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Fazia 15 dias que eu tinha sido transferido, e só a uma semana atrás eu vim melhorar de verdade da última surra que levei daquele desgraçado.
Ficar aqui nesse presídio tava sendo bom em partes, mas tava foda de mais em outras. Eu tava com a mente mais tranquila por não precisar ter que dormir imaginando que dia seria ou como seria a próxima surra que eu ia levar naquela salinha de torturas, tava tendo um acompanhamento psicológico e tal mas de que adiantava se eu só conseguia pensar na minha família o tempo todo?!

Eu tava enlouquecendo, papo reto, aqui não tinha mais o Deco e o Paraná pra ficar enchendo o saco, falando besteira e conseguindo sorrir as vezes, aqui eu não via mais o Jeff, o Ricardo e o Ramon que também ia me visitar de vez em quando, aqui eu não ficava por dentro de tudo que acontecia na vida de geral, não tinha mais como receber as fofocas e eu não recebia mais aquelas comidas da Débora e da minha tia que fazia eu me sentir um pouco em casa.

Um dia desses num momento que comecei a pensar de mais nisso eu surtei, papo reto, um guarda veio me levar pro banho de sol lá no pátio e eu caí pra cima dele mesmo com as algemas, resultado, quase quebrei o nariz dele sem ele ter culpa de porra nenhuma e passei 4 dias na solitária, deu em que? Eu fiquei foi pior que antes.

Doutor Alberto sempre quando vinha aqui falava dos meus amigos, porém era só quando ele via algum deles pelo morro, um dia desses questionei o porquê dele ir no morro, ele disse que ele foi contratado e era pago pelo Nunes e quando ele passou alguns dias sem aparecer lá pra dar informações sobre mim ao Nunes ele foi atrás dele e o doutor não teve outro jeito a não ser contar pro Nunes que eu tava vivo e tinha sido transferido, aí eu endoidei né, se era de contar pro Nunes contava pro Ricardo, sei lá, eu entendo que quem tava pagando advogado pra mim era ele, mas eu não pedi, e quem tinha que saber o que tava rolando era alguém da minha família, não o Nunes.

A psicóloga que me atendia de 15 em 15 dias era uma filha da puta gostosa pra caralho, devia ter no máximo uns 23 anos, até porque ela falou pra mim que era o primeiro ano dela atuando na área.
Eu só tive uma consulta com ela, que foi no segundo dia que eu vim pra cá, ela me fez tanta pergunta que eu quase mandei ela ir a puta que pariu sem paciência, mas não dava pra falar assim olhando pra aquela carinha que nossa senhora, tô me sentindo até gado já, tanto tempo sem ver mulher que eu já tô assim com a primeira que vi na minha frente, visitinha íntima não cairia nada mal.

Bom, a tal psicóloga me fez uma pá de pergunta e eu não respondi uma, não confio em ninguém aqui não papo reto, até o delegado que "me ajudou" eu ando meio desconfiado, com o pé atrás, a troco de que ele faria isso? Ninguém tá pouco se fudendo pra presidiário não pô. A psicóloga veio querendo saber da minha vida, as coisas que eu fazia, se tal coisa mechia com a minha mente, porque me batiam no outro presídio, queria saber sobre minha família e o caralho a quatro, eu sei que faz parte do trabalho dela, como ela mesma disse ela tem que conhecer o paciente dela pra entender as parada que meche com a mente da pessoa, mas eu não confio e é isso, agora se ela ceder a chantagem e me agradar de alguma forma eu posso até falar alguma coisa né, ou não.

Uma certeza que eu tinha é que daqui alguns meses quando eu saísse desse caralho eu ia voltar pra putaria que eu vivia antes de conhecer aquela desgraçada e me apaixonar, eu vou fazer de tudo mas vou tirar ela da cabeça de um jeito ou de outro, uma vez falei isso pro Ricardo, ele me respondeu que não importa quantas eu pagasse, se eu amasse mesmo ela não ia esquecer nunca, mas eu tô disposto a pagar pra ver. Até hoje dói, a falta que eu sinto dela é uma parada de outro mundo, eu amo pra caralho aquela mulher, 4 anos se passaram e eu ainda vivo com esse sentimento, não esqueci o sorriso dela que muitas vezes era pra mim, não esqueci das loucuras que a gente já fez junto, não esqueci que ela era a minha paz, que depois dela tudo mudou, eu que nunca tive vontade de ter uma vida ao lado de outra pessoa não conseguia mais me imaginar sem aquela menina tão pequena que me fazia perder minha postura, e agora eu tava sem ela e eu sabia que mais cedo ou mais tarde aquilo ia acontecer, mas eu não imaginava que fosse ser tão foda como foi e como ainda tá sendo, perder ela e ao mesmo tempo cair na cela foi como ir do céu ao inferno e ao contrário do que eu pensei, ao invés de diminuir essa porcaria desse amor parece que só aumentou, e namoral eu não tenho raiva não, eu tenho é ódio de mim quando penso que eu tô aqui até hoje com esse caralho desse sentimento e ela nem deve mais lembrar de mim, mas beleza, não dá pra se culpar tanto, é como dizem, a gente não manda no coração, ela deve ter se envolvido com outras pessoas ao longo desse tempo, deve ter superado o que aconteceu e tá seguindo a vida dela, e eu acredito que quando eu sair daqui e voltar a viver a minha vida eu também vou superar aquela maldita e finalmente esquecer.

Do Morro Ao AsfaltoOnde histórias criam vida. Descubra agora