Addie

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Os dias que se seguiram após o almoço com o Charlie foram bem monótonos no trabalho, porém bem corridos por conta da mudança. Precisei vender algumas coisas que eu já não iria mais precisar e não tinha onde colocar. Mas no fim, tudo deu certo, no sábado à tarde ele veio me buscar, coloquei tudo o que tinha sobrado no porta malas do carro dele, entreguei as chaves para Robert que me olhou com pesar, como se doesse nele ter me despejado, mas já não importava, já estava feito.
Chegamos no apartamento por volta do meio dia, descemos as malas e ele me apresentou cada canto. A porta de entrada branca e enorme, revelava uma sala com um sofá creme e atrás dele um papel de parede cinza com flores que ia até o teto igualmente enorme. Era um apartamento de dois andares, a cozinha era industrial com uma mesa redonda com quatro lugares e um arranjo. Subindo as escadas, o segundo andar continha três cômodos, dois quartos e um estúdio, a parede era revestida com um material que isolava o som, ele me disse que treinava ali para ser o melhor guitarrista que o personagem dele pudesse ser.
Ele me apresentou o quarto dele que era bem como eu imaginava, cinza com móveis brancos, um violão encima de um suporte encostado na parede e alguns quadros dependurados dos mais variados artistas e de tipos diferentes de carro -isso me fez sorrir me lembrando de que era desse mesmo jeito no Canadá.
Já o meu quarto era bem simples visualmente, porém mil anos luz mais chique do que aquele que eu estava morando. As paredes brancas, um guarda roupa branco e um espelho, a cama de casal, uma varanda no lugar da janela, o que particularmente era bem minha cara.
-Você pode decorar como quiser -ele disse.
Depois de me mostrar tudo ele me deixou sozinha para organizar minhas coisas, coloquei um fone de ouvido e nem vi o tempo passar. Coloquei alguns porta retratos na mesinha perto da cama, ajeitei minhas roupas no armário e meus pertences no banheiro. Eu estava totalmente imersa na voz de Florence que ecoava no meu fone quando ouço a porta abrir me dando um susto.
-Desculpa, eu bati mas você não ouviu -Charlie estava parado segurando a maçaneta
-A música está alta -joguei o celular na cama - Entra...
Convidei e assim ele fez, entrou observando cada detalhe das coisas que já tinha feito até aquele momento. Sentou na minha cama e segurou o porta retrato que estava minha foto com Pete, meu irmão mais novo.
-Caramba Addie, esse garoto deve estar arrasando os corações.
Você nem imagina o quanto.
-Quero ver ele qualquer hora -ele continuou
-Claro... -respondi sem olhar para ele
-Eu vim ver se você está com fome, já está ficando tarde.
Olhei no relógio e realmente estava, já passavam das seis e eu nem percebi.
-Nossa, eu nem reparei que fiquei aqui tanto tempo, e na verdade estou com fome sim.
-Eu conheço um lugar que faz uma comida japonesa incrível, o que acha?
-Parece ótimo -sorri
-Tudo bem -ele colocou o retrato de volta no criado e se levantou. - Vou pedir então.
Terminei algumas outras coisas e fui tomar um banho bem relaxante, coloquei uma calça de moletom e um blusão largo, que era o meu outfit preferido. Tinha escutado Charlie sair e fui para cozinha esperar ele voltar com a comida, aproveitei e coloquei dois pratos na mesa que foi o tempo até ele chegar com as sacolas.
-O melhor temaki do mundo -falou separando as sílabas de cada uma das palavras, o que me fez rir.
-Isso foi bem convincente.
-E eu espero mesmo que tenha sido, mas se não foi, experimente e tire suas próprias conclusões.
Charlie tinha esse jeito, leve, desde que conheço ele. O que era ótimo, mesmo se eu estivesse tendo um dia de merda, seja porque meus pais tinham brigado ou porque o meu pai estava há dias fora jogando e eu estava com saudade, ele sempre conseguia me animar falando alguma coisa ridícula ou aumentando alguns fatos, qualquer coisa que me fizesse rir. Nunca de um jeito mau ou depreciativo, ele só era ele, e isso bastava.
-Eai eai -falou animado quando eu mordi um pedaço do tal temaki que era o melhor do mundo.
-Realmente Charlie, estou cem por cento convencida de que eu quero que esse temaki vire uma pessoa para eu poder me casar com ele.
Ele bateu na mesa e riu satisfeito com a minha resposta.
-Eu falei!
Eu lavei a louça e peguei uma cerveja para me sentar com ele no sofá.
-Eu quero ver Julie and the phantoms!
-O que? Sério?
-Claro -insisti - preciso ver você atuando, ou cantando, ou seja lá o que for.
Ele me olhou relutante e eu parti para minha arma secreta. Fiz um beicinho e falei "por favor" com uma voz de bebê. Eu sempre fazia isso quando éramos crianças e funcionou de novo. Ele revirou os olhos rendido e colocou o primeiro episódio da série que já começou com ele arrasando na guitarra. Eu nem pisquei o episódio inteiro, especialmente nas partes em que ele aparecia. No final eu estava chorando silenciosamente com Wake up.
-O que achou? -ele deu pause com o controle e me olhou.
-Acho que incrível nem começa a descrever o que eu achei... Essa garota é perfeita, que voz incrível -limpei minhas lágrimas- e você também está impecável, que talento, Charlie Gillespie.
Meus elogios foram totalmente genuínos e sinceros, realmente fiquei mexida com aquilo tudo, e de uma maneira positiva. Assistimos mais um episódio pausando algumas vezes para comentarmos e decidimos terminar depois. Ele colocou no aleatório do Spotify e ficamos conversando.
-Você se lembra aquela vez que sua mãe não deixou você ir para a escola de pijama e você chegou na minha casa com a roupa do uniforme e uma mochila chorando, e falou pra minha mãe que ia morar lá -soltei uma gargalhada me lembrando nitidamente daquele momento.
-A sua mãe super me adotou aquele dia, mas à noite eu fiquei com saudade de casa e você ficou bravo comigo porque não queria que eu voltasse para a casa.
Ele também gargalhou jogando a cabeça para trás.
-Minha mãe relembrou isso por vários anos depois que você foi... embora.
Uma expressão triste tomou conta do olhar dele, como se lembrar disso ainda o afetasse.
Eu me aproximei e segurei a mão dele.
-Me desculpa ter ido sem me despedir.
Ele balançou a cabeça.
-Já passou.
Engoli seco quando nossos olhares se encontraram e aquele mesmo olhar da última noite me fuzilou, eu me lembro bem onde isso nos levou da última vez e não pode acontecer de novo, não agora. Então eu desviei o olhar e me levantei.
-Acho que eu já vou, aproveitar meu sábado de folga com um sono de princesa -sorri e observei a expressão de frustração no rosto dele.
-Boa noite, Gillespie.
-Boa noite, Scott.
Fui caminhando para a escada, mas decidi não ir assim, então parei e me virei para ele.
-Charlie?
-Oi -levou os olhos até mim
-Você é esplêndido, em tudo. Seu brilho é único, cara. Estou orgulhosa de você.

ALWAYS BEEN YOU | CHARLIE GILLESPIEOnde histórias criam vida. Descubra agora