Botão de proteção

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"Lalisa"

Eu não conseguia dormir aquela noite, era como se a minha cabeça estivesse a mil, muitos pensamentos, muitas coisas a quais pensar realmente. E se eu tomasse uma atitude? Sobre tudo? Sobre os tratamentos? Sobre a conduta em geral?

Certamente seria internada por isso.

Abri a porta do meu quarto com muito cuidado, descendo as grandes escadas até o corredor dos pacientes, parando na porta 1996, fui guiada até ali, parecia que algo me puxava até aquele quarto, talvez o peso de deixar uma paciente como Jennie passar por tudo aquilo, mas se fosse realmente isso, teria agido da mesma forma com as demais pacientes, mas não agi, era especialmente como a paciente número 1996. A vi tentando de todas as formas abrir a janela, ela se esforçava, empurrava para os lados, para cima e para baixo, dava socos mesmo com as mãos machucadas, parecia não cansar, e a sua determinação me encantou tanto naquele momento.

- Duvido muito que consiga sair só socando a janela, Jennie - ela se assustou, eu já estava acostumada em vê-la assustada, mas não deveria. Jennie me olhou, parecia aliviada em saber que era eu e não outra pessoa ao pega-la no flagra sobre aquilo - Fica tranquila, você não é a primeira paciente que esmurra a janela, e tenho certeza que não será a última. Vamos, desça daí.

- Porque eu deveria te obedecer? Você é só outra enfermeira podre entre as demais desse lugar doentio.

- Mas sou a única enfermeira que não te machuca como as demais, ou estou errada? - ela abriu a boca para responder, mas a fechou descendo de cima da cama por fim - Porque não está dormindo?

- Porque quer saber?

- Jogo das perguntas agora? - eu ri baixo entrando em seu quarto, mas parando no meio do caminho assim que ela recuou um pouco - Quero saber pois, amanhã você terá contato com as demais pacientes, irá frequentar o refeitório, tomar banho de sol, irá fazer algumas atividades, já se passaram três dias você precisa ter contato com outras pessoas.

- Eu preciso voltar pra casa.

- Jennie... - suspirei puxando a cadeira para me sentar a sua frente - Seus pais te deixaram aqui, eles não querem você na casa deles, desculpa se isso magoa você, mas eles não querem te ver mais.

- Para... isso é mentira...

- Você fez algo a eles que manchou o nome da família Kim, e agora eles querem que você apodreça aqui, assim como as outras pacientes-

- Para... por favor para.

- Eu não aguento mais ouvir você dizendo que quer voltar pra casa, que precisa voltar para casa. Você não tem mais uma casa, Jennie, você não tem mais um pai e nem uma mãe, essa é a sua casa agora-

- CALA A BOCA! - fechei os olhos quando ela me acertou um tapa em meu rosto, tão forte que o eco recuou por todo o corredor - Eu não fiz nada de errado... - sua voz era embargada quanto falha, meio duvidosa e muito apavorada - Eu também estou cansada de dizer que não fiz nada... eu sei o que eu fiz... mas do que adianta? A minha palavra não é considerada...

- O que você fez, Jennie?

- Eu só... eu só... eu só beijei a minha melhor amiga... eu só fiz isso, e isso não é errado quando você ama alguém... - Jennie abraçou um travesseiro escondendo o rosto ali, de alguma forma em sua mente com aquele gesto ela abafaria os seus soluços, mas eu conseguia escuta-los, e eles me causavam dor.

Me levantei fechando a porta e passando a chave em seguida, ela levantou a cabeça achando que eu havia ido embora, mas a única coisa que eu fiz foi me sentar ao seu lado esperando que ela ficasse mais calma. Jennie tremeu quando descansei uma mão em suas costas, mas relaxou assim que mostrei a ela que não a machucaria de forma nenhuma, a abracei, um abraço sincero demais até para mim que nunca havia abraçado ninguém além da minha mãe antes dela morrer. Sua cabeça descansou em meu peito quando comecei a fazer carinhos em seus fios, olhei pela janela, mas abaixei os olhos ao sentir a dor, a dor de saber que Jennie nunca sairia dali.

- Porque está me abraçando? - sussurrou depois de um longo tempo, acho que dessa vez ela havia me deixado sem resposta.

- Para que a sua dor seja a minha dor também.

- Porque quer que a minha dor seja a sua?

- Porque eu prefiro ver você sorrindo do que chorando - fiquei surpresa comigo mesma pela a minha própria sinceridade. Mas mesmo assim, não me arrependia.

- Enfermeiras não fazem e não falam isso.

- Mas amigas fazem e falam isso.

Ela ficou quieta por algum tempo, pude ver seus braços aos poucos passando pela minha cintura e quando ela me abraçou senti uma forte conexão com ela, tão estranha quanto boa e não me importei se aquilo fosse contra as regras, ninguém iria ver, não naquele momento. Encostei as minhas costas na parede, deixando-a deitada em meu peito, minhas mãos tão concentradas em seus fios que acabei não percebendo o que realmente estava acontecendo. Aquilo era errado.

Mas eu não conseguia soltá-la naquele momento. Tipo um botão de proteção que estava ativado, e se eu a soltasse, tudo de ruim poderia acontecer com ela.

- Você também faz isso com todas as pacientes?

- Não... - respondi engolindo seco e lutando contra os meus pensamentos.

- Porque está fazendo isso comigo então?

- Não... não sei... - sussurrei - Quer que eu vá embora?

- Não! Não vá embora...

- Tudo bem... eu fico aqui então...

Ela assentiu sem olhar para mim apertando os seus braços em minha cintura como se procurasse alguma mentira vindo de mim, mas eu estava sendo sincera, sincera com ela e comigo mesma, mesmo com medo eu estava sendo sincera. Ficamos daquela forma durante um bom tempo, até que percebi que ela havia pegado no sono em meus braço, o sol nascia ao longe e se eu não saísse dali logo poderia ser pega por alguém. A deitei na cama de uma forma confortável a cobrindo até o seu ombro mas ainda assim fiquei ali a observando, a pinta que ela possuía em sua pálpebra era linda...

Balancei a cabeça pegando a chave e saindo por fim, respirando aliviada quando me tranquei em meu quarto sem ser pega por ninguém.

1996 (Jenlisa G!P)Onde histórias criam vida. Descubra agora