XXXVI - Paraíso secreto

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Um ano depois

Algum lugar perto da praia.

Um paraíso secreto com areia branca, sol e mar de águas cristalinas com tom esverdeado. Essa é minha visão de todas as manhãs pelos últimos meses. Vivendo em um pequeno vilarejo acolhedor e charmoso, eu estava em paz. Pela primeira vez, em meus trinta anos, eu era só uma mulher andando à beira do mar, vivendo um vida tranquila. E eu planejava continuar assim por um longo tempo, até uma visita inesperada me abalar.

Katherine MacLaine, agora conhecida como Emily Miller, ou qualquer que seja a identidade falsa que ela esteja usando esses dias estava no meu pequeno pedaço do paraíso. O lugar era era pequeno o suficiente para que a senhorinha simpática dona da banca de jornal, meu contato com o mundo real, comentasse sobre a forasteira recém chegada na cidade procurando por alguém.

— O que você está fazendo aqui, Kate? — pergunto, ao encontrá-la almoçando no único hotel da cidade.

— Precisamos conversar, Anna. — Ela está linda, como sempre, um pouco mais radiante e com alguns quilos a mais que fazem muito bem para ela.

— Não tenho nada para falar. — Me sento à mesa com ela, por educação.

— Bom, então escute — diz. — Que merda você está fazendo com a sua vida? — Seu tom de voz alterado me assusta, não me lembro de já ter visto Katherine tão brava. — Quando você desapareceu e abandonou Romano, seu marido que tinha acabado de tomar um tiro no peito por você, eu tentei entender seus motivos. Ele contou a Dom sobre como o casamento de vocês foi uma farsa e faz todo sentido que você tenha ficado magoada por ele ter planejado te matar.

— Você veio aqui para concordar comigo?

— Não. Isso fez todo sentido por um tempo, Anitchka. Você ficou brava, você castigou ele, agora chega.

— Ele mentiu para mim, me enganou...

— Engole e supera, Anna, pelo amor de deus. — Ela acaricia a sua barriga em um movimento involuntário para se acalmar. — Ele errou sim, ele sabe, todo mundo sabe. Mas olhe, por um minuto, as coisas que esse homem fez por você. Ele desapareceu por oito anos para tentar te manter salva, ele tomou um tiro por você.

— Você não entende.

— Você tem razão. Eu não entendo. Sempre achei que você fosse uma mulher forte. A mulher mais forte que eu conheço. Mas você tem sido uma covarde.

— Eu não preciso ouvir isso. — Tento me levantar, mas ela segura meu braço.

— Precisa sim. A verdade é que você não pode dar seu perdão porque não aprendeu a perdoar. Porque ninguém nunca perdoou você. É por isso que eu estou aqui, sem que Domenico ou Romano saibam, para dizer que é hora de você se perdoar, minha amiga. Você merece.

No fundo, eu sei que ela tem razão. Quando uma pessoa me machuca, eu a machuco de volta. Esse tem sido meu instinto, sempre.

— Você é uma pessoa orgulhosa, Anna. E essa parte de você não quer perdoar Romano, mas olhe onde você está, tentando viver uma nova vida. Você está aqui há tanto tempo e ainda não fez amigos? Não encontrou amor? Você quer continuar sofrendo e acumulando esse veneno emocional?

— Kate... — tento argumentar, mas desisto. Ela tem razão, estou sendo orgulhosa, o que posso fazer?

Estou quase distraída em meus pensamentos quando Kate solta um gritinho abafado. Ela respira fundo por alguns segundos então solta outro.

— O que está acontecendo?

— Anna, acho que minha bolsa estourou.

— O quê? Você não está carregando nenhuma bolsa... — Então eu olho para sua barriga outra vez. A barriga que ela vinha acariciando o tempo todo. Kate não apenas ganhou alguns quilos, ela tem uma saliência bem considerável ali. — Você está grávida?

— Não! — ela grita. — Agora estou em trabalho de parto. Você tem que me ajudar.

Eu me desespero. Estamos em um vilarejo no meio do nada, esse lugar não tem um hospital. E eu não tenho nem um carro, meu único meio de locomoção são minhas pernas e uma bicicleta velha. Carrego Kate, ajudando-a a andar, até a banca da gentil senhorinha que tem sido meu único contato com outro ser humano ultimamente.

— Por favor, nos ajudem. Ela está tendo o bebe.

— Bebe? — A senhora entende parte do que eu digo e depois começa a dizer coisas em uma língua que eu não domino e me ajuda a levar Kate para dentro de casa e deita-la na cama.

— Preciso levá-la para o hospital — peço. Ela ajeita Kate na cama, com travesseiros macios.

— Não tempo — ela diz em um inglês sofrível. Eu definitivamente deveria ter me mudado para um lugar em que as pessoas falassem italiano ou inglês. — Bebe nasce aqui.

— Kate, está tudo bem — tento acalmá-la me sentando ao seu lado e segurando sua mão.

— Minha filha vai nascer no meio do nada sem o pai do lado por que eu tinha que vir buscar você, Anitchka — reclama. — Esse é o tanto que você é importante para nós.

— Chantagem barata não lhe cai bem, Katherine — brinco. — Acho que você precisa empurrar. — Tento deduzir parte do que a senhora está dizendo enquanto dobra as pernas de Kate.

Ela começa a gritar e eu acho que vou desmaiar.

— Se algo acontecer comigo, você promete que vai cuidar e amar a minha filha?

— Kate, para de dizer isso...

— Prometa! — ela aperta minha mão com força antes de empurrar novamente.

— Eu prometo, eu prometo.

Contínuo deixando ela apertar minha mão até um pequeno embrulhinho em forma de gente chorar. A senhora passa a criança rapidamente para a mãe enquanto termina de conferir tudo nas partes de Kate. A cena é linda e toca meu coração há muito tempo escondido. Esse amor. O amor nos olhos de uma mãe olhando para a filha é algo que eu nunca realmente senti na vida, mas agora eu percebo que eu quero. E enquanto imagino isso, vejo Romano ao meu lado. A única imagem possível. Quero filhos nossos. Quero envelhecer e amar alguém.

— Você precisa ligar para o Domenico — Kate diz. — Avisar ele onde estamos para que ele possa vir aqui.

Beijo sua testa antes de sair do quarto porque subitamente estou me sentindo maternal e carinhosa, como se fosse algo contagioso. Procuro seu celular junto de sua carteira e digito o número de Domenico.

— Amore mio, onde você está? — ele atende no primeiro toque, aparentemente preocupado.

— Sou eu — respondo.

— Anna? Kate está com você?

— Sim. E a sua filha também. Parabéns, Dom, ela é uma menininha linda.

— Minha filha nasceu? — ele se desespera um pouco. — Me diga onde vocês estão e eu irei...

— Não precisa — eu o interrompo. — Estou levando sua mulher e sua filha para casa, não se preocupe.

E eu faço isso. Não tenho nenhuma mala, nem Kate, então assim que ela se recupera, alguns dias depois, com muito cuidado as coloco em um jatinho em direção a Cancun, nosso novo lar.

— Obrigada — digo a ela enquanto brinco com a pequena Angelina. — Obrigada por vir me buscar.

— Você merece — ela diz simplesmente.

Mentalmente, faço uma lista de todas as pessoas a quem eu devo pedir perdão. Eu sou a primeira, seguida por centenas e centenas de nomes. Faço uma oração silenciosa a todos eles. Depois, listo os nomes de pessoas a quem preciso perdoar, até mesmo Mike Ricci. E Romano. O meu marido e grande amor. Há quem eu preciso perdoar e pedir perdão.

E a mim mesma, principalmente. Perdoar a si mesmo é o perdão supremo. 

Doce Orgulho (Completa) - Série Criminosos Irresistíveis - Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora