímos nós dois para além do parapeito, enquanto ela gritava desesperada achando que íamos despencar em direção a nossa morte.

Seu olhar de choque quando sentiu o piso sob seu corpo e percebeu que não havíamos morrido quase me fez rir. Quase. Porque eu estava furioso com ela.

— O que você pensa que está fazendo? — gritei me desvencilhando de seu corpo e sentindo imediatamente a dor.

Para protegê-la durante a queda, cobri seu corpo com o meu, de forma que apenas eu encontrei o chão com o corpo, a maluca estava ilesa e sorria como a maluca que era olhando para baixo.

— Não era a rua! Tinha mais terraço depois do parapeito. Quem diria? — De repente, percebeu seu erro e me encarou receosa — Você não ia se matar.

— Não, eu não ia. Por que eu faria isso?

— Não sei, eu não conheço você. Só o vi parado ali, parecendo tão perdido, eu pensei... — ela pigarreou e desviou os olhos castanhos e pequenos dos meus. — Eu pensei que estava salvando a sua vida.

— Como você pode ver, eu não ia me matar. E se fosse esse o caso, você apenas teria morrido junto comigo. O seu salvamento foi péssimo!

— Você é um mal-agradecido, sabia?

Desde que errei - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora