Veneno de Deus

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E houve batalha no céu; Miguel e os seus anjos batalhavam contra o dragão, e batalhavam o dragão e os seus anjos; Mas não prevaleceram, nem mais o seu lugar se achou nos céus. E foi precipitado o grande dragão, a antiga serpente....

Apocalipse 12:7-9



Como um fluxo que sempre avançava, ele seguia a nuvem de borboletas, não sabia para onde ia nem pensava sobre isso. Se sentia dividido como se faltasse algo. Então o fluxo parou e antes de sequer começar a observar o lugar que se encontrava, um terror primitivo se abateu sobre ele. Observou o abismo negro do universo, uma massa sombria e titânica.

— Posso com toda a indubitabilidade alegar que o fato de você ser capaz de chegar a este local comprova-se possuir uma capacidade imensurável.

Samael contemplou a nuvem de borboletas que se localizava no alto de um corpo feminino que trajava vestes de inúmeros tons azuis, longas e cheias de estampas de borboletas. A única coisa visível do rosto de tal ser através daquela quantidade absurda de borboletas voando7 são os olhos com a íris no formato de uma borboleta.

— Que lugar é esse? — Perguntou.

— Possuo a convicção de que saiba. Pois você faleceu.

—Ah — agora se recordava, tudo parecia um sonho tão distante.

Ele havia morrido. Não pode fazer nada, nem salvar ninguém. Percorreu um longo caminho para então resultar em uma derrota patética. Não havia chance de vitória desde o começo, toda a sua vida foi uma ladeira abaixo.

As borboletas estavam por todos os lados, todas em tons azuis, era como se mostrassem toda a sua vida. Quando foi que tudo ficou assim?

Ainda era criança e estava com sua mãe na periferia da área 13, naquele dia os que conseguiram sobreviver foram os que estavam o mais distante do epicentro da tragédia. Horas antes de tudo virar um inferno congelado, ele andava pela calçada segurando a mão da sua mãe. Ali estava toda a sua segurança, todo o seu mundo. A amava muito.

— Meu pequeno — disse ela se agachando e limpando o sorvete na bochecha dele. — Me diz, o que gostaria de fazer agora?

Olhou para os olhos dela, azuis como os dele, a pele escura como a dele, assim como os cabelos ondulados e escuros. Porém nela existia uma perseverança, uma certeza de tudo o que fazia, como se pudesse mudar o mundo simplesmente por existir.

— Não sei — foi o que ele respondeu de forma sincera, não sabia de nada, não entendia nada, o mundo era muito grande para uma criança, mesmo esse mundo se resumindo uma enorme cidade dentro de uma cúpula.

Piscou os olhos e a borboleta que o fez rever aquela cena passou, a mulher com a face escondida por borboletas continuava a olhar para ele.

— Se estou morto, para onde devo ir?

— Morto você está, entretanto não da forma como pressupõe.

Ela se moveu ficando mais próxima a ele, e mesmo com toda essa proximidade ele não conseguia ver o rosto dela.

— Corpo, mente e essência. Do corpo você está se afastando, logo mente e essência se separarão. Dito isso, morto apenas de uma forma e não definitiva.

E antes de sequer conseguir pensar a respeito disso, estava caindo por abismos crepusculares, formas geométricas e incontáveis fórmulas se moviam ao seu redor, caiu vertiginosamente em uma queda sem fim enquanto um terror indescritível apertava sua garganta.

Serpente do Vazio - Irregular (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora