Gravitação

81 11 15
                                    

A pequena bola de borracha do tamanho da palma da mão de Helena era arremessada contra o teto, então ela quicava e voltava para sua mão, algo tão simples que ela poderia fazer de olhos fechados. Estava deitada em uma cama no quarto de visitas na casa de Ana e Romulo. Era um quarto pequeno, sem janelas com apenas um duto de ar em um dos cantos do teto. Sempre que queria dar um tempo da superfície ela ia até ali. Nas paredes do quarto inúmeros desenhos de flores que ela desconhecia o tipo, se espalhavam como um fungo. Os desenhos eram bonitos, todos feitos por Yayoi, aquela garota estava sempre desenhando alguma coisa, às vezes desenhava seus pesadelos e até Helena tinha medo desses desenhos.

Havia um em particular que lhe havia chamado a atenção, um grande olho em forma de lente de câmera em meio a um vórtice, e na frente dele a sombra de uma garota de perfil, ela tinha um chifre na testa. Haviam inúmeras borboletas azuis no desenho, assim como um chão cheio de ossos, crânios e carne.

As outras crianças quando viram o desenho ficaram assustadas, Ana jogou fora o desenho e pediu para Yayoi não desenhar mais. Helena sabia que a menina ainda desenha e escondia esses desenhos. A pequena viveu sozinha em um lixão por muito tempo, é claro que teria sonhos ruins e estranhos, mas esse desenho em especial era o que mais perturbava Helena.

Yayoi havia perguntado por Samael quando ela chegou ali, ela respondeu que ele não viria, a menina ficou triste e isso incomodou Helena, não gostava de ver crianças sofrerem por qualquer motivo que seja, mas ela estava amargurada e a bolha em sua mente parecia aumentar de tamanho a cada dia, cheia de pûs nojento que iria escorrer por seus ouvidos se não tomasse logo uma decisão.

A bola quicou novamente e voltou para sua mão. Quanto tempo fazia que estava ali na casa da Ana? Uma semana? Ou quem sabe mais tempo? Não conseguia se decidir, muito menos falar com Mikaela. A loira já tinha o problema de ser herdeira da MassDrive e agora veio com essa ideia de agente. Porque tinha que complicar tudo?

Com o canto do olho notou que Yayoi a espiava pela porta entreaberta.

— O que foi princesa? — Helena sentou na cama parando de jogar a bola.

A menina entrou carregando um livro, era sempre o mesmo, o qual levava para todos os lados. Se aproximou de Helena ficando de frente para ela.

— Poque o Sa não vem mais aqui?

— Por que faz algum tempo que não o vejo.

Havia se distanciado o máximo possível das pessoas e esquecido que deveria ajudar o Samael. Os olhos amarelos de Yayoi continuavam a encará-la.

— Você quer muito ver ele?

A menina acenou positivamente com a cabeça.

— Certo — ficou em pé e pegou na mão de Yayoi, — vamos achar a Ana e o Romulo primeiro.

Encontrou o casal mexendo em um painel elétrico, haviam vários consertos improvisados, Helena achava que em algum momento aquilo entraria em curto e queimaria todo aquele lugar, decidiu que traria um painel novo e cuidaria de deixar tudo em ordem.

— Hei! — Disse Helena se aproximando com Yayoi. O casal voltou sua atenção para ela. — Vou levar a Yayoi comigo para um passeio na superfície.

Ana olhou demoradamente para a Yayoi, franziu o cenho e falou:

— O que foi minha princesa? — Se aproximou da menina. — Você raramente quer sair de casa, ainda mais para um lugar que sente medo como a superfície.

A menina nada respondeu apenas se escondeu atrás de Helena.

— Ela quer ver o Samael, e é minha culpa não tê-lo mais trazido aqui.

Serpente do Vazio - Irregular (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora