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[AVISO: eu pouco ou quase nada sei sobre a primeira guerra mundial. Tudo o que irão ler aqui escrito foi com base na minha imaginação do que poderia ser sido a grande guerra. Então não levem a sério nenhuma suposta informação aqui exposta. É tudo ficção]



"É perigoso atravessar
É perigoso ficar no meio
É perigoso ter medo
É perigoso parar"

- António Barahona


Alguns anos atrás

Lance estava consideravelmente melhor. Já conseguia andar normalmente, ainda que com algumas dores, e não precisava que Max estivesse constantemente a parar para que ele conseguisse acompanhar o seu ritmo (ele insistira que ela não o ajudasse, apesar do esforço extra que tinha de fazer).

Lance não conseguia entender como é que aquela mulher franzina tinha mais resistência que ele. Tinha um corte na barriga mas andava em passo rápido e ritmado. Nunca parava e ele nunca via um pingo de dor no seu rosto impassível.

Tinham conseguido chegar aquela aldeia no tempo que Max tinha previsto. Não tinham encontrado ninguém, e por isso instalaram-se numa casa discreta com mantimentos que podiam sustenta-los por muito tempo.

- Não podemos ficar aqui muito tempo - ecoa Max, enquanto arrumava uns cobertos no quarto principal daquela casa de campo, com um celeiro independente da casa na parte de trás.

- Porquê não?

Ela lança-lhe um olhar por longos segundos, mas Lance não consegue identificar a sua entoação. Estará aborrecida com ele? Ou está simplesmente pensativa? Ele não sabia dizer.

- Não encontrámos um único corpo morto, o que significa que toda a gente fugiu. Mas porquê?

- Obviamente sabiam que as tropas inimigas estavam para vir - Lance encolhe os ombros, não entendendo aonde ela quer chegar.

- Cresceste na cidade, tenente? - ela pergunta-lhe.

- Londres - ele esclarece.

- Então não entendes. Nunca uma aldeia estaria completamente vazia. Nem todos querem deixar toda a sua vida para trás sob a iminência de perigo. Preferem arriscar a perder a vida - ela faz uma pausa, introspectiva - E não há animais.

- O que é que queres dizer com isso? - Lance pergunta, sentindo-se terrivelmente estúpido. Ela estava muito além da sua inteligência, e isso era-lhe insuportável. Era como se fosse ela o oficial de entre os dois, e não ele. Para além de que nem homem era, o que tornava tudo ainda mais humilhante.

- Todos fugiram sem pressa. Isso é estranho.

- Achas que eles foram-se embora com os animais mas deixaram imensos mantimentos para trás? - Lance franze o sobrolho, não acreditando muito naquela teoria. As casas que a que tinham entrado estavam ainda abastecidas.

Na sua opinião eles levaram apenas o que achavam estritamente necessário, o que incluída os animais. Logicamente eles representavam uma constante. As cabras podiam dar leite todos os dias. As galinhas davam ovos, e por aí adiante.

- Não é isso. Apenas tudo isto é muito estranho. Levar tantos animais assim mas deixaram para trás tanta comida... Não é normal.

- Não sei se reparaste, mas nada disto é normal - Lance replica.

Ela lança-lhe um olhar que ele pensava ser de desagrado, mas depois a sua expressão suaviza-se.

- Às vezes penso demasiado - ela confessa, aparentando, pela primeira vez desde que Lance a conhecera, cansaço.

- Nisso ambos concordamos - ele assenta com a cabeça, sorrindo se lado.

- Não era suposto concordares comigo. Deverias dizer "não, Maxwell. Tu és perfeita. Salvaste a minha vida e eu devo-te tudo" - ela diz com sarcasmo.

Lance ri-se, completamente apanhado de surpresa por aquele comentário divertido da sua parte.

- Posso chamar-te Eleanor? - ele pergunta-lhe, cessando o riso.

- Podes chamar-me o que quiseres. Pouco me importa - ela encolhe os ombros, com indiferença - Daqui a umas semanas ou estamos mortos ou de volta a Inglaterra.

Ainda estavam a um longo caminho de voltaram para a sua terra natal. Partindo do suposto que conseguiriam chegar até à costa, tendo em conta que estavam a muitos quilómetros de distância? ainda teriam de apanhar o navio que os levaria para Inglaterra, que demoraria ainda mais tempo. E nada garantia que conseguiriam lugar imediatamente. Podiam ter de esperar muito tempo.

- As tropas inimigas estão muito longe daqui. Temos fortes possibilidades de sobreviver.

- Não podes dizer isso. Há semanas que não temos contactado com ninguém nas trincheiras - Max abana a cabeça.

-  Porquê é que recuariam nesta direção? Não faria sentido em qualquer estratégia que eles decidam tomar.

- Tal como nós temos equipas especiais fora do epicentro das batalhas, eles também terão enviados especiais para eliminar soldados britânicos isolados.

- Eles não têm tantos recursos para andarem a dispensar soldados para eliminar uma mão cheia dos nossos.

- Bom, esperemos que tenhas razão - ela anui, deitando-se na cama.

Lance hesita, mas depois deita-se ao seu lado, e ambos ficam em silêncio a encarar o teto.

- Temos de parar por pelo menos alguns dias - Lance diz, quebrando o silêncio - Se não, não vejo como consigamos chegar à costa. Estamos feridos, cansados e subnutridos.

Ele espera que ela o contradiga com inúmeros argumentos em como aquela ideia é idiota e como têm de tentar sair daquele sítio o mais rapidamente possível. Mas ela não o faz. Talvez esteja demasiado cansada de discutir com ele.

- Está bem.

- A sério? - ele arregala os olhos.

- Porquê é que estás assim tão surpreso? - ela questiona-o, franzindo a sobrancelha - Tu é que és o tenente. Eu só sou um soldado ilegal.

- Seria ótimo se todos os soldados fossem ilegais como tu.

Aquilo faz Max formar um leve sorriso nos lábios.

Tell Me It's Over | Peaky BlindersOnde histórias criam vida. Descubra agora