Capítulo 2: O colega de quarto

156 32 193
                                    

  Fico no meu quarto pulando na cama igual uma criança, me escondendo, presa em meus próprios devaneios. Não sei o porquê tenho tenho tanto medo de me encontrar com o meu colega de quarto... E se ele for um monstro? Ou se for perigoso?
  Mas qual o problema ser infantil? Eu só tenho 17 anos. Não devo me culpar por isso.
  Escuto alguns barulhos na sala, então sei que ele chegou, os sons são baixos, mas eu tenho uma audição muito boa, pois eu caçava com o meu papai quando eu era criança... Quer dizer, eu mais o atrapalhava a qualquer outra coisa, pois quando ele mirava a espingarda em algum animal, eu gritava o mais alto que podia para ele se desconcentrar e o animal fugir.
  Me concentro nos barulhos do meu colega de quarto e penso que se eu ficar aqui, talvez nunca precisarei o encontrar. Sei que é idiota, mas todas as pessoas tem uma versão assim, eu suponho.
  Então começo a pensar como seria ter o vovô Epicarmo como colega de quarto, vê-lo andando pela casa como se fosse desmontar ou falando tão baixo que me faz dormir, rio com a ideia. Apesar que tenho facilidade em me tornar amiga de idosos, então seria legal, de certa forma. Seria bom ter alguém que me desse conselhos, e sei que ele certamente seria essa pessoa...
  Grito após levar um susto.
  Meu colega de quarto abriu a porta de maneira impetuosa, quase agiu como se fosse seu próprio quarto. Estou muito brava, sinto meu rosto queimar, mas me conheço e sei que nunca brigaria com alguém, por mais inconveniente que a pessoa seja.
  Ele me olha, como se estivesse avaliando minha expressão, vira a cabeça de lado e e dá um sorriso. O único que vi hoje.
  Fito e analiso cada parte de seu corpo, sua pele é dourada, quase como um bronzeado. Tem um cabelo curto num tom castanho e olhos negros. Sua sobrancelha é grossa, mas nada que deixe sua expressão pesada, apenas séria. Tem um queixo quadrado com uma barba bem rala... Sua boca tem um lindo formato e é quase vermelha, é maravilhosa...
   Quero tanto beijá-la, minha líbido grita.
   Começo a reparar em seu corpo... E não deixa a desejar, seus braços são fortes, mas não daquele jeito que vemos em academias... É algo simétrico e excitante...
Passei meus olhos pelo teu peito até seu abdômen, de um jeito demorado, tentando absorver o máximo daquela visão, e reparei que...
  - Garota, meu rosto é mais para cima - diz, enquanto sinto meu rosto corar.
  - de-desculpe - gaguejo, o olho com a cara do gato de botas, mas com ela um tanto vermelha de tanta vergonha.
  Ele respirou, com uma expressão séria, não, ele parece estar zangado.
  - Se um homem fizesse isso com você, com toda a certeza se sentiria desrespeitada. - franze a testa enquanto fala.
  - Tem razão, eu não costumo fazer isso, não sei o que aconteceu hoje. Bom, recomeçando: meu nome é Violet e o seu?
  Ele me observou com uma expressão divertida, chego a pensar que não estava bravo de verdade... Mas ele tem razão, foi inapropriado.
  - Meu nome é Lucca, - diz enquanto sorri de uma maneira maliciosa - não quis invadir o teu quarto, é que não ouvi nenhum barulho e fiquei preocupado, vai saber se minha colega de quarto morreu antes de eu a conhecer.
  Dei risada, não pensei que eu estava tão quieta, até porque estava pulando na cama há pouco tempo.
  - Sem problemas, - ofereci meu sorriso mais sincero - foi um prazer te conhecer.
  -Digo o mesmo. Bom, agora tenho que ir para o banho. Até mais. - disse e nem deu tempo de me despedir antes de sair de modo apressado pela porta.
  Deito na cama, nem percebi que havia ficado em pé para falar com ele... Que estranho!
  Sei que ainda está de dia, não tenho como dormir agora e ansiar pelo dia de amanhã. Por isso sei que preciso fazer algo. Acho que conhecer essa cidade será ótimo.
  Saio do meu quarto, e enfim reparo no ambiente. De frente para o meu quarto tem uma porta entreaberta, me aproximo para ver o que há ali. Abro a porta de uma maneira calma, sem fazer barulho, não quero que Lucca se assuste e saia correndo do banho. Vejo que é um quarto, pela bagunça na cama que indica estar sendo usado, então deduzi que é do meu novo colega.
  Percebi que pensar que é um colega de quarto chega a ser idiota, já que ele não dorme no mesmo quarto que eu... Infelizmente...
  O quarto dele cheirava a perfume masculino, mas acho que ele contrabandeou, porque não pode ter isso aqui.
  Me sinto na obrigação de invadir seu quarto, já que ele fizera isso com o meu. Abro algumas gavetas... Todas, na verdade, mas por mais que eu mexa em toda e qualquer coisa não há algo aqui.
  Me sinto frustrada, quando entrei até pensei que talvez eu encontrasse algo incriminador, como um corpo humano. Qualquer coisa que me fizesse não admirá-lo.
  Sim, eu mal o conheço, mas o admiro, sinto como se uma água gelada passasse pelas minhas veias, ele é tão fofo e bonito! Aí, já estou apaixonada, meu Deus.
  Violet, cala a boca, meu cérebro disse.
  Tenho que sair daqui.
  Saí correndo do quarto de Lucca, chego a pensar que vou tropeçar nos meus próprios pés. Estou com medo de que ele ouça meus pensamentos.
  Passei por um corredor longo, não havia reparado nisso quando andei por aqui. Acho que eu estava muito aérea. Havia algumas portas aqui, mas não estava com muita coragem para abri-las.
  Cheguei à sala, observei cada canto, vi que os sofás não têm cores vivas, apenas bege em um tom quase encardido. Os outros móveis eram de uma madeira já velha e desgastada como toda a casa. Não havia qualquer coisa confortável aqui, até me senti na sala do drácula.
  Acho melhor sair daqui, este lugar parece sugar minha energia vital. Me virei em direção à porta, até que ouvi:
  - Posso ir com você? - Lucca diz
  Olho em sua direção, como se vestiu tão rápido?
Não posso deixá-lo vir comigo. Suspiro.
  -Vem. Vou adorar tua companhia. - digo. Eu nunca seria capaz de dispensa-lo ou chateá-lo... Eu gosto dele, não posso fingir o contrário.
  O deixo passar por mim para abrir a porta. Reparo em seu corpo, ele estava com as roupas normais dele, não as que nos foram entregues.
  - Feiticeiros têm obrigação de usar as roupas daqui, não é? Por que está com as suas roupas? - perguntei. Ele riu como se fosse a maior piada que já ouvira.
  - Você é a minha mãe, por acaso?
  Ousado
Ele sai, quase como um rebelde sem causa que está fugindo de casa, e por um momento, tento entender o que está acontecendo. Ele volta e diz:
  - Vai vir ou não?
  Será que eu diria não?
  O sigo de maneira risonha, minha parte infantil quer acreditar que ele já me ama.
   Seguimos alguns minutos sem nos falarmos até que ele diz:
   - Não conhecemos nenhum lugar daqui, mas tem algum que queira ir? - eu olhei com uma expressão de dúvida para entender o que ele me perguntara - Vamos lá, olhe ao redor e escolha um lugar. - falou com uma expressão divertida.
   Olho ao redor e escolho o lugar menos provável: uma floresta escura que há ali, é assustadora.
   Ele me olha um pouco alarmado e diz:
  -Violet, não acho que devemos ir para lá, parece... Perigoso. - diz enquanto estuda minha expressão.
  -não sabia que você era tão medroso. -  provoquei-o enquanto ele parece se sentir desconfortável - se você não é homem para ir, eu vou. - Ele me olha como se sentisse nojo.
  - então vá - retruca.
  Acho que eu o magoei, sei que falei algo idiota, mas pensei que talvez ele fosse se sentir incentivado, sempre vi isso na escola, alguém falando sobre a masculinidade do outro, pensei que era normal. Até que entendi o quanto fui ridícula. Senti ódio de mim mesma.
  Entretanto, por mais que eu saiba que fiz algo errado, não vou me desculpar, ele vai me achar uma boba, uma criança. Tenho que ir e provar que sou corajosa.
   Ando em direção à floresta, posso jurar que ouço vozes me chamando, quanto mais me aproximo, mais me sinto assustada. Mas tenho que ir, não conseguirei enfrentar Lucca depois dessa cena.
  Chego na entrada da floresta, penso que já está de bom tamanho, já provei minha coragem, mas quanto mais eu tento voltar, mais sou levada para o sentido contrário.
  Um passo para trás, dois para frente, dois em retrocesso, quatro em avanço, até que não senti mais vontade de lutar.
  Continuo, é quase como se um ímã que puxa meu corpo, eu simplesmente não posso, consigo e quero resistir, me deixei ir.
  Até que essa sensação para. De repente, eu consigo me dar conta do que aconteceu, eu estou dentro da floresta e não sei como voltar. Grito o nome de Lucca a ponto de ficar rouca, peço desculpas, digo o quanto queria impressiona-lo, minha garganta começa a arranhar.
  Então, no ímpeto de minha loucura, eu corro, mas sempre pareço correr para o mesmo lugar.
  Olho para o céu, vejo que está escurecendo. Claro, é óbvio que neste lugar o dia passa mais rápido. Senti medo, pois nunca vou sobreviver nesta floresta a noite.
   Até que ouço um barulho, Lucca veio me salvar! Aposto que quando isso passar, ficará tudo bem.
   Me viro em sua direção... Mas não... Não é...
   É ele...
   Sinto minha cabeça girar e vejo seu sorriso malicioso antes do meu corpo cair no chão.

O Poder Da FeiticeiraOnde histórias criam vida. Descubra agora