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Williamsburg, New York.

Aproveitei aquele inicio de noite para passear pela livraria. Minha mãe me presenteou com um tempo livre depois de insistir em faxinar minha "casa".

Entrei no estabelecimento e fui para a seção de clássicos, pela milésima vez. Folheei alguns livros do qual já estava interessada, mas ainda não tinha o dinheiro para comprar.

- Nic! – ouvi me chamarem. Virei na direção da voz e pude ver Sabrina com dois livros em mão.

- Oi Sa. – nos abraçamos rapidamente. – Como estão as coisas? – entre meu serviço e sua universidade, não conseguíamos manter o contato constante.

- Ah, o mesmo de sempre né?! Cheia de trabalho na universidade e sempre correndo atrás de um estágio.

- Remunerado de preferência. – repeti o que ela sempre falava.

- Vocês já me conhecem tão bem. – rimos.

- Falando nisso. E a Luana, como está?

- Doida como de costume. – disse tirando-me uma risada gostosa. – Ela tá bem. Olha, eu acho, não tenho certeza, que ela tá namorando. Ou quase isso.

- Oi?! – levantei as sobrancelhas em surpresa. – E o papo de "não preciso de ninguém tirando meu foco"?!

- Como diz minha querida mãe: O amor não chega no seu tempo e sim no tempo dele.

- E não tá errada! – notei novamente os livros em suas mãos. – O que você vai levar hoje?

- Tenho que produzir um texto sobre algum meio de comunicação. – virou a capa do primeiro. "As vidas de Chico Xavier". – É um livro brasileiro, que fala sobre um médium muito importante.

- Comunicação espírita?! – e aquilo me perseguia.

- Sim! Assisti a uma palestra sobre o assunto, algumas semanas atrás. Fiquei bem interessada.

- Então deveria ter crescido em minha casa. Minha mãe é espírita.

- Sério? Que legal!

- Legal quando você gosta e não quando tem de ir às sessões meio que forçada. – "meio" era gentileza da minha parte.

Sabrina riu da minha feição de descontentamento.

- Tenho de ir agora. Nos vemos próximo sábado? – disse ela.

- Te aviso. – trocamos outro abraço e ela seguiu para o caixa.

Tomei mais alguns longos minutos a admirar e almejar os livros ali dispostos. Decidi sair dali e tomar um café ou um chá.

Parei numa cafeteria localizada a poucos metros do prédio em que moro. Fiz o pedido, um café descafeinado e um grande sanduíche natural. Essa seria minha janta.

Após pegar minha refeição, dirigi-me para uma das mesas na área externa do estabelecimento. Apreciei o movimento da rua enquanto me alimentava.

Ciclistas, casais, pessoas passeando com seus cachorros. E por um momento me senti sozinha, e não me deu a sensação de indiferença ou tranquilidade que era de costume. Ficou um vazio, um pequeno vazio, mas ainda era um vazio. Eu estava numa cidade enorme e populosa, tendo de viver comigo e só. Minha mãe fazia falta, meu irmão, um cachorro. Uma pessoa. Alguém para realmente me amparar em momentos solitários como este.

E então um pensamento tomou-me. Uma face.

"Isso é loucura!" – pensei.

"Não vá por esse caminho." – fixei na memória. – "Apenas... Não!"

Tomei o último gole da minha bebida, já morna e levantei-me abruptamente. Caminhar seria bom para clarear as ideias.

Por volta das 21h estava a chegar em casa. Passei direto para o banheiro, tirei minhas roupas e deixei-as largada no chão. Entrei no box e liguei a transmissão. A água quente me abraçou e me acalmou. Ela batia na minha nuca e descia pelas minhas costas, levando para o ralo o peso de todo aquela semana. Assim esperava eu.

Saí dali e pus uma roupa confortável. Escovei os dentes e tomei um copo d'água, antes de enfiar-me no edredom. Conferi o celular, que estava conectado no carregador, liguei numa rádio de música clássica e adormeci ao som do piano.

E então acordei. Era um novo dia.

Estava limpando os vidros da sala quando ele apareceu.

- Boa tarde, Nicola.

- Olá, boa tarde. – sorri minimamente.

- Tudo bem? Como foi seu fim de semana? – sentou-se no sofá e tirou os sapatos.

- Não poderia ter sido melhor, minha mãe veio me visitar. – minha voz carregava um ânimo imensurável.

- Que bom, vejo que sente muita falta dela.

- Nossa, algumas vezes chega a doer toda essa distância.

- Sei bem como é. – falou tão baixo que quase passou despercebido.

- Sua mãe mora perto? – seu olhar, de maneira assustada, encontrou o meu.

- Não. – apenas.

- Mas ela vem te visitar?

- Sim. – aquele "sim" demorou de chegar e não pareceu tão concreto. – Como está seu irmão?

- Bem! Logo mais terá uma aliança entre os dedos.

- Sério?! Que boa notícia. – ele parecia um pouco aéreo.

- Ainda acho que é muito cedo, mas ele é um cara romântico, diferente de mim.

- Não quer casar? – e sua atenção estava sendo absolutamente focada na minha pessoa.

- Não tenho certeza. Mas estou pendendo mais para o não que para o sim. Não acredito que seja necessário assinar um papel para validar o meu amor.

Suas sobrancelhas se juntaram, seus olhos me analisando e um mínimo sorriso pôde ser notado no canto dos seus lábios.

- Bom, vou deixar você fazer seu serviço e farei o meu. – inclinou-se para pegar o par de sapatos do chão e logo depois levantou do sofá. – Qualquer coisa que precisar, sabe onde me encontrar.

E meu corpo paralisou em surpresa, enquanto o observei indo pelas escadas.

Ele terminou o assunto. Não me deixou falando sozinha no meio da conversa.

Naquela noite, eu estava sentada na minha cama enquanto mexia no celular, fuçando alguns sites de curiosidades históricas.

Quando senti um toque em minha orelha. Foi como uma leve brisa. Olhei para trás e ao perceber que a janela estava aberta, fechei-a.

A televisão estava ligada, meu celular ainda em mãos e eu seguia lendo o artigo.

A brisa.

Alcancei o controle e cliquei no botão "mute", logo depois bloqueando a tela do celular. Olhei em volta e nada. Levantei da cama e fui até a divisória com a cozinha, olhando de volta para o quarto na intenção de criar uma visão ampla do lugar. O que eu procurava afinal?

E então um frio percorreu a minha espinha. Não esperei sequer um segundo e me joguei na cama, passando a coberta pela minha cabeça e ficando ali paralisada. Eu estava com medo, eu sentia uma presença.

Era a sensação de ser observada, sensação essa que eu sempre tive nas sessões com minha mãe.

Fiquei ali tremendo até cair no sono.

E então eu acordei.

E não era um novo dia.

Nicola (HIATUS PARA EDIÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora