PARTE 4

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A tensão que ela sentia na semana seguinte, esperando sua demissão, eu sentia também. Cada vez que a via, queria tomá-la nos braços de novo e repetir os beijos do nosso baile particular, mas me continha, mal a olhava, não falava com ela, para que não perdesse o emprego. Pesquisei sobre ela nas fichas dos funcionários e descobri que era órfã, perdeu o pai aos quatro anos, a mãe aos dezesseis. Morava em um quarto de uma pequena pensão e estava se formando em administração na federal. Ela precisava justamente desse emprego de meio período para pagar suas contas.

Minha vontade era pagar seus aluguéis atrasados, tirá-la do lugar pequeno onde vivia, cuidar dela. Porque de repente ela despertou isso em mim, a vontade de cuidar de alguém que não fosse eu mesmo. Passei a semana desatento, Joaquim cumpriu seu papel, o que foi maravilhoso e garanti o emprego de Laura alguns dias depois ao contar a Filipa a história de como uma funcionária se arriscou para me ajudar. Filipa quis conhecê-la, elogiou a ligação entre meu pai e seus funcionários que se arriscariam por um familiar dele, e eu soube que meu pai jamais a demitiria.

Ela também percebeu minha manipulação, pois me enviou um bilhete de agradecimento. Pela primeira vez na vida, eu queria uma coisa e não a pegava porque isso a prejudicaria. Pela primeira vez, eu controlava meus impulsos pensando no que era melhor para alguém além de mim. Por semanas ficamos nisso, apenas as lembranças dos beijos trocados para que nada de mal acontecesse a ela. Eu a vigiando de longe, de olho na megera Abigail para que não a prejudicasse de novo. E a desejando cada vez mais.

Até que uma noite descobri que ela foi despejada da pensão. Imediatamente, a busquei, a convenci a ir para meu apartamento comigo, e foi nossa primeira noite juntos. Depois de tocá-la, e fazer amor com ela, não dava mais para ignorar que eu a amava. Não dava para continuar longe dela.

Laura não aceitou nenhuma ajuda oferecida por mim. Repetia que não deveríamos nos envolver, éramos afinal, de mundos completamente opostos, mas estava tão apaixonada quanto eu. É curioso como entendo isso agora, era nítido em seu olhar, na maneira como falava comigo, ou como dizia que tínhamos que nos afastar pouco antes de nos entregarmos de novo a mais uma rodada deliciosa de amor. E cada segundo com ela era tão bom e tão raro, que se tornaram meu combustível.

Quanto mais a tinha, mais a queria, as noites já não eram suficientes. Poucos dias na semana não bastavam para suprir a falta que eu sentia dela. Já mal conseguia disfarçar o que sentia quando a olhava. Me pegava sorrindo para ela de repente, atraindo uma atenção que não deveríamos ter sobre nós.

Até que um dia, completamente absorto do que acontecia na reunião em que estava, meu pai impediu que eu deixasse sua sala ao final dela, fechando a porta e me encarando do seu jeito autoritário. Eu soube que ele sabia. Me orientou a me sentar de frente para ele em uma poltrona e o fiz.

— Cinco anos. Você trabalha nesta empresa há cinco anos, João Pedro, e nunca em nenhum desses anos, você desrespeitou uma regra tão básica quanto não se envolver com uma funcionária.

— Não pude evitar.

— Não pôde? Ou não quis? A garota é bonita, se arriscou por você, reconheço a apelação que isso possa ter para um garoto como você. Mas isso precisa parar agora! Você tem todas as mulheres que quiser disponíveis, por que ela?

— Pai, por que não ela? Ela é uma mulher disponível para mim, como as outras, porém, uma de quem eu realmente gosto.

Sua primeira reação foi não ter reação. Em seguida, ele riu. Riu alto, tirando um lenço do bolso do paletó e o levando ao rosto.

— Essa é boa. Não é um pedido, João Pedro, é uma ordem. Se você a descumprir, não importa o quanto tente me manipular, eu a demitirei.

Assenti, não pensando nem por um segundo em cumprir sua ordem, apenas ganhando tempo para conseguir um emprego melhor para Laura e tirá-la daqui.

Desde que errei - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora