Capítulo Seis

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Uma vez meu pai e eu saímos de nossa casa sem nenhum destino, como estávamos fazendo agora mesmo. Ele me levou em alguns pontos na cidade que eu nunca conheci. Ele me apresentou um colega dele que fazia malabarismo em um circo de sua família. Eu me lembro de quando ele fez um palhaço e eu não parava de rir. Aquela risada naquele dia nunca saiu da minha cabeça, porque mesmo parecendo tão tosto eu sorri, porque eu era uma criança tosca, mas mesmo assim uma criança. Na volta para casa eu pedi um desejo ao meu pai. Eu ainda me lembro como ele sorriu e atendeu meu pedido com mais risadas; eu disse que queria que nossa família fosse circense como a do amigo dele. No dia seguinte me deparei com meu pai na porta do meu quarto vestido de palhaço.

Aquela sensação era a melhor das melhores. Quando eu acordava e meu pai estava diante de mim, alisando meus cabelos, eu me sentia especial e até mesmo único. De todas as maneiras possíveis meu pai me ajudava a se animar, a levantar todas as manhãs sorrindo e cantando. Sendo uma criança comum, conhecendo o direito de sorrir. Eu esperava que quando crescesse eu e meu pai ainda fossemos grandes amigos, que todas àquelas horas de aventuras se multiplicassem ainda mais. Que fossemos muito felizes juntos.

Não tenho mais isso.

Nenhum outro pai vai acrescentar aquela sensação diferente de quando meu pai estava vivo. Não vai consertar oque está quebrado, o jeito e jogar fora pela janela. E Christian Normal era exatamente o cara oposto ao que eu tinha como um "pai" em minha cabeça. Mas eu não o conheço totalmente. Espero estar errado.

Às nove da manhã ele chegou com seu BMW na porta de nossa casa, vestia um terno elegante e uma gravata vermelha - minha mãe adorava quando meu pai usava gravatas vermelhas - ele bateu a porta e eu atendi. Não foi exatamente o tipo comum de se atender as pessoas. Quando abri a porta me retirei logo em seguida deixando oque ele estava prestes a falar trancado em sua garganta. Engoliu aquelas palavras.

Tá, eu sei, esse meu jeito de distanciar pessoas acaba sendo algo incomum. Mas não gosto de desconhecidos, e isso talvez explique o porquê eu sou assim. Não quero saber de compartilhar seu dia, ou seus segredos com um cara que acabei de conhecer, simplesmente não se encaixa.

- Então Tommy, finalmente conheceu o fanático Kian? - perguntou ele, quando estávamos dentro do carro. Eu estava sentado atrás com o Pubi pendurado pela janela. Minha mãe ia à frente com ele.

- Você o conhece? - perguntei, nem tanto impressionado.

- Ele é um cara bacana. - disse Chris. - Estou cuidando do caso dele. Uma doença rara, mas não tanto problemática, levando em conta os devidos cuidados. E ele é brilhante.

- E qual é a do fanático?

Chris riu.

- Ele é muito fã de futebol. Todas as vezes que ele passava uns dias no hospital, eu tinha que ficar com ele todas às vezes na hora do jogo. Ele tem pulmões para gritar! Ele tem!

Não resisti a rir, mamãe também rio. Aquele sorriso que demonstrava certo interesse em saber das coisas. Logo que avaliei essa questão ela se virou para mim.

- Quero conhecer esse seu amigo. Pelo modo como Chris fala nele, deve ser brilhante.

- É. - segurei o Pubi que latia para o vento, e tentando evitar que ele saltasse. - ele é mesmo.

Viramos uma rua com a praça ao lado. E vi quando a estrutura de J. Q. Robins reluziu a luz do dia. Como era fascinante tudo aquilo, como era incrível a existência de uma simples escultura no meio de um mar de gente. A maioria não se importava com tudo isso, alguns olhavam e passavam os olhos, como se a beleza se desmoronasse de vez. Mas eu vi, eu sorria, eu admirava.

KianOnde histórias criam vida. Descubra agora