XV Outubro 2010

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Sua vida estava mais divertida agora que tinha amigos e um namorado, Anderson não era do tipo carinhoso, mas sabia cuidar bem de sua garota, todos os dias a levava e buscava da escola para evitar que ela sofresse algum tipo de agressão. Nesse mês que passou Cassandra parecia que sempre havia pertencido àquele grupo fazia tudo com eles, inclusive assistia as brigas de gangue, estava sempre observando os movimentos e fraquezas de cada um, mas era algo que ela mantinha segredo, infelizmente para Marcos não era fácil, pois quanto mais tempo passava ao lado dela, mais apaixonado ficava, tendo muita dificuldade em disfarçar seu olhar. Anderson sabia do sentimento do amigo e se sentia incomodado com o que acontecia, mas não queria abrir mão dela, não sabia precisar o sentimento que tinha, mas cada vez que a tocava era tomado por uma imensa excitação talvez a "estranheza" da garota alimentava seu vício em adrenalina, ela não havia mudado tanto desde que ele a conheceu, continuava sendo muito calada, com uma expressão distante e era raro as vezes que sorria, mas quando fazia deixava-o encantado, foram pequenas as coisas que mudaram, agora se vestia melhor, parecia mais saudável e acima de tudo não vivia cheia de hematomas.

Certo dia enquanto o casal estava indo encontrar o restante do grupo encontraram uma caixa com vários filhotes de cachorros dentro, Anderson ficou encantado com os animais, porém Cassandra resolveu não se aproximar muito.

__ Ei Cass, eles não são fofos?

__ São.

__ Por que não leva um para casa? você está sempre sozinha, tenho certeza de que a minha sogra não vai ligar.

__ Não quero.

Ela parecia mais indiferente que o normal, Anderson pegou a caixa com os filhotes não deixaria os pobrezinhos ali.

__ Bom... Vou levar para casa do Fábio tenho certeza de que o irmão dele que é veterinário vai arranjar um lar para eles, se eu pudesse ficaria com todos, mas já tenho dois e minha mãe iria me matar se levasse mais algum bichinho para casa.

Eles permaneceram quietos o restante do caminho, ao chegar na casa de Fábio, Anderson deixou os filhotes com o amigo que parecia muito feliz em recebê-los, logo colocou comida e água para os animaizinhos e ligou para o irmão avisando que Anderson havia achado eles, embora o amigo tenha cuidado dos cães, ele se sentia um tanto incomodado pela postura da namorada ela era indiferente com várias coisas, mas aquele silêncio não era normal, antes que tivesse tempo de preparar o terreno entender a reação dela, Fábio, que era mais sem noção tocou no assunto, sem perceber o clima estranho.

__ Cass você não gosta de cachorros?

Ela abaixou a cabeça pensando no que deveria responder.

__ Não sei, não gosto e nem desgosto. 

__ Por que não ficou com um? Eles deixam a casa tão animada e estão sempre com a gente, eu mesmo tenho três.

__ Hum, não acho que está certo, eles vão embora sim, se acharem alguém melhor.

Anderson e Fábio se entreolharam um pouco confusos com a resposta da garota.

__ Eu já tive um cachorro, quando era pequena, percebi que era diferente por causa dele.

__ Como assim? – Perguntou Anderson

__ Ele morreu, mataram ele... O que você faria se matassem algum bichinho seu?

__ Eu enlouqueceria, acho que acabaria com o filho da mãe, mas peraí não foi você matou o cachorro né? – Perguntou Fábio assustado.

__ Não, por que eu faria isso?

__ Sei lá, vai saber.

Fábio respondeu um tanto sem graça, não queria admitir, mas em diversas ocasiões a frieza de sua amiga o assustava. Ela percebeu o olhar apavorado do rapaz e um tanto sem graça olhou para cima e suspirou.

__ Meu vizinho tinha a mesma idade que eu na época tínhamos 6 anos, ele sempre quis um cachorro, mas os pais dele não o deixavam ter um, mas um dia ele levou um cachorrinho para casa, era um vira-lata caramelo um filhotinho devia ter uns 2 meses, é claro que seus pais mandaram ele se livrar do animal, ele colocou o cachorrinho no meu quintal, achou que ele pensou que eu não saberia que o cão era dele, é claro que eu cuidei do cachorro, ele dormia comigo toda noite, dei o nome de Totó, onde eu ia ele ia atrás de mim, acho que o menino tinha raiva de ver minha relação com o cachorrinho ou sei lá, na época morávamos mais próximo do lago que tem na rua 15 e um dia o Totó fugiu, minha mãe passou a noite toda procurando ele, mas no dia seguinte, achamos seu corpinho jogado no meu quintal todo molhado, ela imaginou que ele provavelmente havia se afogado no lago, pelo menos foi a desculpa que ela deu. Eu não imaginava que minha mãe ficaria triste da maneira que ficou, chorou muito e pela primeira vez gritou comigo "Porque você não chora, não está triste, ele te amava, porque você é assim?!", ela falou várias coisas, acho que pela primeira vez ela desabafou tudo aquilo que sentia por mim, não acho que ela chorava pelo cachorro, mas por desgosto da sua vida ou algo assim.

__ Credo Cass, para de dizer essas coisas, tenho certeza de que sua mãe estava abalada.

Fábio tentou amenizar o peso da história, enquanto Anderson permanecia em silêncio, ele analisava a história com cuidado sempre achou estranha a relação que as duas tinham, mas não imaginava que fosse algo tão complexo.

__ O rosto dela demonstrava muita raiva e ela era direcionada para mim, disso eu tenho certeza. Depois do ocorrido ela me passou em diversos médicos e constatou que realmente eu não sou normal tenho uma espécie de síndrome com um nome estranho.

__ E por que você acha que foi o vizinho que matou o cachorro?

__ No dia que achamos o Totó ele ficou rindo de mim dizendo que agora eu estava sozinha de novo, acredito que foi ele quem o matou.

__ E o que sua mãe fez?

__ Nada, a cidade já odeia minha mãe e eu, o que ela podia fazer?

__ Tô ligado, por causa daquela treta com o médico que sua mãe acusou. – Disse Fábio sem pensar muito.

Anderson ficou muito incomodado com o comentário do amigo, todo mundo sabia dessa história, mas era algo que eles não sabiam até onde era verdade ou não, ele não sabia o quanto aquilo poderia incomodar Cassandra, por isso, nunca tocaram nesse assunto na frente dela, não entendia como o amigo podia ser tão descuidado.

__ Depois disso o menino sumiu, ficou desaparecido por uma semana, acharam ele boiando no rio, quase na divisa com a outra cidade, acredito que a correnteza o levou o corpo e que provavelmente ele estava brincando e se afogou.

__ Quando pensei que a história não podia ficar mais macabra você solta essa Cass, moro aqui a vida inteira e não lembro disso. – Disse Fábio, com um sorrisinho tentando esconder o medo.

__ Provavelmente porque você tem a mesma idade que eu, quem iria contar isso para uma criança. É só você pesquisar na internet que acha o caso, ele foi considerado acidental.

O irmão de Fábio havia acabado de chegar, resgatando seu irmão da conversa macabra e indo direto olhar os filhotes.

__ Eles parecem bem, vou levá-los para uma ONG que trabalha com resgate de animais, não entendo por que as pessoas são tão cruéis, eles são tão bonitinhos.

O restante do dia correu como o de costume, Marcos e André chegaram e foram para o galpão tocar. Foi um tanto diferente lembrar das coisas do passado e é claro que ela não podia contar tudo o que aconteceu, como por exemplo contar que foi ela quem desafiou o menino a nadar chamando ele de medroso todas as vezes que ele se recusou ou não tinha coragem de ir para longe da margem, contar que ficou vendo a criança se debater na água pedindo socorro sem mover um músculo para ajudá-lo e é claro que não podia contar que não sentiu absolutamente nada ao ver o menino finalmente perdendo as forças e afundando do olhar vazio de rapazinho com toda uma vida pela frente afundando diante dos seus olhos. Se não fosse esses filhotes talvez nem lembraria mais do cachorro que um dia apareceu em sua vida, mas com certeza lembrava da expressão de medo dos olhos daquela criança.



After Midnight - Depois da meia noiteOnde histórias criam vida. Descubra agora