Depois de um dia confuso e difícil, Type finalmente descansa em sua aconchegante cama. O mundo gira inteiro na mente, a sensação de que tudo é fumaça, névoa solta sobressaindo-se em coisas. Não, não estava drogado. É que às vezes se sentia fora do plano, fora de si, como se não estivesse conectado com o próprio corpo.
Se lembrou da sensação que teve mais cedo naquela noite, de como pôde sentir o corpo por inteiro, mesmo não tendo controle pelas funções do mesmo. Foi tão intenso. Respirou fundo e fechou os olhos por segundos, tentando reproduzir novamente, mas nada aconteceu. Não se sentiu pertencente ao corpo, só a mente vagando e carregando-o junto. Era verdade que temia ser uma das várias pessoas que sofriam de desrealização e despersonalização, como se não pertencesse ao mundo real e não soubesse quem são realmente.
Às vezes era como se não estivesse presente em vários momentos da sua própria vida, como se não fosse ele mesmo ali. Incontáveis memórias vazias em que olhava para aquele garoto, naquele exato momento, e desconhecia-o. Estranhava e a todo momento a mente dizia não ser ele, não ter sido ele a dizer aquele "bom dia" a um estranho, por exemplo. Coisas tão simples que não se encaixavam. Type por vários momentos em sua vida se viu perdido no próprio espaço, desconhecendo e estranhando o momento. Como se não fosse real nem dele. A mente tão cheia ou vazia lhe tirava do plano, era como se o corpo estivesse lá e a alma vagasse por cima.
Respira fundo decepcionado. Estava ficando louco, não sofria de nada disso, eram momentos apenas, concluiu. Procuraria um psicólogo assim que tivesse dinheiro para tal, não pensaria nisso agora, não importava. Só precisava encontrar o garoto do bar na faculdade no dia seguinte e perguntaria a ele o que tinha acontecido. Não sabia como abordaria o assunto, mas pensou em começar dizendo a frase que aquele estranho balbuciou antes de sumir de vista. Tinha que ter alguma explicação e não abriria mão disso. Aquele mal-estar todo fora culpa dele? Ele causou aquela sensação de pertencimento do corpo que Type desconhecia e ao mesmo tempo lhe tirou todos os sentidos.
Isso é loucura.
Tiraria a história a limpo, nem que tivesse que passar por tudo aquilo de novo caso acontecesse novamente. Sentiu-se medroso e ao mesmo tempo curioso. Tinha medo de se machucar, por mais que a sensação fosse tudo que queria, e não era do tipo masoquista. Mas poxa, tinha que saber, mesmo que dessa vez pegasse fogo de verdade.
Puxou o cobertor e cobriu a cabeça na tentativa da, total escuridão, lhe causar sono. Mas nada. Tudo que conseguiu foi às memórias mais aleatórias da sua vida. Uma que tornou-se destaque entre as outras, foi uma vez em que brincava com a mãe no parque. Era tão real e ao mesmo tempo não. Às vezes perguntava à mãe se tais coisas realmente aconteceram, porque tinha medo que a sensação de não ser real, fosse de verdade. Muitas vezes contava à ela as memórias que viam a mente, a mulher ria e tagarelava muito sobre, como se fosse a coisa mais preciosa que lhe aconteceu, já Type sorria fraco, não sentindo a mesma empolgação que a mãe. Pois para si, eram memórias soltas, era raro as vezes que sentia alguma coisa que o fizesse esboçar qualquer reação.
Porque não sentia nada? Talvez fosse por ser criança demais e não se lembrava da sensação.
Sempre foi muito ativo e se considerava uma pessoa feliz, na infância era brincalhão e era o tipo de criança que todo mundo adorava por ser doce. Corria e brincava como todos naquela idade, e naquela época não tinha esse problema de se importar com momentos. Apenas aproveitava eles. Mas quando a adolescência chegou, tudo ficou estranho. Passou a conhecer sentimentos e ter noção de tudo, seus demais sentidos se desenvolvendo, por mais estranho que fosse conhecer novas sensações e todas as complicações que um adolescente vive. Depois disso nada mais foi como antes.
Gostaria de ser criança novamente, pensou tirando a coberta do rosto e encarando o teto.
Demorou para que o sono chegasse e Type só conseguiu isso alta madrugada depois.
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My Body, Your Soul (MewGulf-TharnType)
FantastiqueTudo que sou Nunca poderei ser sem ser você Pois Somos tudo que nunca fomos sozinhos Uma parte de nós Construída sem nossa permissão Somos um conjunto que nunca poderá coexistir Éramos pra ser? Também disponível no *Spirit Fanfic*