Nuvem Branca de Magia

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A limpeza na cidade de Ulstead era lenta e um tanto mórbida. Muitas famílias agora estava desfalcadas, algumas sem um pai, outras sem alguns dos filhos e outras sem mãe. Houve quem perdesse os mais idosos. Tenerife estava gerindo como podia o castelo, e junto com seus homens buscava em meio a um quebra cabeças macabro a parte de baixo de seu rei enquanto amontoavam em uma só vala o restante dos mortos da vila. Isso pois ainda era o dia seguinte a batalha, em breve o cheiro da podridão das carnes se espalharia por todo reino.

"General, o que acontece se não tivermos o príncipe?" Apesar do tratamento formal, quem perguntava era o filho Lucas.

"Não diga a ninguém algo assim soldado, o príncipe está vivo, assim como a princesa. E em breve eles estarão de volta." Tenerife não tinha certeza nenhuma do que dizia, mas preferia que fosse assim.

A manta de escuridão que encobria os céus retrocedeu lentamente. A neblina que impedia todos de ver o solo perfeitamente se foi junto com ela. Era assustador as marcas do corpo da serpente, eram fundas, como se tivessem sido deixadas por algo muito pesado. O sangue da cobra se concentrava em maior quantidade onde parte do rei havia estado antes, uma poça de algo espesso, escuro e mal cheiroso. Nada tinha a ver com sangue.

"A fogueira será acesa quando general? Temo que os mortos começaram a cheirar em breve." Um dos outros soldados próximos perguntou a Tenerife.

"Amanhã faremos a primeira fogueira. O restante da sujeira será lavada e tudo que encontrarmos na sequência fará parte da segunda pira." Depois de anos sem ir a guerra, Tenerife estava tendo que lidar com a sujeira de uma novamente.

"Sim senhor." O soldado acatou.

A primeira pira já perecia estrondosa. A quantidade de entranhas, e pequenas partes e parte quase inteiras. Era impossível identificar o que era uma mão e o que era o pé.

(...)

Era fim de tarde, quase noite quando Tenerife ordenou que a feitura da primeira pira fosse terminada no dia seguinte. Não adiantaria virarem a madrugada recolhendo corpos, eles também tinham perdido pessoas, tinham lutado contra algo que parecia invencível. Precisavam se recolher para sentirem a dor.

Alguns cidadãos de Ulstead foram abrigados no castelo, algumas crianças agora não tinham mais família. Muitas casas haviam sido destruídas tanto na explosão da serpente quanto durante a batalha dela contra os guerreiros do reino. Elizabeth foi quem ficou responsável por organizar aquelas pessoas, visto que as outras funcionárias do castelo, algumas estavam abaladas demais para colocar alguma ideia na mesa. Uma sopa foi servida a todos, poucos foram os que conseguiram se alimentar. Ninguém tinha fome em meio a tragédia.

Os pensamentos da menina continuavam voltando na princesa, diferente dos outros, ela sempre foi muito apaixonada pela magia do reino de Moors e pela história trágica da grande fada. Ela sabia que se uma criatura daquelas proporções havia chegado ali, era porque haviam outras ainda piores em outros lugares. E ela temia, que onde Aurora estava tivesse uma como aquela também. Mas sabia que a princesa estava viva, não sabia se estava bem, mas sentia que a outra estava viva. Ela precisava estar. Liz e as gêmeas dividiram espaço em uma das cobertas que haviam colocado ao longo de todo salão de festas. Havia muita gente ali. O trabalho de levante de Ulstead seria árduo. Mas eles conseguiriam superar mais essa.

(...)

A madrugada de Elisabeth foi agitada, apesar do silêncio ao seu redor uma falta de ar repentina fez a menina se levantar. Se certificou de que as gêmeas estavam ainda adormecidas e saiu do salão de festas tentando não pisar em ninguém. Respirou ansiosa quando conseguiu sair daquele lugar. Estava se sufocando com os próprios pensamentos, seu costume de pensar demais estava levando a melhor. Para sua surpresa ela encontrou o pai sentado na escadaria do castelo.

"Pai." O homem olhou pra cima e abriu os braços ao ver a filha ali.

O rosto de Tenerife estava lavado em lágrimas. Ele havia perdido mais um grande amigo em mais uma batalha. Sempre se fazia de forte, mas por dentro era sempre tudo multiplicado.

"Obrigado por se manter firme minha pequena." Ainda dentro do abraço do pai Liz chorou copiosamente pedindo em pensamentos que tudo ficasse bem dali pra frente.

Ambos foram surpreendidos quando uma nuvem de poeira apareceu no horizonte. Era uma poeira branca como se fosse uma enorme nuvem, mas nuvens não vem do chão. Tenerife viu o medo nos olhos da filha e sabendo que não teriam tempo de se levantar ele se colocou como um escudo ao redor de sua Elisabeth enquanto fechava os olhos esperando pelo impacto que vinha. Mal tiveram tempo para associar, foram engolidos pela nuvem em segundos e apagaram.

(...)

Elisabeth acordou, estava deitada do jeito mais desconfortável possível quando se levantou, se assustou ao ver que o pai não estava ao seu lado como ela se lembrava que havia apagado na noite passada.

"Pai..." As palavras foram engolidas, quando a menina olhou ao seu redor.

Ulstead não se parecia em nada com a da noite passada. Não havia mais sangue, nem odor, nem pedaços espalhados para todo lado. Era como se alguém tivesse passado a noite toda limpando tudo para surpreende-los no dia seguinte. O dia estava iluminado e apesar de ainda haver a destruição, não existia mais escuridão no ar. Viu o pai lá em baixo no terreno do castelo reunido com o que havia sobrado de sua tropa e ao centro deles uma estatuta do rei John feita em bronze e cheia de lírios na base.

(...)

Ao meio dia, quando o sol brilhava alto no céu, toda a vila se reuniu ao redor da pira, todos para prestar sua despedida aos seus mortos. Não sabiam como a vila havia se limpado tão depressa, ninguém assumiu a "culpa" por aquilo. Tenerife ficou responsável pelo discurso.

- Povo de Ulstead. Ninguém esperava por algo dessa magnitude, uma criatura mágica e praticamente invencível. Desolação e tanta dor que mal nos cabem nesse momento. Perdemos pessoas, pais de família, irmãos, filhos e amigos. Mas resistimos, e graças ao nosso rei nossa vitória foi possível. - o general respirou. - O sacrifício dele e de muitos soldados não passará em branco nem um dia sequer. Todos os dias suas histórias serão contadas, até que se tornem lendas e sejam eternizadas. - todos aplaudiram as palavras do homem. - De agora e por duas semanas esperaremos por notícias do príncipe Phillip, que deve assumir o trono no lugar de seu pai, um grande guerreiro. - todos receberam sem discussão as novas notícias.

A pira foi acesa sem dificuldade. Só que ao invés da fumaça escura e do mal odor já esperado, quando o fogo tomou aquele amontoado de gente, começou a se elevar em fumaça colorida e brilho. Era magia, só podia ser. Não havia fedor ou tristeza. Os corpos viravam cores e brilho. Não houve um que não chorou.

Ao fim da queima nenhum morador mais havia, Tenerife e seus filho e sua tropa não saíram até a pilha queimar. Elisabeth sabia o que aquilo significava, era coisa de algo mágico, era óbvio que era. Agora só podia rezar para que o príncipe e Aurora estivessem vivos.

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E aí pessoal, o fim da batalha em Ulstead por enquanto, e o que era a nuvem branca que veio do chão? Palpites?

Bom, deixem aquele comentário para fortalecer a autoestima pq eu não tenho!

Até o próximo!
❤️

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