Whitestone, New York.
E então eu acordei.
Faço toda minha rotina matinal, da arrumação de cama ao levantar, até o abrir da porta da casa da família Kingly.
Como o senhor Demion não se encontra presente no período matinal, vou direto para sua suíte. Removo a roupa de cama, as toalhas e tapetes do banheiro e começo a passar o espanador em todos os cantinhos. Depois de varrer e passar um pano bem cheiroso, arrumo a cama com lençóis limpos e disponho uma nova toalha no toalheiro.
Junto os lençóis e as roupas do cesto e os levo para a lavanderia. Enquanto a máquina de lavar trabalha de um lado, eu trabalho de outro. Hora de limpar a área externa.
- Boa tarde, Nicola. – disse Demion ao chegar por volta de 1PM.
- Oh... Olá Senhor. – ele esboçou uma feição que dizia algo como "ainda com esse Senhor?". Retirou um prato do armário e serviu-se.
Foi para seu quarto.
E assim se passaram duas semanas.
Eu arrumava a casa pela manhã, preparava o almoço e cuidava de lavar e passar as roupas pela tarde. Enquanto Demion passava a manhã fora e a tarde preso em seu quarto.
Não sei sua idade, o que faz, se trabalha ou estuda, pra onde vai todas as manhãs. Sei apenas seu nome. E por um momento me bastou.
Numa sexta, no horário em que ele costumava chegar, eu estava passando ferro em algumas camisas dele, na área externa da casa, pois era mais fresco.
- Tudo bem? – ele apareceu do nada.
- Oi Demion, tudo bem sim. Já estou quase terminando aqui.
- Não, não há necessidade em se apressar. – disse ele ao sentar-se em uma das cadeiras de descanso. Olhou a sua volta como se aquele lugar tivesse lembranças marcantes.
- É uma área muito bonita! – falei por fim.
- Já foi bem mais. – baixou a cabeça e olhou para as mãos. – Mas então – disse alguns muitos segundos depois. – O que faz além de cuidar da minha casa?
- Bom, no momento, nada. – ia dobrando as roupas e depositando-as no cesto ao meu lado.
- E você é daqui mesmo? – encostou o dorso na cadeira, relaxando os ombros. Seu olhar permanecia no horizonte.
- Não, sou de Watertown.
- Isso é aqui em New York?
- Sim. Quase 600km daqui. – disse indiferente.
- Nossa! Isso é muito longe.
- Sim, é. – dei uma risada sem humor. – A pior parte mesmo é ficar tanto tempo sem ver a minha mãe. – e quando digo isso posso perceber seu desconforto.
- É, sua mãe... – ele tira o celular do bolso e desbloqueia a tela. Mexe um pouco e levanta num rompante, saindo e me deixando ali sozinha.
Williamsburg, New York - Noite
Tenho duas amigas aqui na cidade, que vieram para estudar. Elas me chamaram para tomar alguns drinks em virtude de ser noite de sábado.
Estou escolhendo uma sandália quando recebo uma mensagem da Sabrina, avisando que já se encontra na porta do meu prédio. Cato a primeira que vejo na minha frente, jogo o celular e a carteira na bolsa e saio.
Entro no carro e seguimos pelas ruas da cidade.
Estávamos sentadas à mesa de um pequeno bar. Nossos programas eram sempre leves, pelo menos quando eu estava junto. Pedimos nossas bebidas e engatamos em alguns assuntos diários.
As meninas me atualizavam das fofocas do âmbito acadêmico, e eu reagia como se conhecesse o dono de cada nome ali citado.
- E seu novo trabalho? – perguntou Sabrina.
- Até que está sendo bem fácil. É apenas um cara, e eu quase não o vejo.
- É coroa? – Luana tinha a tendência de ser a "engraçadinha" do trio.
- Não. – respondi em meio a risada. – Ele não parece ter chegado aos 30 anos.
- Ai meu Deus, ele é bonito? – como sempre, Luana.
- Sinceramente, não reparei.
- Sério?! – e o olhar da Sabrina carregava um "me poupe" bem pesado.
- Ok. Ele é bonito. Maas... É muito esquisito.
- Tipo como? – perguntou ela.
- Tipo todo fechado, na dele. Não gosta de conversar, e quando conversa, levanta sem mais nem menos e vai embora.
- Nossa! Ainda bem que você não tem que vê-lo com frequência. – disse Lua. – Isso iria tornar seu trabalho um verdadeiro trabalho.
Damos risadas despreocupadas. Bebemos e petiscamos. Apreciamos a presença das outras. Vivemos enquanto a realidade não bate na porta.
Porta.
Bato-a atrás de mim ao chegar ao meu atual local de serviço.
Chegando a sala noto algo diferente. Travesseiros e lençóis.
- Bom dia, Nicola.
- Bom dia, Senhor Demion. – ele está usando uma bermuda de algodão e um capote com o zíper aberto.
- Deitei para assistir a um filme e adormeci aqui mesmo. - descansa um braço no encosto do sofá e na outra mão segura o celular.
- É um bom hábito, pena que não posso mantê-lo aqui. – disse enquanto apanhava e dobrava um dos lençóis.
- Por qual motivo? - questionou-me com as sobrancelhas arqueadas.
- Moro em uma kitnet e a TV fica de frente para a cama. Não há sofá.
- Isso deve facilitar muito. Evita a bagunça desnecessária.
- Minha mãe que o diga. – falei ao rir fraco.
- Eer... – passou a mão na nuca de forma desconfortável. – Eu vou... – e saiu.
Eu não entendia seu comportamento. Mas de qualquer forma, não cabia a mim a necessidade desse entendimento.
Nota final: Estou postando capítulos curtos na intenção de deixar a leitura mais leve e rápida. Mas gostaria de saber se isso é do agrado de todos, então espero um retorno.
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Nicola (HIATUS PARA EDIÇÃO)
AcakAté que ponto um homem luta pelo direito de amar? Até que ponto uma mulher suporta a dor da omissão? Nicola não acredita no mesmo que eles. Mas terá de acreditar para manter-se viva dentro de si.