Cap. 10 - Emoções Reprimidas II

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Pov Lauren Jauregui
Long Beach, Califórnia
Dois dias depois

Estou sozinha no estacionamento. A chuva cai sobre mim com tanta força que deveria machucar, mas não sinto dor. Não sinto nada. Vazio. Uma casca de corpo incapaz de sentir qualquer emoção.

Baixo os olhos para meu terno feminino azul-marinho, o que usei para o baile de boas-vindas com a Emily, e está totalmente ensopado, grudado no meu corpo. Apertando os olhos, rezo para um Deus no qual não tenho mais certeza se acredito, implorando-lhe que faça desaparecer a imagem que acabou de ser gravada na minha mente vinda das profundezas da minha memória.

Não adianta. Fechar os olhos só faz com que a imagem dela, deitada ali, fique ainda mais vívida. Forço-os a se abrirem e irem atrás do que vejo à distância, mas não adianta.

As visões de Emily ali deitada, tão quieta, tão tranquila, me consomem. Sua pele, normalmente brilhante e bronzeada, está pálida e sem vida, o cinza tomando o lugar do bronze e do tom rosado do sol.

Meu corpo começa a tremer, os soluços rasgando através de mim mesma antes das lágrimas começarem a cair. É a primeira vez que choro desde que tudo aconteceu.

O tempo passa, mas não tenho ideia do quanto fiquei lá parada, deixando dias de emoções reprimidas me lavarem. Eventualmente, a forte chuva começa a diminuir, e minhas lágrimas seguem o exemplo.

— Lauren? — A voz do meu pai é baixa e cautelosa. É o mesmo tom tímido que todos têm usado para falar comigo nos últimos dois dias. Eu não respondo. Eu mal disse duas palavras para qualquer um desde que tudo aconteceu.

— Volte para dentro, filha. O pastor vai começar em breve.

Minha mãe espera do lado de dentro da porta; o mesmo olhar de preocupação encravado em seu rosto desde que me acordou naquela manhã. A manhã quando tudo mudou. Ela coloca o braço ao meu redor e juntas caminhamos vagarosamente até a sala. O cheiro de flores paira no ar à medida que nos aproximamos, me deixando nauseada.

A Casa Funerária Jefferson é grande; as três salas separadas para a visitação geralmente têm serviços simultaneamente. Mas hoje o espaço inteiro é para Emily. As portas retráteis entre as salas estão abertas, assim há espaço para as centenas de pessoas se sentarem. Mesmo assim não é o suficiente. As pessoas fazem fila na sala, de ponta a ponta. Família, amigos, professores, estranhos. A fila para visitar o caixão vai até a porta da frente e metade do quarteirão.

Todos estão aqui, exceto o motorista, que ainda está lutando pela própria vida no Hospital Universitário de Long Beach. A frente do carro levou o golpe do impacto quando Dylan desviou de repente para evitar bater em um caminhão que estava vindo na direção contrária. Surpreendentemente, os outros passageiros saíram apenas com pequenos machucados e arranhões.

Um burburinho baixo começa assim que eu entro. Cabeças viram em nossa direção. O pastor se posiciona em frente à sala, silenciando o barulho sem palavras. Ao poucos, meus pais me levam até a primeira fila. Sinto todos os olhos da sala me observando, mesmo sem levantar o olhar.

Três cadeiras nos esperam. O Sr. Bennett insistiu para que sentássemos com ele. Ele me disse que eu era a família de Emily tanto quanto ele. Achei que o peso da minha culpa poderia ser o suficiente para me fazer cair no chão.

À nossa frente, uma pequena mesa foi colocada ao lado do caixão de madeira ornamentado com um tributo à vida de Emily. Um santuário.

Quatro fotos emolduradas mostram a vida da garota que eu amava: ela e os pais na primeira comunhão. A foto do anuário do ensino fundamental. Eu e Emily vestidas para o Baile de Formatura do ensino fundamental. Mas é a última que me toca, que abre um buraco bem no meio do meu coração já destruído. Emily andando em sua bicicleta Schwinn amarelo- canário. As lembranças me inundam... o dia em que a conheci, a primeira vez que ela me deixou andar na bicicleta. Ela no guidão falando sem parar enquanto eu pedalava nos levando até o parque onde brincávamos nos balanços durante horas. Isso acaba comigo. As lágrimas escorrem pelo meu rosto incontrolavelmente, meus ombros sacolejam, cada respiração entre soluços queimando minha garganta.

O pastor começa a falar. As palavras fluem de sua boca, mesmo assim eu não ouço nada do que ele diz. À minha esquerda, meu pai fica firme, apertando a mão sobre meus ombros. À minha direita, minha mãe soluça baixinho. Nem tenho forças para confortá-la.

Longos minutos se passam, o nevoeiro onde estou me tirando da realidade, até que um verso me chama a atenção.

"Não podemos julgar uma biografia pela sua espessura. Nem pelo número de páginas que ela tem. Devemos julgá-la pela riqueza de seu conteúdo. Às vezes, aquelas inacabadas estão entre as mais eloquentes. Não podemos julgar uma canção pela sua duração. Nem pelo número de notas que contém.
Devemos julgá-la pela maneira que ela nos toca e penetra nossa alma. Às vezes, aquelas inacabadas estão entre as mais belas. E quando algo nos enriqueceu a vida. E quando a sua melodia perdura em nosso coração. Ela está inacabada? Ou é eterna?"

                         **************

Ao lado da cova, horas depois, fico observando a fila interminável dos enlutados colocarem uma rosa sobre o caixão de Emily antes de irem embora. Sem lágrimas, estou anestesiada, por dentro e por fora. Olho, mas não enxergo. Toco, mas não sinto.
Um tempo depois, apenas minha família e os pais de Emily permanecem em volta do buraco no chão onde o caixão de Emily repousa ao lado de uma pilha de terra. Meu pai me cutuca de leve, falando baixinho:

— Vamos lá, filha. Precisa dizer adeus e deixar que os pais de Emily façam o mesmo.

O Sr. Bennett olha para mim e depois para a Sra. Bennett. A Sra. Bennett assente, uma única lágrima escorrendo pelo rosto.

— Não, por favor, acho que devemos ir. Emily gostaria que Lauren fosse a última aqui. Ela era minha filha, mas o coração dela pertencia à sua filha.

Colocando a mão sobre meu ombro e apertando-o ao passar por mim, a voz do Sr. Bennett está embargada quando ele diz baixinho:

— Diga adeus, filha.

Meus pais, juntamente com os pais de Emily, caminham até os carros que estão esperando.

Finalmente sozinha, fico em pé olhando fixamente para a pilha de rosas em cima do caixão. As últimas palavras de Emily me inundam, a primeira lembrança que me permito ter desde que tudo aconteceu:

"Você vai se arrepender amanhã, Lauren Jauregui. E sabe de uma coisa? Já será tarde demais."

Caindo de joelhos sobre a grama enlameada, eu choro. E choro e choro. Até não haver mais lágrimas.
*
*

CAMREN: Peças do Destino (G!P)Onde histórias criam vida. Descubra agora