5 - Parte 2

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Meu pai conseguiu minar completamente minha inspiração. Nem mesmo olhar Laura por horas consegue com que eu me concentre de novo na última joia. Esta é especial, a mais especial da coleção. Seu desenho não estava nos que levei até meu pai, será uma surpresa. Mas não para ele. A primeira pessoa a ver essa joia tem que ser ela, minha musa inspiradora, o amor da minha vida, Laura.

Cansado demais para prosseguir esta noite, decido ver minha filha, e vê-la também, claro.

O céu está carregado de raios e trovões, anunciando uma tempestade iminente, mas não me importo. Quando bato em sua porta, uma chuva forte começa a cair. Ela a abre e entro me salvando por pouco de ficar encharcado. Eva corre até mim e a pego nos braços, o cheiro do jantar faz meu estômago roncar e observo Laura em um vestido que destaca cada curva de seu corpo tornando-a deliciosa. A observo por um bom tempo, sem conseguir desviar os olhos e vejo seu rosto se tingir de vermelho antes de voltar à cozinha e se afastar de mim.

— Você não devia ter saído de casa com este tempo — ela diz sem olhar para mim.

— Você está linda. Está esperando alguém?

Ela não responde e algo parece aquecer meu coração devagar.

— Estava esperando por mim — concluo.

Ela ri em seu tom de deboche que adoro e finalmente olha em meus olhos.

— Vai sonhando que eu me vestiria para você. Não estava esperando ninguém com a chuva que obviamente iria cair, agora estou me perguntando como é que você vai embora.

Sorrio.

— Ele pode dormir comigo — soluciona prontamente Eva.

— Obrigado, meu amor. Viu? Já tenho onde ficar. É uma pena que eu não caiba na sua cama, Eva, é muito pequena. Acho que eu só caberia na da mamãe.

Laura deixa a colher com que mexia um molho cair no chão e me encara irritadíssima.

— Então você dorme com a mamãe — conclui Eva com o maior dos sorrisos

— Eva, não ofereça a cama dos outros a ninguém. Lembra o que conversamos? Você só pode dar o que é seu.

A pequena não se importa e repete que eu deveria ficar.

Quando Eva vai ao banheiro, me aproximo de Laura na pequena cozinha. Dobro a manga da blusa social que uso e ela repara a ponta da tatuagem no meu baço.

— Você agora tem tatuagem?

— Algumas — respondo esperando que ela pergunte mais, mas ela não o faz. — Você está linda, Laura. Este vestido destaca cada curva desse corpo maravilhoso e só consigo imaginar...

— Nada! Você não tem que imaginar absolutamente nada sobre mim. Sou só a mãe da sua filha, estou aturando você por ela. Não confunda as coisas.

Há tanta certeza em suas palavras, nenhum amor ou calor em seus olhos. Laura realmente me apagou de sua mente, de seu coração. Do amor que sentia por mim não há sequer vestígio. Eu já esperava por isso, mas constatar assim, me quebra mais uma vez. Afasto-me dela e vou atrás de Eva, e não nos falamos até que o jantar esteja pronto.

Então coloco a primeira colher na boca e o gosto de seu tempero me traz lembranças demais. Olho para ela por muito tempo, seus olhos também estão em mim, está se lembrando, como eu. A comida é familiar, estar com ela à mesa é familiar. Tudo é tão bom que pela primeira vez em anos, me sinto em casa. Eva come cantando músicas que inventa sobre os pratos que a mãe faz. Descobrir isso me faz sentir parte da vida dela.

Desde que errei - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora