Whitestone, New York.
No caminho pra casa minha tia finalmente entrou no assunto que ela tanto queria.
- E a Nicola? Tá gostando dela?
- Ela é boa. – me limitei a isso, mantendo os olhos na estrada.
- Certeza que ela não está te incomodando? Sei que não gosta de ter alguém em sua casa.
- Nicola consegue ficar na dela. – alfineto-a.
- E vocês se falam muito? – estranhei a pergunta e olhei para ela rapidamente.
- Deveríamos ter algum assunto? – ela levanta as mãos em "defesa".
- Calma, Demion. Foi uma pergunta simples.
- Uma pergunta simples ou a senhora já quer entrar na minha semana como sempre? – eu estou mais do que cansado das suas intromissões. Só consegui me livrar dela por conta dos problemas de saúde do meu tio. Não me deixa feliz vê-lo assim, mas pelo menos ela foca nele e me esquece um pouco. Ou pelo que estou vendo, nem tanto.
- Tudo bem, Demion. Vou me calar. Apenas gostaria de saber se ela é uma pessoa agradável de conviver ou se você está distribuindo amor e simpatia como é com as outras pessoas. Especialmente com sua família.
Não me dei o trabalho de responder.
- Inclusive sua irmã me ligou... – já veio com tom de acusação.
- Não esse assunto. – cortei rude. – Celine que se vire! – pisei um pouco mais fundo no acelerador na intenção de chegar logo em casa e poder trancar-me no quarto, longe dela.
E foi o que fiz. Assim que chegamos eu fui na cozinha catar algo pra comer e levei pro quarto, me trancando lá. Minha tia pode ficar sozinha.
A madrugada e a manhã de domingo passaram rápido, e logo eu já estava de banho tomado, descendo as escadas e sentindo o cheiro de comida que tomava conta.
Cheguei à cozinha e encontrei a mesa posta e minha tia finalizando o almoço. Puxei a cadeira e sentei, aguardando-a trazer as panelas.
Resolvi comer em silêncio, querendo evitar qualquer assunto chato.
- Vou deixar a cozinha limpa e ir pra casa. – disse ela.
- Tia, não precisa ir correndo pra casa.
- Não, não é isso. Seu tio recebe alta hoje mesmo. Vou buscá-lo e ir para a minha casa. – revirei os olhos discretamente para o drama dela. A vontade que eu tive foi de falar que aqui realmente não é sua casa. Mas fiquei apenas na vontade. Sei que tudo tem limite.
- Boa viagem, tia. – abaixei a cabeça e continuei comendo em silêncio.
Senti meu celular vibrar no bolso com a notificação de uma mensagem.
Era ela.
Nic: Estarei voltando hoje no fim da tarde.
Demion: Te respondo em um minuto!
Terminei minha refeição e lavei a louça que usei.
- Se quiser pode deixar tudo aí que eu limpo quando a senhora sair. Basta guardar as comidas. – e saí correndo sem esperar uma resposta.
Cheguei no quarto, fechando a porta atrás de mim e sentando na poltrona. Tirei o celular do bolso e procurei o contato dela.
- Demion?! – atendeu no segundo toque.
- Oi Nicola. Desculpa a mensagem rápida, eu tava almoçando com a minha tia.
- Ah, tudo bem.
- Porque você vem hoje?
- Não quero te deixar sem mim por mais um dia. – e eu nem fiz questão de segurar o sorriso que brotou em meus lábios. – Digo, sem os meus serviços. – corrigiu, nervosa.
- E vai fazer mais de cinco horas de viagem, pra chegar aqui cansada, dormir mal e vim trabalhar amanhã? Não precisa disso. Dorme aí com sua mãe, vem pela manhã, descansa o restante do dia e vem me ver na terça. – e não me corrigi. Não tinha o que corrigir.
- Eu... não sei... – e então se calou e pude perceber que tinha alguém conversando com ela do outro lado da linha. – Tudo bem. – voltou a falar comigo. – Vou de manhã. Conversamos depois sobre o desconto desses dias em meu salário.
- Ou não.
- Demion... – me repreendeu.
- Conversamos na terça. Tenha uma boa tarde.
- Você também.
- Ah! – chamei antes que a mesma desligasse. – Diga a sua mãe que mandei um beijo.
- Digo sim. Até mais.
- Até. – desaproximei o celular da orelha e fiquei olhando para a tela, esperando ela desligar. Pensei em me oferecer pra buscá-la na rodoviária, mas já sabia que ela ia negar.
Na terça, enquanto eu voltava pra casa, já no início da tarde, lembrei que hoje as coisas teriam de ser acertadas. E não pude deixar de ficar nervoso, e ansioso pra saber qual seria a reação dela.
Entrei em casa e ela não estava pela sala, dei uma olhada na cozinha e nada. Subi as escadas já desabotoando minha camisa, logo entrando no quarto e jogando a maleta na cama. Entrei no banheiro e fui jogando a roupa pelo chão enquanto ligava o chuveiro. Terminei o banho e passei uma toalha na cintura, voltando pro quarto.
- Ai meu Deus. – gritou Nicola. – Desculpa, Demion. – virou de costas e pôs as mãos no rosto. – Eu acabei de entrar pra deixar algumas roupas limpas e não ouvi o barulho do chuveiro. Ai meu Deus...
- Ei, tá tudo bem. – ri um pouco pra mostrar que eu não estava chateado. – Não precisa ficar assim. – ela continuava de costas. – Olha, vou colocar uma roupa e descer pra gente conversar. Pode ser?
- Er... tudo bem... eu... eu vou indo. – e saiu em disparada, enquanto eu achava graça de tudo.
◇ ◇ ◇
- Nicola?! – chamei quando cheguei na sala e ela não estava.
- Aqui. – apareceu na porta da cozinha.
- Vem cá. – sentei no sofá e bati no lugar vago. Ela veio andando lentamente, suas mãos estavam atrás do corpo, mostrando que o que aconteceu no quarto ainda estava deixando-a envergonhada. – Precisamos conversar. – disse quando ela sentou. O mais distante possível.
Ela me encarou com um olhar perdido e ansioso.
- Infelizmente teremos de romper nosso laço profissional. – anunciei.
- O quê? Por que? – seus olhos saltaram e seu tom de voz ganhava um certo desespero. – Eu sinto muito pelo que fiz no quarto, mas juro que isso não vai se repetir. E eu não vou mais tirar tantos dias de folga... – as palavras iam atropelando umas as outras.
- Nicola, por favor. Aquilo não foi nada. E sobre sua folga, eu praticamente te expulsei daqui pra ficar com sua família. – deslizei para perto dela e segurei suas mãos. Ela tentou tirar, mas sutilmente a impedi. – Eu também não acho correto misturar trabalho e romance. Então no momento eu escolho o romance.
- Oi? – levantou uma sobrancelha.
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Nicola (HIATUS PARA EDIÇÃO)
RandomAté que ponto um homem luta pelo direito de amar? Até que ponto uma mulher suporta a dor da omissão? Nicola não acredita no mesmo que eles. Mas terá de acreditar para manter-se viva dentro de si.