After Midnight - Depois da meia noite

XXVII Novembro 2012

Você meu caro leitor deve estar se perguntando o motivo de uma passagem de tempo tão grande, pois lhe contarei, durante o período no manicômio judiciário, não tinha muito a ser dito exceto que cada dia que nossa protagonista passou naquele lugar se tornou cada vez mais perspicaz com coisas que ela não percebia antes, agora ela era alguém capaz de "ler" as entrelinhas do outro e com essa informação podia manipular as pessoas ao seu redor sempre que fosse conveniente, primeiro foi Bianca, depois Carmen, a incendiária e até mesmo o próprio Antony. Podemos dizer que ele não tinha a natureza de uma pessoa má, mas na primeira vez que bateu os olhos nele ela podia ver suas inseguranças, medo e o desejo de ser alguém importante e não pode deixar de "brincar" com o homem.

Ora veja só, uma pessoa que passa a vida inteira ouvindo o quão ela é insuficiente, incapaz ou inútil, quando ouve um breve elogio seu caráter pode ser modificado aos poucos. A vida dele foi assim desde que nasceu mesmo tendo um lar bastante comum, pais de classe média que trabalhavam loucamente e por isso acabavam não prestando atenção no filho, devido a isso sua personalidade se tornou insegura, aprontava na escola com a intenção de receber atenção mesmo que ela fosse negativa, anos depois quando conheceu sua esposa pensou que alguém finalmente iria prestar lhe dar a atenção merecida, mas isso durou apenas no calor da paixão, 3 anos depois o casal teve um filho e sua esposa que um dia foi tão amorosa e atenciosa agora negligenciava o casamento, vivia reclamando da vida que perdeu e de como se arrependia de ter engravidado e casado com um inútil como ele. É claro que apenas isso não seria capaz de mudar alguém, inúmeras pessoas ao nosso redor têm vidas semelhantes e nem por isso viram criminosas não é mesmo? Mas para o infortúnio de Antony seu emprego bem remunerado colocou Cassandra em sua vida. Ela foi muito discreta, não demonstrou interesse no homem, agia como as outras internas como se estivesse dopada o tempo todo, mas na verdade ela não tomava seus remédios fazia muito tempo, naquele lugar precisava que sua mente funcionasse 100%.

Ele era o responsável pelo setor em que ela se encontrava, vez ou outra notava que a garota o observava e não pode deixar de reparar que mesmo com aquela imensa cicatriz e o cabelo raspado ela era muito bonita, aos poucos as conversas curtas que se limitavam à ordens se tornaram mais longas a medida que ela falava a respeito de como ele era atencioso ou como era dedicado ao trabalho que nenhum outro funcionário poderia se igualar a ele; é claro que essas conversas eram secretas, desde o incidente da escada nenhuma interna poderia ficar sozinha estavam sempre com a supervisão de alguém, o segundo andar do lugar foi interditado para que ninguém mais precisasse usar as escadas apenas os funcionários, o que fazia com que ele passasse muito tempo ao lado não só dela mas de outras garotas também, aos poucos Cassandra foi entrando em sua mente como uma aranha que arma cuidadosamente sua teia para capturar sua presa e brincar com sua refeição, ela o convenceu que ele poderia ficar com quem ele quisesse naquele lugar, ninguém iria acreditar nas garotas afinal elas eram loucas e ele como um homem saudável precisava aliviar seus desejos, é claro que a primeira foi a própria Cassandra, ela não desfrutou daquilo, mas sabia que era um pequeno sacrifício para um bem maior, enquanto ele se extasiava com o corpo jovem da garota ela não sentia absolutamente nada, apenas pensava qual seria seu próximo passo.

Antony não sentia culpa, em casa seu comportamento mudou tratava a indiferença de sua esposa com mais indiferença, vez ou outra quando ela reclamava de seu caráter ou de sua insatisfação com a vida que levava, ele a lembrava de que ela já não era mais o que um dia foi, e que até mesmo as loucas do trabalho eram mais interessantes que ela. Aquilo foi um choque para mulher e o casamento que já não era bom ficou ainda pior, queria deixá-lo, mas não tinha dinheiro e nem para onde ir então acabou suportando o gênio do marido em silêncio.

Foi precisamente um ano trabalhando naquele plano engenhoso preparando o pobre homem para se tornar um monstro assim como ela, era revigorante ver aquele coitado fazer todas aquelas atrocidades ele podia se sentir o melhor dos homens ao dominar aquelas mulheres, mas para Cassandra o coitado era apenas uma marionete muito bem-criada. Geralmente ela era uma pessoa paciente e gostava de disfrutar do sofrimento das outras, mas estava cansada queria mais uma vez sentir aquela explosão de sentimento que outrora sentiu, sonhava com isso noite após noite, logo sua dor na região da cicatriz havia voltado o que significava que precisava fazer a única coisa que aliviava seu problema. Não foi muito fácil convencer Antony que precisava se livrar de uma das garotas, pois ela estava grávida, ele não queria fazer nada de mal a menina no começo, passou noites em claro pensando em o que deveria fazer, então Cassandra veio com o plano do incêndio se deixasse com Carmen alguma coisa para iniciar um incêndio o resto seria fácil, ela mesma faria o serviço contanto que ele desligasse o equipamento de segurança do local incluindo as câmeras e drogasse os enfermeiros, pois foi o que ele fez o que ele não esperava era que a garota com o rosto gentil fosse batizar a sua própria bebida, ela usou os próprios medicamentos que deveria ter tomado ao longo dos dias e não tomou, então abriu o gás da cozinha colocou quem julgou ser merecedor de continuar vivendo em um quarto que sabia que devido a trajetória do gás entre outras coisas seria o último a queimar orientou as detentas a irem para o tal quarto e depois foi só esperar a Carmen fazer sua parte dando a ela um isqueiro e coisas inflamáveis para "brincar". Pouco depois metade do prédio explodiu o barulho, tremor e a quentura tomaram conta do lugar, dentro da sala dois enfermeiros escolhidos para serem salvos voltaram a consciência, estavam meio letárgicos devido a medicação, mas tentavam ajudar as garotas apavoradas, é claro que Cassandra atuava agachou até o canto da sala com as mãos nos ouvidos, repetindo a frase "tudo vai ficar bem", pouco depois escutaram o barulho de diversas sirenes, para sorte de todos o plano havia funcionado, ninguém ali sabia quem estava por trás desse incêndio, Bianca assim como as outras acreditavam que Cassandra tinha ajudado a todos, pois ficou calma e orientou as outras para pegarem os enfermeiros que podiam, já os homens em questão só lembravam de Antony servindo um suco na hora do jantar, todos os depoimentos e provas batiam, portanto o culpado era o enfermeiro, que se matou junto com a amante e levou metade do prédio consigo, naquela noite 38 pessoas morreram naquele setor em que ela ficava: 25 detentas, 8 enfermeiros e 5 seguranças, sobreviveram 9 detentas incluindo Cassandra e Bianca e dois enfermeiros, 250 morreram com a explosão do prédio, 100 nunca tiveram seus corpos encontrados, o total de sobreviventes foi de apenas 150 pessoas, o evento ficou conhecido como uma grande tragédia. Ela por sua vez estava satisfeita tudo havia saído conforme ela planejava, todos os jornais só falavam disso, sua coragem foi reconhecida e assim conseguiu voltar para as ruas, agora que estava livre poderia ser quem ela quisesse.

__ Senhor seu filho pediu permissão para procurar o nome de uma garota entre as vítimas desse incêndio, o que devo fazer?

__ Quem ele procura?

__ Justamente a garota que salvou alguns sobreviventes.

O homem grisalho tomava um uísque enquanto olhava para o nada, refletiu durante algum tempo antes de responder.

__ Diga a ele que ela morreu, não quero que ele descubra em hipótese nenhuma que essa garota está viva e muito menos livre, tenho muitos planos para ele e com toda certeza isso poderia atrapalhar, diga que ela era uma das vítimas do enfermeiro.

O empregado saiu em silêncio, não queria fazer isso, pois pode ver a cara de desespero do garoto ao ver a notícia do incêndio no jornal, fazia dias que ele só falava nisso, implorando para ver as notícias, não comia ou dormia de tanta preocupação.

__ Senhor Anderson, sinto muito...