Vinte Um

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Os dois últimos dias foram de total tédio, tirando a parte que invadimos os quartos trancados da casa, mesmo depois de Tharn me dizer que não era uma boa ideia fazermos isso. Ele mesmo abriu a porta com um maço de chaves velhas que achamos em um baú na despensa empoeirada da cozinha. 

Ele insistiu para que eu não fosse, pois segundo ele, estaria procurando algo importante que fosse nos ajudar a sair dessa situação e poderia ser perigoso. Mas eu não fiquei do lado de fora, obviamente. Não poderia deixar ele sozinho nessa, não depois de tudo que ele fez por mim, se tivesse alguma coisa naquele quarto eu também seria atingido. 

Entretanto, não havia nada ali, quer dizer, também não ousamos tocar em peças pessoais dos quartos. Só abrimos algumas gavetas e mexemos em alguns baús do armário. Depois da missão fracassada, ambos ficamos decepcionados e resolvemos que nos pegar no sofá seria mais interessante. E lá estávamos aos beijos e mãos, como se fosse a comemoração de um feito e não tivéssemos fugindo de anjos furiosos. 

Nós tínhamos um limite e eu sinceramente odiava limites naquele instante. Tharn era o primeiro garoto com quem eu me relacionei tão profundamente na vida, a quem eu beijei mais vezes do que realmente deveria, de quem eu queria estar perto o tempo todo, de quem eu me sentia protegido… de quem eu gostava. E bem, na minha vez as coisas estavam acontecendo daquela forma, que sorte a minha.

Ele não dormiu mais depois do dia em que chegamos, pelo menos não que eu tenha visto, e ficávamos praticamente o tempo todo juntos. Pela primeira vez agradeci por isso, isso queria dizer, segundo ele, que sua força estava retornando aos poucos e isso me deixou realmente aliviado. 

— Tenho um lugar pra te mostrar. — Ele estava deitado no meu colo, os dois no sofá, como todos os dias. — Lá fora tem um lugar… um lugar especial.

Eu dedilhava as mechas de cabelo em sua testa e meus olhos se encontraram nos avermelhados dele. Não soube o que dizer, mas estava curioso, o lugar que para mim poderia ser especial era sua casa. Onde estamos. 

— Que lugar? 

Ele fez uma pausa quase dramática e soube que provavelmente não fazia parte do meu mundo. 

— Você vai ver. 

E lá estávamos, saindo da enorme casa amarelada, que por fora, era salpicada de manchas verdes, puro mofo. A casa olhando de fora parecia totalmente abandonada, era como se tivéssemos saído do lugar errado. Visualmente caia aos pedaços enquanto do lado de dentro era muito conversada. Isso é magia? Que bruxaria é essa? 

Estávamos em um campo, o mato era seco e amarelo, as poucas árvores por perto secas com suas folhas alaranjadas. Havia poucas casas pela baixada, uma muito distante da outra, estávamos no interior de algum lugar. 

Tharn segurava minha mão enquanto me guiava pelo chão de terra quase engolido pelo mato. Caminhávamos para um local mais fechado por árvores, o cheiro ali era de ar puro e ao mesmo tempo de mato velho. Não sei dizer. No entanto, havia também uma tensão no ar, quase como se seu coração se apertasse em desespero e medo, mas você sentisse isso com o olfato e também sentisse na ponta da língua o amargor gélido.   

Eu senti frio quando entramos em uma mini floresta coberta por mato seco e folhas forradas no chão. 

— Isso é assustador! — Sussurrei baixo com medo daquelas árvores em formato estranho me escutarem. Nunca se sabe.

— Era o meu lugar favorito para brincar quando me mudei para cá ainda criança.

Claro. É claro que era.

— Não, eu ainda não tinha me tornado… isso. — O amargor em suas palavras me fez ignorar o fato de que ele estava me espionando novamente.

— Você fala como se odiasse o que se tornou. — Eu precisava saber o que realmente tinha acontecido além do que ele havia me contado. 

My Body, Your Soul (MewGulf-TharnType)Onde histórias criam vida. Descubra agora