Atlas

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Há noites em que não durmo. E nas noites em que eu não durmo, eu penso. Pensar é o primeiro passo para se escrever. Não se pode escrever sem ter em mente sobre o que se escreve, sobretudo uma pessoa como eu, que só escreve quando está suficientemente feliz, ou suficientemente triste. Hoje estou mais do que suficientemente com alguns coisa que ainda não sei dizer. Então já falhei no meu papel de tentar ser nomeadora de todas os seres, de todas as dores. Mas se é dor isso mesmo que me acomete, então estou de fato triste.

Já comprovei que sou uma daquelas pessoas egoístas demais para tentar escrever um texto sem a palavra eu. Eu deveria tentar. E como uma dessas gentes egoístas, reclamo daquilo que me faz mal. E se aquilo que me faz mal hoje sou eu mesma? Então eu sentirei o peso da realidade cair sobre os meus ombros e a dura existência baterá sua palma na minha cara e a voz do universo falará: Menina, você é um Atlas.

Mas eu não queria. Não queria. Não queria. Eu queria ser um Cronos. Mas se eu fosse um Cronos eu seria um Deus e se eu fosse um Deus eu não seria um Atlas. Eu queria não sofrer com as dores e doenças do mundo, mas estou aqui e por estar aqui eu sei que vai doer, muito. Eu imagino um bilhão de estrelas me olhando agora, rindo de mim, me apontando o dedo como eu aponto para elas. Sobretudo a Eta Piscium, quando me vê colocando a culpa no meu signo. E ela ri, há mais de duas centenas de anos luz de distância. E eu sei que ela ri, porque eu sinto arrepiar minha espinha quando ela da suas gargalhadas. Justo ela, a mais brilhante. Mas se ela não risse, se ficasse calada, aí seria outra estrela, seria outra pessoa e não seria eu.

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Foto de capa: Ilustração de Maria Ramos

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