paeonia album

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Governa todos os lugares, e lá impera;

Eis sua cidade e seu trono imenso;

Ó, feliz dos que elege para seu reino!

DANTE ALIGHIERI, Inferno, Canto I.


Adentrou os portões celestiais do Olimpo, claridade excessiva que lhe incomodava de tal maneira que precisava fazer esforço para não franzir seus olhos, não denotar nenhuma expressão de que estar ali não lhe agradava.

Embora isso fosse de conhecimento geral, havia uma diferença entre os outros saberem e ele confirmar essa informação.

Deixar que Minho entrevisse seu desconforto era tentá-lo para uma contenda. Tão ávido como era por subjugar a outrem.

Feito em nuvens, junto a uma montanha escarpada, o palácio do Senhor das Águias ribombava em filetes de eletricidade à medida que os sopros dos quatro ventos se chocavam numa canção opressiva.

— Bem-vindo — a voz cínica de seu irmão ecoou pelo salão do trono.

Pilastras se erguiam ao seu redor, o branco do mármore carrara não inspirava tranquilidade pelo plano de fundo azul ciano ao redor, sobre suas cabeças havendo apenas grossas camadas de nuvens. Um topo abstrato como referência de esteio.

Diante de Jungkook, o rei dos Vivos jazia sentado sobre um assento elevado esculpido em ouro e mármore, as veias da estrutura permeando todo o chão e formando padrões que assemelhavam-se aos raios rasgando os céus. Era como se relâmpagos emanassem da divindade olimpiana e rastejassem para todos os lados, tanto pelo domo celeste quanto pelo piso aos seus pés.

Seu rosto era belo mais por conta do poder que lhe era intrínseco do que por natureza física. Face neutra, inescrutável, que nada deixaria escapar. Emoções sendo entendidas desde muito cedo não como fraquezas, mas como um lapso mundano.

A feição anfigúrica de Minho lhe encarava de volta, testando reações, à procura do menor sinal de que suas boas-vindas tinham causado o efeito esperado.

Jungkook não lhe daria esse gosto.

Justo não era o tipo de adjetivo que poderia ser aplicado ao seu irmão. Embora isso nunca pudesse ser dito em voz alta, Minho tinha a exímia competência de transformar constatações proferidas em verdadeiro ataque ofensivo contra sua pessoa. Um rapaz silencioso lhe servia ambrósia, sem ousar erguer os olhos para seu senhor ou o outro monarca que adentrara o salão do trono. Sinais de laceração recente nos rasgos rubros em seus antebraços. Era um prisioneiro.

O rapaz se prostrou de pé abaixo dos degraus do trono. Algo em sua quietude deixando entrever um comportamento insurgente.

— O que fez você me chamar? — Jungkook foi direto, em parte por não estar interessado naquele jogo exaustivo que seu irmão fazia ser cada conversa, em parte porque agora não poderia deixar que seus segredos fossem vislumbrados.

Não o temia de fato. Uma percepção velada entre todos era que, das três divindades governantes, Minho era considerado o mais fraco e talvez fosse isso que o fez se tornar quem era. Ambos naquela sala sabiam que Jungkook abrigava em seu reino os únicos seres capazes de levá-los à verdadeira ruína, partir o mundo ao meio, fragmentá-lo. Muitos deles alimentavam um ódio que durava éons e cujo principal alvo era aquele que orquestrou a maior revolta que se tinha história. Uma simples palavra do rei dos Mortos com as divindades certas ocasionaria na libertação dos nêmesis de seu irmão, convertendo-se em seus carrascos, talvez até o legando aos abismos do Tártaro onde as criaturas permaneciam trancadas desde então. Seria como submetê-lo ao Submundo, lugar onde seu poder sobre os mortais de nada valia. O rei dos Vivos não se arriscaria por pouco, mas embora ele fosse conhecido por deter a prudência em seu âmago, Jungkook não era nada senão alguém que se cobria de cautela toda vez que ia ter com ele ou a rainha dos Mares.

Minho o avaliou por um breve instante e então desviou o olhar, passando a acariciar o dorso da águia imperial ao seu lado. Um animal cuja envergadura lhe tornava maior do que seu próprio rei.

— Sua irmã favorita — e Jungkook sabia que a nota de desprezo naquele timbre era perceptível apenas para quem a cada nuance apática dele já estava habituado.

Seulgi era sua única irmã, mas estava distante de ser a favorita dele. Ou de Minho. Ou Changbin. Ou mesmo Sehyoon.

Nada pronunciou. Nem mesmo protestos referentes a detestar cada um deles. Seu irmão não recusaria uma oportunidade de lhe envolver em contenda.

E porque nada foi proferido, Minho se viu obrigado a explicar:

— Ela e Moonbyul estão dando indícios de que irão se divorciar.

Aquilo justificava o uso do fogo sagrado.

Sua irmã se casara com a princesa de uma corte anterior ao nascimento deles. A filha do Imperador dos Oceanos.

A ninfa Moonbyul recusara a união e se refugiara em uma caverna marinha, sua mãe sendo a única a ter conhecimento da localização e o revelando apenas porque a união era inevitável. Com seus domínios em conflito, o Mar se tornava ambiente insalubre. Lava gotejando a partir de fendas causadas pelo colapso de terremotos e cataclismos.

Sobretudo o Submundo seria afetado se elas desfizessem sua aliança. As águas dos rios infernais transbordando, o próprio Érebo emergindo à superfície.

— Intervenha — ele se atreveu a ditar ante ao silêncio de Jungkook. — Se acontecer, a instabilidade dela afetará muito mais ao reino dos Mortos que ao dos Vivos.

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