1 - First Impressions

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P.O.V. NARRADORA

1993, Nova Iorque, EUA

Pela multidão do metrô de Nova Iorque se espremia Martha Byrne ou, como ela mesma se apresentava, Maeve O'Broin, se apressando ao máximo para não se atrasar pro seu primeiro dia de trabalho, pois saiu muito tarde de casa. O metrô era um lugar que parecia ser cômodo, apesar de todo o caos que havia na estação todos os dias, uma vez que a cidade era uma das maiores do mundo e recebia centenas de pessoas diariamente, seja a trabalho ou turistas. Lá, entre aquela aglomeração de gente de todos os estilos, cores e gostos, andando de um lado para o outro completamente ocupadas, Maeve não sentia o olhar pesado das pessoas sobre si, algo que ela achava de extrema indelicadeza e deselegante, porém incrivelmente comum, uma vez que seu estilo por completo parecia atrair a atenção das outras pessoas, mas nem sempre positivamente.

Martha não tinha um estilo chocante como se via em muitos jovens da década de 90, com suas roupas coloridas e largas, ou cabelos armados e roupas pretas. Ela, com seus 22 anos, preferia se vestir de uma maneira mais formal, pois a elegância a ajudava a manter uma postura de autoconfiança, mesmo que não se sentisse muito bonita. Na maioria das vezes se vestia com roupas que se aproximavam de um estilo vintage, que cobriam uma boa parte de seu corpo e quase sempre de tons escuros e terrosos. Em casa ou quando saía que adotava um visual um pouco mais "radical", se é que pode-se chamar assim, com camisas de suas bandas favoritas e mais pele à mostra, mesmo assim se esforçava para se sentir bem com o que via no espelho.

Já dentro da cabine do metrô, Maeve encontra um ponto confortável para se distrair durante o percurso, repassando sua lista de afazeres pela cabeça, uma vez que se considerava muito esquecida e hoje não era um bom dia para ficar esquecendo coisas. Não estava nervosa com o trabalho, pois já tinha trabalhado antes no mesmo estúdio quando ainda era uma estudante de Ciências Musicais, e estava contente com poder trabalhar lá novamente, primeiramente porque achava Jack, diretor atual da Roadrunner Records, um cara gente boa - apesar de algumas opiniões da qual ela discordava, o que era comum em seu dia-a-dia - ele abria espaço para uma certa experimentação dentro da música e ela apreciava muito isso. Passados alguns vários minutos, a estranha voz dos altos falantes avisam sobre o desembarque na estação que a jovem esperava e, assim que desembarcou, rapidamente tomou seu caminho em direção à gravadora, que não ficava muito longe da saída da estação.

P.O.V. Maeve O'Broin

Subindo as escadas da estação e indo em direção a um longo prédio de dois andares, no qual se localizava a Roadrunner Records, agradeci mentalmente pelo caminho ser curto, pois eu já estava quase atrasada. Não que as pessoas de estúdios fossem muito cuidadosas em ser pontuais, muito menos os músicos que nelas tocavam, bandas iniciantes eram normalmente atenciosas e se importavam com os técnicos de som, chegando cedo e não causando problema às outras bandas que também precisavam gravar, porém bandas com mais tempo de estrada e, principalmente, mais fama costumavam ser difíceis de lidar profissionalmente.

Abri uma das portas da entrada principal, era uma entrada larga que contava com duas portas e dava para um corredor de tijolos pintados de azul escuro. A primeira coisa que se via era uma "recepção", não havia bancada, era uma sala que continha uma mesa de escritório com telefone, papéis, agendas, etc. e nas paredes se encontravam pôsteres e fotos autografadas de bandas que produziam pela gravadora, além de alguns bancos e sofás em alguns cantos, ao lado de mesinhas pretas com revistas de música, catálogos de instrumentos e até mesmo tabloides especializados em falar merdas de bandas de rock. Não havia ninguém na recepção, olhei para o corredor do lado direito, ninguém também, assim como do lado esquerdo, mas decidi seguir por ali e dar uma olhada nas outras salas, talvez, por um milagre, já tivessem começado a gravação no horário certo. Andei por mais dois minutos até que avistei alguém saindo de uma das salas, era um cara um pouco mais alto que eu, com cabelos grandes e cacheados, estava de óculos escuros então não faço ideia se ele havia me visto. Indo em sua direção, me aproximei dele e o chamei.

- Licença - dei um sorriso amarelado assim que ele me encarou - você sabe onde o Jack se encontra?

Ele deu uma risada única, daquelas que a pessoa solta ar pelo nariz e sorri, fazendo eu me perguntar se eu havia dito algo de errado, porém logo completou:

- Não vi o Jack hoje ainda, mas caso você o encontre por favor me avise, pois também preciso desse cara - ele riu mais uma vez, me fazendo sorrir também. - Temos um ensaio marcado para agora e uma reunião mais tarde, espero que esse fodido não esteja passando mal ou algo do tipo, não hoje pois precisamos dele.

- Não faço ideia de onde ele esteja... - respondi - Mas, se vocês são a primeira banda de hoje, provavelmente irei estar trabalhando com vocês - tentei sorrir amigavelmente.

O homem que estava na minha frente me olhou com uma cara de confusão, mas entendi seu olhar de dúvida.

- Como? - ele perguntou.

- Ah - sorri novamente tentando ser amigável - Eu sou ajudante de produção, estou lá pra ajudar com a mixagem de som e arrumando os instrumentos do estúdio, afinando, desmontando, enfim... essas coisas. - respondi e recebi novamente um olhar de confusão do sujeito.

- Maneiro... e diferenciado - ele respondeu, finalmente sorrindo - Mas acho que você não irá trabalhar conosco, eu já cuido do som e da mixagem junto com Jack.

Fiquei pensativa, agora não sabia mais o que eu ia fazer, pra onde ir, nem quem procurar lá.

- Você sabe se tem mais alguém aqui na gravadora a essa hora? - perguntei, tentando desvendar o "mistério" de onde que eu deveria estar.

- Até onde eu sei, apenas nós estamos aqui. Não faço ideia de quem abriu as portas de entrada e do estúdio, mas quando chegamos já não havia ninguém.

Estranho... Bem estranho mesmo...

- Então acho que estarei com vocês mesmo, pois Jack me avisou que estaríamos trabalhando com os primeiros do dia. Vocês que estão planejando e gravando um álbum novo?

- Sim... - o cara parecia assustado com a informação repentina e específica - Por quê?

- Ah, então é com vocês mesmo que estarei trabalhando junto essa manhã - sorri novamente - Você parece meio desconfiado, mas pode deixar, foi o Jack que me falou do novo álbum e que vocês teriam essa reunião hoje.

- Entendi... - ele ainda parecia confuso, mas esboçou um sorriso - Bom, não sei exatamente por que Jack quer nos apresentar para você, mas vou adiantar o trabalho dele me apresentando - o cara bem humorado disse apontando para si mesmo com o polegar - Meu nome é Josh, sou o produtor da banda e toco teclado nela.

- Prazer Josh, meu nome é Maeve - estendi a mão e ele aceitou o cumprimento - Sorte a minha já chegar conhecendo o produtor, hem - tentei esconder minha risada sem graça.

Nesse momento, ouvimos o som da porta grande da entrada se abrindo e andamos em direção a recepção para checar quem era. Lá estava Jack, segurando um café grande e uma garrafinha de água. Ele olhou para nós com as sobrancelhas arqueadas, nos encarando pois estávamos sérios olhando-o.

- Enfim, o desaparecido. Eu e a moça aqui estávamos querendo saber do seu paradeiro "senhor Jack" - Josh sorriu e arqueou as sobrancelhas também.

- Josh, seu mala! - Jack respondeu rindo - e Martha! Quanto tempo minha querida, como vai?

Nesse momento eu gelei, esqueci que Jack me conheceu há 4 anos atrás como Martha, antes da minha decisão de utilizar outro nome socialmente. Olhei para o lado e Josh me observava novamente parecendo não entender nada, eu não queria que ninguém me conhecesse como Martha, nem mesmo pensasse em me chamar assim. Tive que pensar rápido uma forma de me livrar daquela situação, eu ia ter que mentir... Odiava mentiras, odiava ter que mentir, já menti muito na vida e não gostaria de continuar fazendo isso, afinal era isso que Martha Byrne era: uma grande mentirosa, que mentia para todos e para si mesma.
Ri falsamente em um tom divertido e olhei pra Jack.

- Me chame de Maeve, Jack - continuei, sorrindo - Maeve O'Broin. Nesse último ano que passei fora na Europa era assim que me chamavam, é comum famílias irlandesas terem dois nomes - comecei a mentir - o em Inglês, que é o idioma que falam na Irlanda em maioria, e o em irlandês, que é pra famílias que mantém a tradição, então decidi adotar meu nome tradicional, irlandês, para os mais próximos - falei e, para tornar a mentira mais aceitável, completei com uma curiosidade aleatória real - O número de falantes da língua irlandesa é extremamente baixo, é uma língua que está entrando em extinção.

- Nossa! Que doideira eu não fazia ideia disso - Jack falou surpreso - Entendo, eu faria o mesmo, muito legal sua atitude, garota.

Sabia que Jack cairia nessa, ele adora um discurso tradicionalista. Homens são vítimas fáceis para mentiras, se você souber se fazer de desentendida ou inocente. Olhei para Josh e ele balançava a cabeça positivamente de maneira lenta e me observava com as sobrancelhas meio arqueada.

- Realmente interessante... - Josh comentou, me fazendo ficar aliviada porque a mentira colou - Você é filha de imigrantes? Irlandeses?

- Sou neta de imigrantes irlandeses - essa parte era verdade, felizmente não precisaria mais mentir daqui pra frente. Ou achava que não precisaria...

- Saquei, maneiro... Nosso vocalista também é filho de imigrantes europeus, você vai conhecê-lo no ensaio. - Josh comentou com um pequeno sorriso.

- Legal... - respondi por educação.

- Falando em ensaio, vamos entrar e começar, jovens! - Jack tomou frente da situação - Me desculpem o atraso, cheguei muito cedo hoje para abrir a gravadora e o estúdio e acabei não tomando nem um café, então fui comprar um logo depois que deixei a sala aberta para vocês.

Dizendo isso, Jack foi em direção à sala de ensaio, eu e Josh atrás dele.

- Espero que você goste dessa banda, Maeve - Jack falou comigo, me fazendo sentir mais um alívio por ter aceitado meu novo nome - Eles sabem bem o que querem.

- Vamos ver - falei rindo para ele e Josh, que pareceu ficar meio sem graça quando sorriu pra mim. Achei Josh muito educado e carismático, além da banda ser pontual em um horário que se pode considerar cedo para os músicos que atendíamos por lá, já era uma ótima primeira impressão, muito boa mesmo.

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