Capítulo 11

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O som de marteladas interrompeu o sono de Anahi. 

Havia tam­bém uma serra elétrica, o farfalhar de folhas plásticas e risadas. Risadas femininas.

Ela se espreguiçou e pensou numa boa xícara de café, mas lem­brou que tomava café em excesso. No SPA Serenidade, alguém lhe dissera que reduzir a cafeína a ajudaria a controlar os ataques.

O ataque! Alfonso o testemunhara!

E ele estava lá embaixo, na cozinha da casa de sua irmã. Na casa da família. Na cozinha de sua mãe. Era estranho pensar nela agora, lembrar como evoluíra da existência hippie para uma vida requintada e cercada por objetos de arte.

Não entendia por que os pais haviam ido morar no Arizona. Giovanna e Bill ficaram com a casa, com a chuva e a umidade, enquanto sua mãe e seu pai iam morar no condomínio elegante que haviam escolhido. Seu pai era alérgico, e Anahi aceitara essa desculpa na época da mudança, mas a verdade era que raramente o viam, exceto no Natal, quando o casal aparecia bronzeado e sorridente.

Na infância, Anahi tivera a constante sensação de só poder con­tar com a irmã. Os pais estavam sempre muito ocupados com a própria vida. O pai era obcecado pelo trabalho, e a mãe também vivera um período de obsessão com seu emprego na televisão. Por que não se haviam instalado em Seattle? Sempre falavam sobre como desejavam dar uma vida melhor às filhas e como amavam a vida perto da água.

Teria sido melhor viver mais perto da cidade, passar menos tempo em trens e carros.

Mas agora a história era outra. Compreendia por que os pais se haviam apaixonado pelo chalé na praia, com as montanhas emol­durando a paisagem. Havia paz ali. E, francamente, ela e Giovanna tiveram uma infância maravilhosa brincando na praia, caminhando pela região sem medo da violência ou de outros riscos urbanos, e colecionando recordações especiais.

Jamais esqueceria a noite em que elas descobriram que o ba­lanço de corda poderia lançá-las na água, além do deque, na maré cheia. Aquela brincadeira passara a ser a favorita do verão. Carly já havia experimentado?

Anahi encontrou Alfonso na varanda do fundo da casa.

— Precisamos conversar sobre o projeto. — ele disse ao vê-la.

— Já percebi. Problemas?

— Não exatamente. É que, às vezes, quando colocamos tudo no papel, o estresse diminui. É sempre muito saudável encarar os fatos.

— É impressão minha, ou as coisas não estão progredindo como eu esperava?

— Não, a...

O toque do celular de Anahi interrompeu a conversa. Onde deixara o aparelho? Seguindo o som, ela encon­trou a bolsa sobre o refrigerador. O identificador de chamadas exibia o número da Pitman Toys.

— Alô?

— Anahi?

— Ah, oi... Irmã. — Ela olhou para Alfonso, que não se moveu. Aparentemente, estava mesmo disposto a ouvir a conversa.

A voz de Giovanna soava diferente.

— Olá, Anahi. Como vai minha filha?

— Bem. Ocupada com um projeto. Isso a está mantendo longe de confusões. Lavar a roupa faz parte de suas obrigações.

— Ah, uma arte perdida... — Giovanna riu.

— Como vão as coisas por aí?

— Estou me divertindo muito! Não imaginava como o trabalho em uma fábrica de brinquedos podia ser interessante.

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