Quattordici

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O estadunidense olhava incrédulo para o que acontecia naquele palco. Não diria que estava surpreso, tendo em vista que o motivo de ter mudado a ordem das músicas, se resumia ao fato de que sabia que o seu compatriota iria perder o controle em algum momento. Arriscar isso em Who Would Think That Love era jogar alto demais e ele agradeceu profundamente por ter confiado em seu instinto. Noah Urrea era um ótimo garoto, com o péssimo hábito de perder o controle em situações de trabalho. Passou as mãos pelos cabelos, irritado com o fato de, bom... Não estar irritado. Talvez até sentisse uma ponta de orgulho daquele moleque, no fim das contas. Quantos teriam coragem de desafiar tantas pessoas assim tão abertamente?

Kyle sabia que não era só desejo que via estampado no rosto de Urrea. Nunca foi só desejo. Sempre houve algo além disso, algo mais puro do que simplesmente isso. Por esse motivo, saiu do seu lugar de telespectador e foi conversar com Diarra e com ele. Mas achava que precisava entender a mente de Noah, pois precisava saber o que esse garoto pretendia.

Tudo apontava para um envolvimento amoroso entre os dois. Das coreografias mais profissionais, ao fato de não serem mais vistos juntos pela equipe. Para conseguirem aguentar aquela mudança tão repentina, algo com certeza mudara nos bastidores e linhas haviam sido ultrapassadas. É um fato. Proximidade é a única coisa que consegue acalmar a necessidade que você tem de outra pessoa. E são grandezas diretamente proporcionais. Quanto maior sua necessidade, maior essa proximidade precisará ser.

Diante do que acabara de ver,  não tinha mais dúvidas de que os dois estavam em algum tipo de relacionamento que ia muito além de amizade. E, novamente, surpresa nenhuma. Viu de camarote tudo isso acontecer.

Diarra se interessar primeiro, Noah recusar por não ter certeza, Diarra seguir em frente e Noah surtar, percebendo o que ele realmente queria e resolvendo correr atrás do prejuízo. Por mais que soubesse que as possibilidades de quebrarem a cara por serem do mesmo grupo existiam, não via como poderia evitar isso. E nem queria evitar. Os dois são um casal necessário demais, por motivos que talvez nem eles entendam direito.

- Você concordou com isso, Kyle?

A voz de Simon Fuller o tirou de seus pensamentos, e ele rolou os olhos de maneira discreta, antes de respondê-lo.

- Sim, Simon. Concordei com isso e dei liberdade a eles.

Kyle sabia que qualquer consequência que viesse a recair sobre si mesmo, não seria nem perto do que poderia acontecer com os mais novos, principalmente com Noah. Ele era um homem feito, já. Lidar com pessoas feito Simon não configurava nenhum desafio que já não houvesse transposto antes.

- E posso saber o motivo?

O coreógrafo apenas cruzou os braços e virou seu corpo para o homem que estava ao seu lado. A noção de hierarquia estava muito bem definida em sua mente, mas não lembrava de ter assinado nenhum contrato onde estivesse explícito que teria que justificar as mudanças feitas nas sequências do grupo. Entretanto, por ser adepto do conceito de que gentileza gera gentileza, apenas respondeu de maneira cordial.

- Testar coisas novas, Simon - deu de ombros - Essa coreografia sempre teve alguns problemas, o principal era esse solo onde usávamos pessoas demais, dando uma conotação completamente diferente para um trecho que deveria dizer que a sua cabeça está em apenas uma pessoa... - o mais experiente o olhava atento - Apenas resolvi fazer algo mais condizente e encaixar com o que é dito.

- E por que os dois? - perguntou o empresário.

- E por que não os dois?

Aquilo pareceu ficar na cabeça de Simon por um tempo. Sua falta de justificativa imediata, aquietou um pouco Kyle. Apenas por estar sentindo que a calma estava dando lugar a impaciência, talvez demorar mais a proferir sua opinião ajudasse a não perder o controle.

We ain't finished yet. - NoarraOnde histórias criam vida. Descubra agora