Seis

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Karol S.

Eu não aguento mais!

São dois dias nesse inferno e tudo o que eu consigo pensar é em como farei para sair dali, voltar pra capital, pra minha vida, pros meus amigos, meu namorado...
Não é possível que estejam mesmo dispostos a me manter naquele lugar servindo de empregada. Não posso acreditar nisso!

Tia Malu havia me tirado da cama ainda mais cedo e me fez ir preparar café para os hospedes, logo depois me mandou arrumar os quartos.
Por Deus! Não tinha fim!

E eu não entendia porque ela insistia tanto em me colocar para fazer coisas desse porte, porque sempre acabava mal.
Metade dos hospedes reclamou do café e a outra metade, a que conseguiu tomar tudo, ficou com ânsia de vômito e acabou desistindo do passeio do dia.

Estava nítido que eu ia estragar a reputação da pousada e não era nem por querer. É que eu, simplesmente, não tenho jeito pra ser serviçal de ninguém. Não nasci pra isso.

─ Dia ruim?

Levantei a cabeça quando Bruno entrou na cozinha pela porta do quintal, retirando as luvas sujas de terra e as colocando na mesinha do canto.

Eu estava tentando cortar aquelas malditas cebolas sem chorar, mas até nisso eu fracassava, além do mais, meus dedos estavam machucados, principalmente por causa desses produtos de limpeza que faziam minha pele descascar.

Tia Malu prometeu comprar luvas novas, mas não pareceu se lembrar disso.

─ Se fosse um dia só era bom. – Funguei. ─ Todos os dias nesse lugar parecem iguais.

─ A Ilha é bem pacata mesmo, mas você se acostuma.

─ Não quero me acostumar com isso, Seu Bruno. ─ Olhei pra ele por cima do ombro. ─Eu quero ir embora.

─ A dona Malu está gostando muito da sua estádia por aqui. Na verdade, ela está ansiosa desde que recebeu a noticia que você viria.

─ Ela está assim porque está tendo mão de obra de graça pra usar e abusar, isso sim.

Escutei quando ele deu uma risadinha.

─ Não acho que acredite nisso que acabou de falar, porque está óbvio que gosta muito da sua tia. Um carinho que é bem recíproco, diga-se de passagem.

Terminei de cortar as cebolas – em pedaços bem pequenos como a minha querida tia pediu – então as despejei dentro de um recipiente de plástico vazio.
Deixei a faca sobre a pia e fui lavar as mãos.

As lágrimas ainda desciam pelo meu rosto por causa da acidez da cebola.

─ Eu gosto muito dela. – Funguei. ─ Mas aqui não é o meu lugar.

─ Já ouvi falar que o lugar da gente é onde reside nosso coração.

Desliguei a torneira e fiquei encarando minhas mãos molhadas, pensando.

Sempre tive a forte sensação de que meu coração nunca esteve ligado a nada, a não ser o meu irmão, mas quando ele se foi, percebi que o vazio que ele deixou se propagou para todos os lados.
Eu não era nada além de nervos que se esticavam ao extremo, dentro de um corpo oco.

Meu coração não tinha função sentimental. Às vezes eu até me questionava o motivo pelo qual ainda batia.

─ Não sou de sentimentalismo. – Virei-me para Bruno e tentei esboçar um sorriso gentil. ─ Sou uma mulher prática e acredito que meu lugar é onde posso ter conforto e uma internet que funcione, entende? – Abanei a cabeça. ─ É só nisso que acredito.

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