Aflição Miserável

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— É impossível! Não tem como isso ser verdade! — a voz de Samael saiu alta e desesperada. — Eu sou humano! Humano! Humano!

A Dra. Akagi olhava pensativa para o rapaz que não desgrudava os olhos da tela do Dis-Cy. Os olhos deles estavam vidrados e às lágrimas escorriam de forma desesperadas, uma tempestade acontecia dentro dele, não tinha como ela compreender, não sabia nada sobre Samael e muito menos porque agia assim.

— Não entendo nada dessa história de silicante. Sou humano, um humano! Doutora isso não está certo...

— Samael, você é um silicante, não faz sentido ficar dizendo que é humano. Olhe para si mesmo, ou acha que isso é apenas ilusão.

— Eu sou humano!

— Não é. Seus olhos são a prova de que é um silicante. Por acaso não sente um estranho aroma vindo das pessoas ao seu redor? Você escuta ruídos que seriam baixos para qualquer pessoa, mas para você são altos? Enxerga detalhes mínimos nas coisas?

Não respondeu, tudo o que ela dizia era verdade, havia sentido todas aquelas coisas.

— M-mas — disse ele com lágrimas nos olhos, — até antes nada disso disso acontecia, até outro dia tudo estava normal.

— Me pergunto o que aconteceu com você. Os exames dizem que você é de silício. Sua sorte é que fui eu a atendê-lo.

Fitou os olhos dela, eram como os dele, às irias como rosas desabrochadas e o ponto negro no meio delas, a pupila contraída por conta da grande luminosidade do quarto branco. Se afastou sentindo medo.

— Não precisa ter medo, não vou machucá-lo. Sou uma silicante como você e não sou sua inimiga. Se fosse uma humana já teria te denunciado. Aliás a atendente na recepção também é silicante, posso dizer que foi seu dia de sorte.

Sorte? Ela só pode estar brincando, como isso poderia ser sorte? Sua vida estava ficando louca.

— Por favor me diz o que está acontecendo comigo? Eu nunca tive essa sensação estranha que estava sentindo antes, nunca tive essa dor no estômago, essa fome insaciável por algo estranho, é como se eu tivesse ficado dependente de uma droga.

— A fome é por causa da necessidade que seu corpo tem por soma.

— O que é soma?

— Você realmente não sabe de nada?

— Eu não entendo nada doutora, nada! Estou perdido com tudo isso, parece ser um pesadelo.

— Talvez algo tenha acontecido com suas memórias de silicante. Algo traumático deve ter feito você esquecer o que era — fitou a janela ao fundo, — será que aconteceu um tipo de hibernação na sua estrutura corporal que o permitiu viver muito tempo sem soma? Ou algo relacionado aos bunts. Talvez não tenha sido há tanto tempo assim. Mas o fato é que agora seu corpo está reagindo a falta de soma, e você precisa consumi-lo.

— Poderia me explicar tudo de uma forma simples, por favor?

— Se minha hipótese estiver correta, a única coisa que você esqueceu é sobre ser um silicante, pode ser que esta perda de memória tenha acontecido há um mês. De toda forma, você tem que parar de negar o que é, olhe bem para você.

Aquilo era fato, sua pele estava cinza, suas orelhas e seus dentes eram pontudos, estava parecido com aqueles homens no beco. O desespero e as lágrimas foram inevitáveis.

— Eu sou... um monstro.

— Não diga isso, pois não é verdade, silicantes são como qualquer outra pessoa.

Serpente do Vazio - Irregular (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora